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Infectologia1 janeiro 2025

Oropouche na gestação: o que você precisa saber sobre manejo dessas pacientes

O manejo clínico de casos de doença materna aguda é atualmente o mesmo que em pessoas não grávidas, mas será que esta é a abordagem ideal?
Por Raissa Moraes

Em 2023 tivemos um surto da doença causada pelo vírus Oropouche (OROV), uma zoonose tropical que era negligenciada anteriormente. Entretanto, é a mais frequentemente encontrada no Brasil, só perdendo para dengue.  

As razões para o surgimento repentino da febre oropouche no Brasil e países vizinhos são complexas e pouco claras. Além da evidência de rearranjo genético causando uma nova cepa de OROV, também há fatores relacionados ao ambiente e à história natural da infecção. Semelhante a outras doenças transmitidas por vetores, a disseminação é controlada pela interação entre clima, uso da terra, desmatamento, movimentos e migrações de humanos e animais.  

 

Entenda a doença 

O OROV ocorre naturalmente em dois ciclos: um ciclo silvestre, que inclui hospedeiros vertebrados específicos como reservatório natural (preguiças-de-garganta-pálida (Bradypus tridactylus), primatas não humanos, marsupiais e pássaros) e mosquitos e um ciclo urbano que consiste em humanos como hospedeiros amplificadores e vetores artrópodes, incluindo mosquitos picadores (Culicoides paraensis  e mosquitos (Aedes serratus e Culex quinquefasciatus). Atualmente, não há evidências de que o OROV seja transmissível de pessoa para pessoa, exceto pela transmissão vertical durante a gravidez, e permanece desconhecido se o OROV pode ser transmitido por fluidos corporais. 

O vírus OROV causa doença que é sintomática em aproximadamente 60% das pessoas infectadas e se apresenta com início abrupto de uma doença febril, dor de cabeça, artralgia, mialgia, náusea e vômito. Outros sintomas incluem diarreia, dor abdominal, dor retrorbitária, fotofobia, tontura, hiperemia conjuntival e erupção cutânea maculopapular que começa no tronco e se espalha para os membros. Sintomas hemorrágicos ocorrem com menos frequência e incluem petéquias, melena, menorragia, sangramento gengival e epistaxe. Dito isso, percebe-se que a febre Oropouche pode ser confundida com outras infecções arbovirais endêmicas na América Latina, incluindo dengue, chikungunya, Zika e Mayaro. A doença é tipicamente leve e os sintomas geralmente desaparecem em menos de uma semana, mas recorrências podem ocorrer em 60% a 70% dos casos. Uma das manifestações mais graves da febre de Oropouche é a infecção do sistema nervoso central que ocorre em aproximadamente 4% dos casos, incluindo meningite asséptica e meningoencefalite.

Incubação 

O período de incubação do OROV é variável entre três e dez dias após a picada de um artrópode infectado. Depois disso, os indivíduos infectados apresentam altos níveis de viremia do OROV, que diminui para níveis de 44% no dia 4 e 23% no dia 5 da doença, o que é um fator importante no desenvolvimento de infecção placentária em pacientes grávidas. 

O OROV foi definitivamente identificado em mulheres grávidas e seus bebês por diagnóstico biológico molecular na placenta; cordão umbilical; órgãos somáticos fetais, incluindo cérebro, rins, baço, pulmões, fígado, coração, líquido pleural e líquido cefalorraquidiano; anticorpos no soro de mães grávidas com resultados perinatais ruins e anticorpos no líquido cefalorraquidiano e soro de neonatos com microcefalia. 

Relatórios recentes da epidemia de febre de Oropouche em andamento em 2023–2024 indicam que este é o mais novo arbovírus a afetar negativamente os resultados da gravidez. No entanto, em retrospecto, houve evidências anteriores sugerindo que o OROV estava causando perdas gestacionais durante um surto que ocorreu em Manaus entre 1980 e 1981. Não deveria ser surpresa a ocorrência de infecções placentárias e de órgãos somáticos fetais após infecção materna durante o surto de OROV, já que vários bunyavírus têm tropismo por tecidos fetais e placentários, causando abortos, perdas fetais e múltiplas deformidades congênitas. 

Conclusão e mensagem prática 

Assim, é importante conscientizar médicos nas Américas, Europa e outros lugares sobre o potencial recentemente identificado de OROV causar complicações obstétricas e perinatais graves em mães infectadas de áreas endêmicas. Até o momento, o conhecimento sobre a febre Oropouche na gravidez é limitado a relatos de casos e permanece desconhecido se as mulheres grávidas são mais vulneráveis à infecção ou se a doença tem diferentes manifestações clínicas ou níveis de gravidade durante a gravidez.  

O manejo clínico de casos de doença materna aguda é atualmente o mesmo que em pessoas não grávidas e inclui medidas de suporte como analgesia, fluidos, medicamentos antipiréticos e repouso. Ao avaliar mulheres grávidas para febre de Oropouche, é importante excluir dengue, chikungunya, infecções pelo vírus Zika, malária e leptospirose. Não há vacina ou medicamento antiviral que seja eficaz para a febre Oropouche.  

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Referências bibliográficas

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