Saiba o que é bacteriúria assintomática e como combatê-la
Bacteriúria assintomática é o crescimento de ≥ 1 bactéria em urinocultura na contagem ≥ 105 UFC/ml na ausência de sinais ou sintomas de infecção urinária.
Bacteriúria assintomática é definida como o crescimento de ≥ 1 bactéria em urinocultura em uma contagem ≥ 105 UFC/ml na ausência de sinais ou sintomas de infecção do trato urinário. Se, por um lado, há a preocupação com a evolução para complicações; por outro, o tratamento de bacteriúria assintomática pode levar ao uso excessivo de antibióticos, com as consequências dos eventos adversos e a possibilidade de seleção de bactérias resistentes.
O novo guideline da Infectious Diseases Society of America (IDSA) aborda as indicações de rastreio e tratamento dessa condição. Confira as recomendações:
Em quem rastrear e tratar a bacteriúria assintomática?
Gestantes
O painel mantém a recomendação do guideline anterior de rastrear bacteriúria assintomática em gestantes e quem possuir urinocultura positiva devem ser tratadas por um período de quatro a sete dias, dependendo do antibiótico escolhido.
Essa recomendação é baseada em estudos clínicos, incluindo ensaios clínicos randomizados e metanálises, que mostram evidências de redução na incidência de pielonefrite, parto prematuro e baixo peso do recém-nascido. Os autores recomendam nitrofurantoína ou betalactâmicos – como cefalexina – como primeira escolha para o tratamento de bacteriúria assintomática em gestantes, devido ao seu perfil de segurança já estabelecido. Fosfomicina, apesar de atraente por sua posologia em dose única, tem avaliação clínica limitada nessa população.
Pacientes que serão submetidos a procedimentos urológicos
Para os pacientes que serão submetidos a procedimentos urológicos endoscópicos associados ao trauma de mucosa, o guideline também recomenda o rastreio e tratamento de bacteriúria assintomática. Esses procedimentos incluem cirurgias transuretrais de próstata e bexiga e ureterocistoscopia, incluindo as realizadas para litotripsia.
Idealmente, a urinocultura deve ser solicitada antes da realização do procedimento, o que permite o tratamento guiado pelo antibiograma. Diversos estudos demonstraram benefício na redução de infecção e sepse urinária nos pacientes que recebem tratamento, o qual deve ser iniciado antes da realização do procedimento.
Quem não deve ser rastreado
A presença de bacteriúria é comum em diversas populações, como mulheres, idosos e pacientes cateterizados. Entretanto, na maioria das situações, o tratamento de bacteriúria não associada a sintomas do trato urinário não é acompanhado em redução de episódios de infecções urinárias, sepse ou mortalidade. Ao mesmo tempo, a recorrência de bacteriúria é frequente e o uso indiscriminado de antibióticos tem sido associado a um aumento na colonização por bactérias resistentes. Outros estudos sugerem inclusive que a bacteriúria assintomática seria um fator protetor contra infecções urinárias sintomáticas.
Dessa forma, o painel recomenda que os seguintes indivíduos não sejam submetidos a rastreio de bacteriúria:
- Crianças;
- Mulheres saudáveis não gestantes;
- Idosos institucionalizados;
- Diabéticos;
- Transplantados renais com > 1 mês da cirurgia de transplante;
- Transplantados de órgãos sólidos que não transplante renal;
- Pacientes com lesão de medula espinhal;
- Pacientes em uso de cateter vesical, seja por curta ou longa duração;
- Pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos não urológicos;
- Pacientes submetidos a procedimentos com implante de dispositivos urológicos, como esfíncteres artificiais ou próteses penianas.
Outras situações
Em pacientes idosos e com comprometimento cognitivo pode ser difícil diferenciar um quadro de bacteriúria assintomática de uma verdadeira infecção urinária. Nesses casos, se o paciente se apresenta com delirium e com urinocultura positiva, mas sem sinais ou sintomas localizatórios de infecção no trato urinário e sem sinais sistêmicos de infecção, a recomendação é pesquisar outras causas para o quadro clínico e observação cuidadosa em vez de iniciar tratamento antibiótico. Por outro lado, se o paciente apresenta febre e outros sintomas sistêmicos que sugiram sepse, deve ser iniciado o tratamento antimicrobiano de amplo espectro visando a cobertura de focos urinário e não urinários .
Para pacientes neutropênicos de alto risco (i.e. pacientes com contagem absoluta de neutrófilos < 100/mm³ com previsão de duração > 7 dias), não há recomendação nem contra nem a favor do rastreio para bacteriúria assintomática. Como tais pacientes geralmente recebem profilaxia com antibióticos e são manejados de forma diferenciada – com início imediato de antibioticoterapia na presença de febre – não se pode determinar com exatidão a repercussão de bacteriúria no desenvolvimento de complicações nessa população. As evidências atuais sugerem que o rastreio de rotina provavelmente adicionaria poucos benefícios ao manejo preconizado nos pacientes de alto risco.
Leia mais: Bactérias resistentes: qual melhor tratamento, tazocin ou meropenem?
Em transplantados renais, a incidência de infecção urinária é maior no primeiro mês pós-transplante. Durante esse período, o uso de profilaxias com antibióticos é frequente, mas o impacto na frequência de episódios de bacteriúria assintomático é incerto. O painel não fornece recomendação nem contra e nem a favor de rastreio nessa população. Após um mês da cirurgia, o rastreio não é recomendado.
Portanto, baseado nas evidências atuais, são raras as situações em que o rastreio e tratamento de bacteriúria assintomática são capazes de trazer benefícios, ao mesmo tempo em que o uso indiscriminado de antibióticos aumenta o risco de eventos adversos e de seleção de microrganismos resistentes.
Nas populações, entretanto, em que há indicação de rastreio, tratamento adequado deve ser instituído de acordo com o perfil de sensibilidade da bactéria isolada. Uso racional de antibióticos é mais do que reduzir o uso de antimicrobianos: é usar o antibiótico adequado, na situação e pelo tempo adequados.
É médico e quer ser colunista do Portal da PEBMED? Inscreva-se aqui!
Referências:
- Nicolle, LE, Gupta, K, Bradley, SF, Colgan, R, DeMuri, GP, Drekonja, D, Eckert, LO, Geerlings, SE, Koves, B, Hooton, TM, Juthani-Mehta, M, Knight, SL, Saint, S, Schaeffer, AJ, Trautner, B, Wult, B, Siemieniuk, R. Clinical Practice Guideline for the Management of Asymptomatic Bacteriuria: 2019 Uptodate by the Infectious Diseases Society of America. Clinical Infectious Diseases 2019
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.