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Hematologia6 junho 2023

Manejo de sangramento em pacientes que utilizam anticoagulantes orais diretos

Frente a um paciente com sangramento ativo secundário ao uso de DOAC, devemos solicitar alguns exames laboratoriais para melhor avaliação.

Por Felipe Mesquita

Os anticoagulantes orais diretos (DOACs), também conhecidos como novos anticoagulantes orais não-vitamina K dependentes (NOACs), vêm ganhando espaço no manejo de pacientes com diagnóstico de episódios tromboembólicos de origem venosa (TEV) ou arterial e naqueles com indicação de profilaxia para tais eventos.

Leia também: Principais orientações na prescrição de anticoagulantes

Diversos estudos envolvendo a rivaroxabana, apixabana e dabigatrana vem sendo publicados ao longo dos anos evidenciando não-inferioridade em eficácia e segurança, quando comparados aos antagonistas de vitamina K (Varfarina), no tratamento de pacientes com TEV e fibrilação atrial não-valvar. Pela posologia mais cômoda e menor necessidade de exames laboratoriais para controle de níveis terapêuticos, essa classe de drogas se tornou a primeira escolha de muitos médicos assistentes salvo se contraindicações claras.  

No entanto, um grande desafio permanece: como lidar com sangramentos associados ao uso dessas medicações? Apesar das limitações técnico-científicas, mais evidentes em países em desenvolvimento, e da ausência de um corpo de evidências robusto, iremos abordar um pouco do assunto neste artigo.  

Graduando o sangramento 

A graduação de sangramento mais utilizada segue três categorias: sangramentos maiores, sangramentos clinicamente relevantes e sangramentos menores.  

  • Sangramentos clinicamente relevantes: são em geral sangramentos de extensão e volume moderados que requerem internação hospitalar e/ou conduta imediata por parte do médico assistente, porém sem repercussão hemodinâmica ou sangramento em áreas ou órgãos críticos. Não requer transfusão e não está associada a anemias significativas. Sangramentos de trato gastrointestinal são o maior exemplo. Essa é a graduação a partir da qual devemos tomar uma ação. O DOAC deve ser interrompido.  
  • Sangramento maior (critérios da ISTH): sangramentos fatais; ou que ocorrem em áreas/órgãos críticos como intracraniano, intraperitoneal, ocular, pericárdico, intramuscular; ou associados a queda de 2g/dL nos níveis séricos de hemoglobina e que motivem transfusão de 02 ou mais concentrados de hemácias. O DOAC deve ser interrompido. Idealmente, iniciar agente de reversão.  
  • Sangramento menor: medidas de contenção local do sangramento. Não implicam em suspensão do DOAC.  

Medidas gerais iniciais 

Frente a um paciente com sangramento ativo secundário ao uso de DOAC, devemos solicitar alguns exames laboratoriais para avaliar o risco de extensão e piora do sangramento a depender das comorbidades: função renal, função hepática, hemograma, Coagulograma II (INR, TP e TTPa), cálcio iônico, fibrinogênio.

Quando disponível, devemos solicitar a medida dos níveis séricos do DOAC e da atividade específica do FXa, uma vez que este é pouco representado pelo coagulograma. Para avaliação do dabigatran, o tempo de trombina diluída (TTd) traz informações valiosas. Quando este está normal ou mensurável, indica a presença de baixa quantidade da droga no sangue. Em alguns hospitais existem coagulogramas ajustados para DOACs. 

Como os DOACs possuem uma meia-vida breve (5 – 17h), devemos observar sempre o tempo decorrido da última ingesta. Nos casos em que a última ingesta foi superior à meia-vida, o mais adequado pode ser apenas observação clínica e medidas de suporte. Caso a ingesta tenha sido há menos de duas horas, o uso de lavagem gástrica, carvão ativado ou hemodiálise (esta mais eficaz para o dabigatran) pode ser tentado.  

Nos casos indicados, lançar mão de Concentrado de Complexo Protrombínico 50IU/kg na ausência de agentes de reversão (conduta off-label). O ácido tranexâmico também pode ser tentado nos sangramentos graves. Medidas locais de contenção devem ser instauradas. 

Definindo a classe terapêutica 

O primeiro passo é definir a classe terapêutica à qual pertence o medicamento utilizado. Os inibidores do fator X ativado (FXa) são: rivaroxabana, apixabana, edoxabana e betrixabana. Para os dois primeiros compostos ativos, temos aprovado pelo FDA e pelo EMA o antídoto adexanet alfa com base nos estudos pivotais ANNEXA-A e ANNEXA-R. Para os outros compostos de mesma classe não possuímos um agente para reversão de sangramento específico. A administração é por via endovenosa e as doses variam conforme as tabelas abaixo, que leva em consideração a posologia do DOAC e o tempo transcorrido desde a última ingesta. 

Tabela 1: Posologia de adexanet alfa com base na dose e última ingesta do DOAC. 

Droga Última dose Ingesta < 8h ou desconhecida Ingesta ≥ 8 horas. 
Apixabana ≤ 5mg Baixa dose Baixa dose 
Apixabana > 5mg/desconhecido Alta dose Baixa dose 
Rivaroxabana ≤ 10mg Baixa dose Baixa dose 
Rivaroxabana > 10mg/desconhecido Alta dose Baixa dose 

 Tabela 2: Determinação de dose do adexanet alfa. 

Categorização Dose venosa inicial (bolus) Dose intravenosa contínua Nº de frascos de 200mg  
Baixa dose 400mg (correr a 30mg/min) 4mg/min por 120 minutos 5 
Alta dose 800mg (correr a 30mg/min) 8mg/min por 120 minutos 9 

Veja também: Anticoagulação na fibrilação atrial e doença renal crônica

O etexilato de dabigatrana corresponde a um inibidor do fator II ativado (FIIa) e possui o anticorpo monoclonal idarucizumab como antídoto aprovado pelo FDA e pelo EMA com base no estudo de fase III RE-VERSE AD. A posologia é de 2 administrações de 2,5g em bolus (50mL) separadas em 15 minutos (total: 5g). Uma nova dose pode ser necessária após 12 a 24 horas.  

Ambos os antídotos mencionados acima não necessitam de ajuste pela idade, função hepática ou renal. Contraindicação ao uso do adexanet alfa é a hipersensibilidade aos ingredientes da fórmula e alergia conhecida a proteína de hamster (conforme descrito em bula).  

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Referências bibliográficas

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