A doença renal crônica (DRC), principalmente quando associada ao diabetes tipo 2 (DM2), gera um enorme impacto negativo tanto na saúde individual quanto populacional, ameaçando a sustentabilidade dos sistemas de saúde em todo o mundo. O Brasil apresenta um cenário bem crítico. Com o aumento de casos de DM2, impulsionados pelo envelhecimento populacional, pela urbanização e mudança de estilo de vida, mais casos de DRC surgem, e a necessidade de terapias de substituição renal, como a hemodiálise, aumenta.1,4
Com o aumento da prevalência do DM2 no mundo, estima-se que de 20 a 40% dos diabéticos desenvolverão algum grau de DRC ao longo da vida, o que faz da DM2 a principal causa de DRC terminal em diversos países.1-3,5 Em 2021 foram reportados mais de 100 milhões de casos de DRC atribuídos ao DM2, cenário esse que deve se manter ou progredir nos próximos anos.4 O impacto nesses pacientes transcende as consequências diretas da DRC, se estendendo para problemas cardiovasculares como aterosclerose, insuficiência cardíaca e aumento da mortalidade cardiovascular. A maioria dos pacientes com nefropatia diabética morre de doenças cardiovasculares antes mesmo de evoluir para doença renal terminal.1,3,5 Além disso, a DRC aumenta custos em saúde, impacta na qualidade de vida e na morbidade geral dos doentes.2,3
O rastreio anual com dosagem de albuminúria e estimativa da filtração glomerular é imperativo no acompanhamento de pacientes com DM2.3,7
O aumento expressivo do número de casos de hemodiálise impressiona a ponto de ser chamada de “crise humanitária” pela mídia tradicional não médica, além de estar presente nas diretrizes sobre DM2. São, de fato, preocupantes os relatos de superlotação em centros de diálise, falta de recursos e dificuldade de acesso às terapias renais substitutivas. Essa situação, além de impactar de forma prejudicial a vida dos pacientes, ainda gera custos elevadíssimos ao Sistema Único de Saúde (SUS).6
Diante desse panorama, a necessidade de intervenções terapêuticas que possam efetivamente retardar a progressão da DRC e mitigar os eventos cardiovasculares associados torna-se imperativa.7 A abordagem multiprofissional integrada é essencial para abranger de forma eficaz o manejo e a redução da progressão da DRC em pacientes com DM2; portanto, a colaboração entre diversas especialidades como nefrologistas, cardiologistas, endocrinologistas e clínicos se faz necessária na identificação de pacientes de risco e na incorporação de novas terapias com evidência comprovada no tratamento da doença.2,7,8
A finerenona, um antagonista seletivo não esteroidal do receptor de mineralocorticoide, surge como uma inovação promissora nesse contexto. Com o potencial de transformar a abordagem terapêutica para esses pacientes, ela demonstrou reduzir a progressão da doença renal e o risco de eventos cardiovasculares em pacientes com DM2 e DRC.7,9 A ação ocorre através do bloqueio da superativação do receptor de mineralocorticoide, processo que contribui para a lesão renal e cardiovascular em pacientes diabéticos.11
O estudo FIDELIO-DKD avaliou pacientes com DRC e DM2 predominantemente nos estágios 3 e 4 da doença com elevada albuminúria (razão albumina-creatinina urinária [RACU] entre 300 e 5000mg/g) e elevado risco de progressão da doença. Os resultados mostraram que a finerenona reduziu significativamente o risco de um desfecho composto renal (insuficiência renal, diminuição sustentada da taxa de filtração glomerular estimada [TFGe] em 40% ou mais, ou morte por causas renais) e de um desfecho composto cardiovascular (morte cardiovascular, infarto do miocárdio não fatal, acidente vascular cerebral não fatal ou hospitalização por insuficiência cardíaca).11,13
Já em 2021 o estudo FIGARO-DKD ampliou a gama de pacientes envolvendo mais de 7 mil pessoas com DM2 e DRC estágio 2 a 4 com menor elevação da albuminúria (RACU entre 30 e 300mg/g) e pacientes estágio 1 e 2 com albuminúria muito elevada (RACU entre 300 e 5000mg/g), população muito pouco estudada e com risco cardiovascular elevado.9 O impacto de estudo se deu devido à redução de 13% no desfecho primário cardiovascular composto (HR 0,87; IC 95% 0,76-0,98; p=0,03) em comparação com o placebo. Esse benefício foi impulsionado principalmente por uma menor incidência de hospitalização por insuficiência cardíaca (HR 0,71; IC 95% 0,56-0,90).9,10,14 A análise de um desfecho renal exploratório mais sensível (insuficiência renal, diminuição sustentada da TFGe em 57% ou mais, ou morte por causas renais) demonstrou uma redução de 23% (HR 0,77; IC 95% 0,60-0,99).9 A finerenona também demonstrou reduzir a excreção urinária de albumina (albuminúria) e retardar a perda da função renal.7,9
A análise agrupada dos principais ensaios clínicos (FIDELITY) reforça que os efeitos cardiorrenais da finerenona são consistentes em uma ampla gama de pacientes com DRC e diabetes tipo 2, independentemente do grau de albuminúria, função renal ou controle glicêmico.3,10,15 O benefício da finerenona foi consistente, mesmo com o uso concomitante de inibidores de SGLT2 ou agonistas de GLP-1, sugerindo um efeito aditivo na proteção cardiorrenal.9 Além disso, o estudo CONFIDENCE demonstrou que, em pacientes com doença renal crônica e diabetes tipo 2, a terapia inicial combinada de finerenona e empagliflozina resultou em uma redução significativamente maior na relação albumina-creatinina urinária do que qualquer um dos tratamentos isoladamente, com um perfil de segurança consistente e sem eventos adversos inesperados. Isso abre espaço para novas perspectivas de terapias combinadas.16
Em um contexto complexo de saúde, a finerenona pode atuar como um agente no combate à “crise da diálise”, trazendo mais qualidade de vida aos pacientes e reduzindo desfechos cardiovasculares.6,9,14
A Consulta Pública da CONITEC, aberta no dia 23 de outubro de 2025, é um marco decisivo para a ampliação de alternativas terapêuticas para a doença renal crônica no SUS. Médicos cardiologistas, nefrologistas, endocrinologistas e clínicos gerais podem contribuir nesse processo das seguintes formas:
- Compartilhando experiências clínicas;
- Opinando sobre as novas opções terapêuticas;
- Participando ativamente de processos democráticos, como as Consultas Públicas.
Os interessados podem deixar suas contribuições no site da Conitec (go.bayer.com/31tso) de 23 de outubro a 11 de novembro.
Autoria

Gabriel Quintino Lopes
Médico Cardiologista; Gerente Médico da Santa Casa de Barra Mansa; Coordenador do Serviço de Cardiologia e Cirurgia Cardíaca da Santa Casa de Barra Mansa; Médico de rotina do CTI da Santa Casa de Barra Mansa; Cardiologista ambulatorial em consultório particular; MBA em Gestão em Saúde pelo Instituto Israelita Albert Einstein (em andamento).
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