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Infectologia4 janeiro 2024

Doxiciclina para profilaxia de infecções sexualmente transmissíveis em mulheres

A incidência de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) tem crescido globalmente, principalmente casos de Chlamydia trachomatis, Neisseria gonorrhoeae e Treponema pallidum.

A incidência de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) vem aumentando globalmente. Casos de Chlamydia trachomatis, Neisseria gonorrhoeae e Treponema pallidum destacam-se como as principais infecções cuja transmissão está aumentando.

Tipicamente, as mulheres estão mais sujeitas a complicações causadas por essas ISTs, tais como dor pélvica crônica, infertilidade, gravidez ectópica, maior risco de infecção por HIV, e complicações fetais e obstétricas.

As estratégias de prevenção mais aplicadas até o momento — como abstinência, uso de preservativo, rastreio e tratamento de parceiros — não conseguiram frear o aumento de casos nessa população. Ao mesmo tempo, a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomendou que haja integração dos programas de profilaxia pré-exposição (PrEP) contra HIV com cuidados de prevenção contra aquisição de ISTs. Nesse contexto, o uso de doxiciclina como profilaxia pós-exposição (PEP) vem sendo estudado e um estudo publicado na The New England Journal of Medicine trouxe resultados sobre essa utilização.

Ouça também: Prevenção de ISTs – como o médico deve orientar [podcast]

Doxiciclina para profilaxia de infecções sexualmente transmissíveis em mulheres

Materiais e métodos

O estudo incluiu mulheres cisgênero, entre 18 e 30 anos, não gestantes e que estavam em uso de PrEP, no Quênia durante o período de fevereiro de 2020 e outubro de 2022. As participantes foram randomizadas na proporção 1:1 para receber o tratamento padrão de rastreio e tratamento de ISTs ou para receber PEP com doxiciclina em associação a essas práticas.

No grupo da PEP, as participantes foram instruídas a tomarem 200 mg de doxiciclina em até 72 horas após exposição sexual de risco, isto é, sem preservativo, com dose máxima diária de 200 mg independente do número de exposições no dia anterior.

O desfecho primário para avaliação de eficácia foi qualquer infecção incidente por C. trachomatis, N. gonorrhoeae e T. pallidum. O uso de doxiciclina foi avaliado por meio de teste em fios de cabelo. Amostras de swab endocervical que foram positivas para N. gonorrhoeae e/ou C. trachomatis foram utilizadas para pesquisa de resistência antimicrobiana.

Resultados do estudo sobre profilaxia de infecções sexualmente transmissíveis

Das 540 mulheres que foram triadas para o estudo, 449 foram incluídas e randomizadas: 224 foram alocadas no grupo de PEP com doxiciclina e 225, no grupo de tratamento padrão. A mediana de idade foi de 24,3 anos. Oitenta (17,9%) participantes receberam diagnóstico de IST (63 com C. trachomatis, 17 com N. gonorrhoeae, e 2 com T. pallidum).  Os grupos eram homogêneos em suas principais características e a proporção de participantes em cada grupo que completou 12 meses de seguimento foi semelhante.

Oitenta mulheres engravidaram durante o período no estudo, o que levou à interrupção do uso de doxiciclina nas 44 que estavam no grupo de PEP com a droga. Além desses casos, doxiciclina foi interrompida em 10 mulheres devido à mudança na parceria sexual, em 6 devido a eventos adversos e em 3 devido a danos sociais, como violência física e verbal.

A mediana de doses de doxiciclina administradas por mês foi 4. Calendários preenchidos pelas participantes mostraram cobertura de 80% em relação ao uso de doxiciclina após exposição sexual sem preservativo nas 2 semanas anteriores. A maioria das doses de doxiciclina relatadas haviam sido ingeridas em 24 horas após a exposição. Entre as 50 participantes no grupo de PEP que foram selecionadas de forma aleatória para participar da avaliação por meio da análise em fios de cabelo, a presença de doxiciclina foi detectada em 29,0% das visitas de seguimento do estudo. Excluindo-se as visitas em que a droga estava suspensa, doxiciclina foi detectada em 32,6% das visitas totais do estudo.

No total, 109 episódios incidentes e ISTs foram identificados, sendo 50 no grupo de PEP (25,1/100 pessoas-ano) e 59 no grupo de tratamento padrão (29,0/100 pessoas-ano). A maioria foram casos de C. trachomatis (85 casos), seguidos de 31 casos de N. gonorrhoeae e 1 caso de T. pallidum. Coinfecção de C. trachomatis e N. gonorrhoeae foi identificada em 8 participantes. Doze participantes apresentaram mais de uma infecção durante o estudo.

Saiba mais: ISTs na população em situação de rua

A incidência de ISTs não foi significativamente menor no grupo de PEP em comparação ao grupo de tratamento padrão (RR = 0,88; IC 95% = 0,60 – 1,29; p = 0,51), assim como o tempo para primeira IST. Análises de subgrupo de acordo com idade, uso de contraceptivos, história de sexo comercial e detecção de IST na inclusão mostraram resultados semelhantes.

Em relação à resistência antimicrobiana, 100% das amostras de N. gonorrhoeae apresentavam o gene tet(M), associado a resistência de alto nível a tetracicilinas, tanto na inclusão quanto durante o seguimento do estudo. Das 76 amostras de C. trachomatis analisadas, nenhuma apresentava o gene tet(C), também associado à resistência a tetraciclinas.

Nenhum evento adverso grave relacionado à doxiciclina foi reportado. Os eventos mais frequentes foram náuseas, relatadas em 7,2% das visitas de seguimento no grupo de PEP e em 4,6% no grupo de tratamento padrão.

Mensagens práticas

  • Nesse estudo conduzido no Quênia, o uso de doxiciclina como profilaxia pós-exposição para infecções sexualmente transmissíveis não mostrou benefício em relação à estratégia padrão de rastreio e tratamento somente.
  • Esses resultados são diferentes dos mostrados em homens cisgênero e mulheres transgênero, os quais mostraram redução na incidência de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) com o uso de doxiciclina.
  • Baixa adesão à PEP com doxiciclina e resistência bacteriana podem ser fatores que expliquem a diferença de resultado entre os estudos.
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Referências bibliográficas

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