É possível prevenir injúria renal aguda com agentes estimuladores de eritropoiese?
Os agentes estimuladores da eritropoiese (AEE) são amplamente empregados no tratamento da anemia em pacientes com doença renal crônica terminal e em pacientes oncológicos. O desenvolvimento da eritropoietina humana recombinante (rhEPO), na década de 1980, impulsionou seu uso clínico como alternativa às transfusões sanguíneas para o tratamento da anemia sintomática.
A eritropoietina (EPO) é uma citocina predominantemente produzida nos rins, cuja função principal é regular a produção de glóbulos vermelhos na medula óssea. Em situações de hipóxia ou baixa hemoglobina, a secreção de EPO aumenta, estimulando a proliferação e diferenciação dos precursores eritroides na medula. Os AEE, como alfa-epoetina e darbepoetina, são formas sintéticas de EPO que ajudam a manter os níveis de hemoglobina em pacientes anêmicos, ativando o receptor de eritropoietina (EpoR) na medula óssea. Embora reduzam a necessidade de transfusões, esses agentes podem levar semanas para elevar os níveis de hemoglobina, dependem de estoques adequados de ferro e apresentam riscos, como eventos tromboembólicos e progressão tumoral em pacientes oncológicos.
O uso da eritropoietina (EPO) na prevenção de injúria renal aguda (IRA) ganhou destaque há cerca de 20 anos, quando estudos pré-clínicos demonstraram suas propriedades citoprotetoras e antiapoptóticas, sugerindo potencial na proteção renal contra lesões isquêmicas e tóxicas. Em 2004, foi demonstrado que a EPO poderia proteger o rim contra lesões de isquemia-reperfusão em modelos animais, o que incentivou novas investigações clínicas, como o estudo piloto de 2009 que avaliou a eficácia da EPO na prevenção de IRA em pacientes submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio.
Nova metanálise
A partir de 2009, estudos e metanálises foram publicados com resultados mistos e dependentes do contexto clínico. Uma meta-análise conduzida por Zhao et al. em 2015 analisou dez ensaios clínicos randomizados, envolvendo 2.759 pacientes no período perioperatório. Comparada ao placebo, a administração de EPO não reduziu a incidência de IRA, necessidade de diálise ou mortalidade. Embora não tenha mostrado benefícios, também não foi observado um aumento no risco de eventos adversos associados à medicação.
Resultados
Outro estudo de 2015, conduzido por Tie HT, avaliou o efeito da EPO na prevenção de lesão renal aguda associada à cirurgia cardíaca, apresentando resultados controversos. A meta-análise incluiu cinco ensaios clínicos randomizados, com um total de 423 pacientes, e não encontrou associação entre a administração de EPO e a redução da incidência de IRA na avaliação geral. No entanto, a análise de subgrupos indicou que, em pacientes sem fatores de alto risco para IRA, a administração de EPO poderia reduzir significativamente sua incidência.
Um estudo mais recente, de 2022, realizado por Shin HJ et al., avaliou oito ensaios clínicos randomizados envolvendo 610 pacientes. A administração de EPO nesse estudo reduziu significativamente a incidência de IRA (P = 0,004) e a necessidade de transfusão de hemácias no intraoperatório. As análises de subgrupos indicaram que a administração pré-operatória de EPO reduziu a incidência de IRA, a necessidade de transfusões intraoperatórias, os níveis de creatinina sérica e o tempo de internação hospitalar e em UTI. Ressalta-se que os benefícios foram limitados aos pacientes que receberam EPO pré-operatória, sem eficácia em períodos intraoperatórios ou pós-operatórios. O tratamento pré-operatório com EPO, portanto, pode ser uma opção para otimizar os resultados pós-operatórios, especialmente em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca.
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Segundo a revisão da Cochrane Kidney and Transplant Register, até agosto de 2024, concluiu-se que os AEE não reduzem o risco de IRA, morte ou necessidade de diálise em pacientes de alto risco. Além disso, não foram observadas diferenças significativas na função renal ou na incidência de eventos trombóticos, como infarto do miocárdio, AVC ou agravamento da hipertensão.
Por fim, alguns estudos indicam que a administração pré-operatória de EPO pode reduzir a incidência de LRA em cirurgias cardíacas, especialmente quando administrada antes do procedimento. No entanto, essa eficácia não foi observada em pacientes de alto risco para LRA em outras investigações.
Conclusão
Portanto, embora a EPO possa oferecer benefícios em contextos específicos, como cirurgias cardíacas, a evidência geral não apoia seu uso rotineiro para prevenção de IRA, especialmente se utilizada como profilaxia durante ou após a cirurgia. O uso deve ser avaliado com base no perfil de risco do paciente e no contexto clínico. Estudos adicionais estão em andamento e podem fornecer novas informações, mas, por enquanto, o uso de AEE para prevenir IRA deve ser feito com cautela.
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