Ensaios clínicos podem ser conduzidos à distância?
Há mais de um ano a pandemia causada pelo novo coronavírus traz diversas dificuldades em pesquisas que envolvem ensaios clínicos.
Há aproximadamente um ano atrás, a pandemia causada pelo novo coronavírus trouxe diversas dificuldades em pesquisas que envolviam testes clínicos. Inúmeras restrições surgiram e impediram o desenvolvimento de trabalhos, a coleta de dados e o acompanhamento adequado de intervenções. Dois autores publicaram recentemente no JAMA um artigo que faz um levantamento aproximado do impacto provocado pelo cenário atual nessas pesquisas e propõe soluções interessantes.
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Ensaios clínicos na pandemia
Cerca de 1.773 ensaios clínicos foram suspensos na pandemia e aqueles que não foram encerrados certamente passam por desafios em tudo aquilo que é necessário seguimento presencial. Muitos pesquisadores propuseram alternativas de acompanhamento remoto. Houve um aumento aproximado de 9% para 57% entre janeiro e maio de 2020 em pesquisas conduzidas remotamente. Realizar ligações por telefone e teleconsultas e até mesmo enviar por correio medicações e equipamentos de monitorização foram algumas das ações utilizadas como novas abordagens dentro da pandemia.
O artigo cita ainda um ensaio clínico randomizado, duplo cego, realizado em Missouri, que analisou a eficácia da Fluvoxamina comparada com placebo em 152 pacientes recém-diagnosticados com Covid-19. Essa pesquisa foi conduzida de maneira totalmente remota — termo de consentimento livre e esclarecido; entrega de oxímetro, termômetro e monitor de pressão arterial; entrega da medicação; e coleta de dados: em nenhum momento foi necessário contato físico entre os pesquisadores e os pacientes do espaço amostral.
Ademais, o texto sugere a possibilidade de que esse acompanhamento remoto pode perdurar após a pandemia, pois facilitaria o acompanhamento de indivíduos com múltiplas comorbidades e com dificuldade de locomoção. É possível até mesmo realizar o desenvolvimento de uma “van” com dispositivos portáteis — exames como eletrocardiograma, ultrassom e espirometria, por exemplo, estão consistentemente mais disponíveis.
Por outro lado, é necessário também questionar até que ponto os dados obtidos em sistemas como esse são válidos, pois a coleta de informação pode não ser tão rigorosa quanto uma pesquisa presencial e os resultados podem não ser reproduzíveis.
É preciso cautela. Ainda que grandes barreiras presentes em ensaios clínicos presenciais possam ser abolidas com o uso de métodos remotos — como a dificuldade de locomoção — existem inúmeros desafios que ainda permanecerão — como a preocupação com a toxicidade do tratamento testado.
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Existem evidências de que o recrutamento presencial de pacientes para pesquisas é mais eficaz, algumas intervenções (especialmente comportamentais) são menos potentes se remotas, medidas que necessitam de equipamentos e técnicas especiais (coleta de sangue, biópsias, exames de imagem avançados etc) podem ser impossíveis de serem realizados remotamente, e os resultados subjetivos (típicos em um processo à distância) não são substitutos para resultados objetivos presenciais. Ou seja, dados obtidos de maneira objetiva e subjetiva podem ser analisados de maneira conjunta para uma melhor compreensão das intervenções.
Conclusão
O artigo conclui ressaltando que os pesquisadores devem reduzir locomoções inoportunas dos participantes das pesquisas, a fim de diminuir gastos desnecessários e inconveniências. Todavia, para continuar garantindo evidências de alta qualidade, as decisões para conduzir ensaios clínicos randomizados remotamente devem considerar a influência dessas alterações na validade e integridade dos dados obtidos.
Referências bibliográficas:
- McDermott MM, Newman AB. Remote Research and Clinical Trial Integrity During and After the Coronavirus Pandemic. JAMA. Publicado online em 22/04/2021. doi:10.1001/jama.2021.4609
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