Estudo Apollo para leucemia promielocítica de alto risco: Dados do EHA 2024
Dentre os trabalhos de grande destaque, nos deparamos com os resultados preliminares de um estudo de fase 3, randomizado, conduzido pelo investigador principal espanhol Dr. Miguel Sanz, que comparou o tratamento de primeira linha em pacientes diagnosticados com leucemia promielocítica de alto risco abordados com a combinação de trióxido de arsênico (ATO) com ATRA (ácido all-trans-retinoico) e idarrubicina versus a terapia padrão estabelecida hoje para esse grupo de pacientes, que consiste em ATRA associado a um regime quimioterápico baseado em antraciclinas (conhecido como regime AIDA – idarrubicina/daunorrubicina + ATRA + citarabina).
A combinação de ATRA + ATO atualmente já é padrão para o tratamento de pacientes com essa leucose aguda, porém de risco baixo a intermediário (global de leucócitos ≤ 10 x 10^9/L), aprovada tanto pelo FDA como pela EMA (Estudo pivotal APL0406). Até o momento, o uso de ATO para pacientes de alto risco não estava consolidado na literatura, principalmente pela ausência de ensaios clínicos randomizados. O estudo APOLLO veio para resolver esse problema.
Pacientes incluídos na análise e randomização
Como critérios de inclusão relatados no estudo destacamos: pacientes com diagnóstico de leucemia aguda pró-mielocítica (APL) de novo, entre 18 e 65 anos de idade, classificados como alto risco (global de leucócitos > 10 x 109/L), ECOG 0-3 pontos, bilirrubina total sérica ≤ 3,0 mg/dL e creatinina sérica ≤ 3,0 mg/dL.
Um total de 133 pacientes foram arrolados no estudo (de 2016 a 2022) em 143 centros de 06 países europeus, sendo que inicialmente planejava-se inscrever ao menos 280. A pandemia do SARS-CoV-2 atrasou o início do recrutamento e da randomização, enquanto o estudo foi terminado antes do prazo devido ao vencimento da droga destinada ao estudo. 131 pacientes foram avaliados para os desfechos, enquanto 120 pacientes foram avaliados quanto ao status da doença após a indução. A mediana de seguimento foi de 31 meses. Não houve diferença significativa entre os braços nas características de base dos pacientes recrutados.
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Os pacientes foram randomizados entre dois braços: (I) no braço intervenção, os participantes receberiam duas doses de idarrubicina 12 mg/m² por via endovenosa nos primeiros dias da indução juntamente com ATRA, e após as doses iniciais de idarrubicina, estes seguiram com ATO + ATRA até remissão completa. A manutenção foi feita com associação de ATO (04 semanas sim e 04 semanas não) + ATRA (14 dias sim e 14 dias não); (II) o grupo intervenção recebeu o esquema padrão AINDA, com metotrexato na consolidação e manutenção com 6-mercaptopurina associado à metotrexato por 2 anos.
Desfechos escolhidos
Desfechos primários: sobrevida livre de evento, recidiva (molecular/hematológica), não atingir remissão completa após a terapia de indução, não atingir remissão molecular após o último curso de consolidação (resistência molecular), morte incluindo morte precoce dentre de 30 dias da randomização e desenvolvimento de leucemia ou mielodisplasia secundária.
Desfecho secundário: taxa de resposta completa após indução, taxa de morte precoce durante indução, taxa de sobrevida global em dois anos, taxa de incidência cumulativa de recaída em dois anos, avaliação da redução do nível de transcrito PML/RARα durante o tratamento, avaliação de qualidade de vida por escalas validadas na literatura
Resultados
Houve diferença estatística favorecendo o braço intervenção quando a sobrevida livre de evento foi avaliada, com um p valor de 0,02 em dois anos e estimado em 0,0034 para 05 anos. Esse ganho significativo foi atribuído às menores incidências de recidiva e resistência molecular. Em termos de sobrevida global, não houve ganho estatisticamente significante, com as medianas de resposta para braço intervenção e controle, em 2 e 5 anos, sendo respectivamente: 93% vs 87% e 93% vs 82%. Em termos de mortalidade precoce, ambos os braços foram equiparáveis.
A toxicidade hematológica foi marcadamente pior no braço controle, principalmente no que tange à trombocitopenia e neutropenia; o prolongamento do intervalo QT foi somente observado no braço intervenção, sendo uma complicação quase que exclusiva do ATO. Apesar de não observarmos uma significância estatística, a incidência de síndrome de diferenciação foi 3,2x maior no braço controle (1,5 vs 4,8; p = 0,27).
Conclusão: estudo APOLLO
O estudo APOLLO foi um grande passo para o estabelecimento da eficácia e segurança do esquema ATRA+ATO para a população com APL de novo de alto risco. A toxicidade manejável dessa associação e a menor toxicidade hematológica de curto prazo e cardíaca de longo prazo (menor sobrecarga de antracíclicos) torna este regime muito atraente. Ainda, as menores recidivas e resistências moleculares tendem a favorecer esse esquema terapêutico.
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