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Neurologia10 junho 2017

Esclerose tuberosa: características e diagnóstico

Esclerose tuberosa é uma doença que está no grupo das síndromes neurocutâneas, também denominadas facomatoses.

Esclerose tuberosa é uma doença que está no grupo das síndromes neurocutâneas, também denominadas facomatoses. É um grupo de doenças nas quais suas manifestações clínicas principais são neurológicas e dermatológicas – por isso o exame de toda a pele, de forma detalhada, faz parte de um exame neurológico bem feito.

Essa associação de acometimento neurológico e dermatológico tem explicação na origem embrionária – os dois sistemas tem origem do mesmo folheto embrionário.

E, o que significa facomatose:

  • “phakos”- significa mancha, marca, sinal de nascimento em forma de lente;
  • “oma”- tumor em forma de lente.

cérebro em 3d

Esclerose tuberosa

A esclerose tuberosa trata-se de uma desordem multissistêmica da migração, proliferação e diferenciação celular, resultando no desenvolvimento de tumores benignos, que podem atingir o encéfalo, rins, pele, coração, pulmões e outros órgãos.

Mais da autora: ‘TCE na Emergência Pediátrica: o que fazer?’

É autossômica dominante, porém 2/3 dos casos correspondem a mutações novas. Apresenta uma incidência de aproximadamente 1 para cada 5.000 a 10.000 nascidos vivos.

Há 2 genes que podem estar envolvidos na origem da esclerose tuberosa:

  • TSC1 (tuberina) – localizado no cromossoma 9;
  • TSC2 (hamartina) – localizado no cromossoma 16.

O complexo hamartina-tuberina atua inibindo o MTOR (mammalian target of rapamycin), que é uma proteína que regula o crescimento e diferenciação celular. Se há mutação, ocorre um descontrole progressivo do ciclo celular, com desenvolvimento de hamartomas em vários órgãos.

É uma herança de alta penetrância e com fenômeno de antecipação (a cada geração vem de forma mais evidente/grave).

Critérios diagnósticos

Podemos dividir em diagnóstico definitivo ou diagnóstico possível, conforme tabela abaixo.

Diagnóstico DefinitivoDiagnóstico Possível
Ø  Identificação da mutação nos genes TSC1 e TSC2; OUØ  1 Critério Maior; OU
Ø  2 Critérios Maiores; OUØ  3 ou mais Critérios Menores
Ø  1 Critério Maior + 2 ou mais critérios menores

 

MAIORESMENORES
1.      Angiofibromas faciais ou placa na fronte (3 ou mais)1.      Fibromas intraorais (> ou = 2)
2.      Fibroma ungueal (> ou = 2)2.      “Depressões” no esmalte dentário (“pits”: > ou = 3)
3.      Máculas hipopigmentadas (> ou = 3 – com pelo menos 5 mm de diâmetro)3.      Lesão de pele em “confete”
4.      Placa de Shagreen4. Halo acrômico na retina
5. Múltiplos hamartomas retinianos nodulares5. Múltiplos cistos renais
6. Displasia cortical – túberes corticais, linhas de migração radial na substância branca6. Hamartomas não renais
7. Nódulos subependimários
8. Astrocitoma de células gigantes
9. Rabdomioma cardíaco (único ou múltiplo)
10. Linfangiomamiomatose
11. Angiolipoma (> ou = 2)

Veja também: ‘Neurologia: o poder e a singularidade da semiologia’

Características clínicas

A. NEUROLÓGICAS

  1. Nódulos subependimários:
  • Localizados principalmente nas porções anteriores dos ventrículos laterais, na região subependimária;
  • Tendência à calcificação;
  • Quanto maior o seu número, pior o prognóstico;
  • Presente em 80% dos pacientes.
Nódulos subependimários na figura A. Na figura B, além dos nódulos, também é possível observar um possível astrocitoma de células gigantes. / (Tuberous sclerosis complex: genetics.clinical festures and diagnosis – James Owens)
  1. Displasia Cortical:
  • Anormalidade congênita causada pela falha de migração de neurônios no desenvolvimento do cérebro;
  • Associados à epilepsia de difícil controle e dificuldades de aprendizado.
  1. Túber Cortical:
  • Localizado no córtex – principalmente frontal e parietal;
  • É um hamartoma;
  • > 90% dos pacientes.
  1. Astrocitoma de células gigantes:
  • É um tumor benigno;
  • Responsável pelo surgimento de novos déficits neurológicos focais, piora das crises e mudança no comportamento.
  1. Epilepsia:
  • Ocorre de forma precoce em 80 a 90% dos pacientes;
  • Geralmente as crises se iniciam como espasmos infantis, desenvolvendo Síndrome de West.
  1. Deficiência Mental:
  • 45-65% dos casos;
  • Está associado com a severidade das crises convulsivas, tamanho e localização dos túberes e nódulos subependimários.
  1. Distúrbios de Comportamento e Psiquiátricos:
  • Secundário ao comportamento cognitivo;
  • Transtorno de ansiedade.

B. DERMATOLÓGICAS E DENTÁRIAS

  1. Máculas Hipopigmentadas:
  • 90% dos pacientes;
  • > ou = 3 com pelo menos 5 mm de diâmetro;
  • Presentes ao nascimento / surge na infância (2 a 4 ms) ;
  • Branca, contorno irregular, em forma de folha;
  • Tronco e membros / não presentes na face / nunca desaparecem;
  • Tendência a aumentar em quantidade e tamanho com o passar do tempo.
Máculas hipocrômicas. / Foto: “Tuberous sclerosis complex: genetics, clinical features, and diagnosis”.
  1. Angiofibromas
  • Início: primeiros anos de vida (2-5 anos);
  • Patognômonico de esclerose tuberosa;
  • Nariz, e regiões malares, bochechas e queixo;
  • Milimétricos, arredondados, endurecidos, de coloração rósea.
Pápulas eritematosas correspondendo ao angiofibroma de face. / Reprodução
  1. Fibromas Ungueais
  • 20% dos pacientes;
  • Mais frequente nos adultos;
  • Principalmente nas unhas dos pés;
  • São hamartomas com hiperqueratose associada à proliferação vascular e de colágeno.

C. OUTRAS CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS:

  1. Angiolipomas Renais
  • Bilaterais;
  • 2/3 dos pacientes com esclerose tuberosa;
  • Geralmente assintomáticos.
  1. Hamartomas Retinianos
  • Histologicamente semelhante aos túberes;
  • 30- 50% dos pacientes;
  • Geralmente não comprometem a visão.
  1. Rabdomioma Cardíaco
  • 50- 60% dos pacientes;
  • Tumor benigno do coração;
  • Geralmente localizado nos ventrículos;
  • Frequentemente é feito o diagnóstico pré-natal da lesão;
  • Regressão espontânea nos primeiros anos de vida;
  • Se sintomático – obstrutivo ou disfunção de valvas / se envolver o sistema de condução cardíaco, pode predispor o paciente a arritmias para o resto da vida.

Recomendações e manejo clínico

Como veremos abaixo, a acompanhamento dos pacientes com esclerose tuberosa é multidisciplinar.

RECOMENDAÇÕES E MANEJO CLÍNICO 
Cérebro•         RNM: buscar túberes, nódulos subependimários, astrocitoma. Deverá ser feita a cada 1 a 3 anos em pacientes assintomáticos; deverá ser feita de forma mais frequente em pacientes com astrocitoma ou nódulos subependimários

•         Avaliar associação com desordens neuropsiquiatricas

•         Educar os pais a reconhecer os ESPAMOS

•         EEG

Genética•         Oferecer teste genético para família

•         Procurar outros casos na família

Pele e Dentes•         Inspeção detalhada da pele e cavidade oral

•         Exame dermatológico cuidadoso 1x/ano

•         Dentista a cada 6 meses e raio X panorâmico aos 7 anos

Coração•         ECO ao diagnóstico, principalmente em menores de 3 anos / Deverá ser feito a cada 1-3 anos até regressão completa do rabdomioma

•         ECG: na busca de defeitos de condução (em todas as idades), a cada 3-5 anos / se paciente sintomático, a frequência deverá ser menor

Olhos•         Exame oftalmológico anual
Rins•         USG vias urinárias ao diagnóstico e a cada 1-3 anos

•         RNM a cada 1-3 anos para acompanhar crescimento do angiomiolipoma e dos cistos renais

•         Função renal / aferição da PA: 1x/ano

•         Angiomiolipomas > 3 cm, em crescimento e assintomáticos à mTOR

Pulmões•         TC de tórax: a cada 5-10 anos em pacientes de risco, sem evidências de cisto na primeira TC

•         TC de tórax: a cada 2-3 anos em pacientes com cistos na primeira TC

•         PFP: 1X/ano

•         LAM pistas: dispneia aos esforços

Diante do exposto, vemos a importância de saber reconhecer de forma precoce a esclerose tuberosa, uma vez que exige múltiplos acompanhamentos, garantindo assim uma melhor qualidade de vida para o paciente e aconselhamento genético da família.

Referências bibliográficas:

  • Swaiman`s Pediatric Neurology – fifith edition
  • Cypel Neurologia infantile – quinta edição
  • Fenichel`s Clinical Pediatric Neurology – Seventh Edition
  • James Owens, MD,PhD; John B Bodensteiner, MD – “Tuberous sclerosis complex: Genetic, clinical festures and diagnosis)
  • James Owens, MD,PhD; John B Bodensteiner, MD – “Tuberous sclerosis complex: Management”

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