No EHA 2025, Dr. Daniel Kerr, da Universidade de Tampa, trouxe a apresentação de mais uma das coortes do grande guarda-chuva EPCORE-NHL. Dessa vez, foi explorada a coorte 3, onde é feita a a associação do Epcoritamabe + Pola + RCHP em primeira linha no linfoma difuso de grandes células B (LDGCB), como parte do protocolo EPCORE NHL-5. Podemos chamar este trabalho de Epco + POLARIX, para facilitar.
R-CHOP
O autor iniciou sua apresentação trazendo o retrospecto de que o R-CHOP foi o padrão de tratamento pelos últimos 20 anos do LDGCB, e mesmo com ele, 40% dos pacientes não alcançam a cura na primeira linha.
Nos últimos anos, o estudo POLARIX trouxe a possibilidade de incremento de sobrevida livre de progressão ao acrescentar o polatuzumabe vedotina ao esquema, mas sem efeito em sobrevida global. Já no Congresso da Associação Europeia de Hematologia (EHA) de 2024, em Madri, foram apresentados os primeiros resultados do estudo fase 1b/2 da combinação Epcoritamabe + Polatuzumabe + RCHP, com taxas de resposta completa em torno de 89%. À época, a mediana de follow up destes pacientes era bem curta, de 5.8 meses, e a apresentação do dr Kerr trouxe novos dados sobre essa coorte, agora com mediana de follow up de 16.1 meses.
Os critérios de inclusão principais do trabalho foram:
- Pacientes com 18 anos ou mais, portadores de LDGCB CD20+ (poderia ser LDGCB de novo, transformado de linfoma folicular ou zona marginal, folicular grau 3b, double hit, triple hit)
- IPI 2-5
- ECOG 0-2
Leia também: EHA 2025: POLARGO trial – novo standard of care
Regime de tratamento resumido
Ciclos de 21 dias :
Droga |
C1 |
C2 |
C3 |
C4 |
C5 |
C6 |
C7 |
C8 |
Epcoritamabe |
D1: 0.16mg D8: 0.8mg D15: 24 ou 48mg |
D1, D8 e D15 dose cheia |
D1 |
D1 |
D1 |
D1 | ||
Polatuzumabe-vedotina 1.8mg/kg |
D1 | D1 | D1 | D1 | D1 | D1 |
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Rituximabe 375mg/m²
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D1 |
D1 |
D1 |
D1 |
D1 |
D1 |
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Ciclofosfamida 750mg/m² |
D1 | D1 | D1 | D1 | D1 | D1 |
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Doxorrubicina 50mg/m² |
D1 | D1 | D1 | D1 | D1 | D1 |
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Prednisona 100mg |
D1 | D1 | D1 | D1 | D1 | D1 |
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# Adaptado da apresentação oral “Durable efficacy with fixed-duration epcoritamab + polatuzumab vedotin, rituximab, cyclophosphamide, doxorubicin and prednisone (POLA-R-CHP) FOR 1L diffuse large b cell lymphoma (EPCORE NHL-5)” por Daniel Kerr no 30º Congresso EHA, 2025 – Milão/ Itália
Foram avaliados 37 pacientes, cuja mediana de idade dos pacientes era de 64 anos, 94% com diagnóstico de LDGCB de novo, a maioria estádio clínico IV (65%), 47% com IPI de 3 e 28% IPI de 4 a 5. No que diz respeito à célula de origem, 54% dos pacientes pertenciam ao grupo de centro germinativo enquanto 43% pertenciam ao grupo célula B ativada. Havia apenas 1 paciente triple hit dentre a coorte.
Em relação às toxicidades, 5 dos 37 pacientes descontinuaram o epcoritamabe, sendo 4 deles por eventos adversos ou infecções (1 destes 4 por elevação persistente de transaminases após o C5 – que se resolveu após a suspensão da droga, e o paciente persistiu em resposta completa).
A mesma proporção de pacientes também descontinuou Pola-R-CHP. A mediana de tempo de exposição ao epcoritamabe foi de 5.1 meses, a maioria dos pacientes completando os 8 ciclos previstos pelo estudo. Os principais efeitos adversos que levaram ao atraso da liberação do epcoritamabe foram: neutropenia (46% dos pacientes, que em sua totalidade conseguiram retomar o tratamento) e infecções (41% dos pacientes, sendo que 93% retomaram epcoritamabe após). Não foram necessárias reduções de dose significativas
Em termos de taxas de resposta, os resultados impressionam: 100% de resposta global, sendo 97% resposta completa e 3% resposta parcial (apenas 1 paciente). Vamos lembrar que trata-se de uma população predominantemente composta por estadio avançado de doença, ⅓ pertencendo a IPI’s de alto risco. A mediana de tempo para resposta foi de 2.7 meses (1.3-3.3), e tanto a mediana de duração de resposta quando sobrevida livre de progressão não foram atingidas no follow up de 16 meses.
Vale à pena mencionar que síndrome de liberação de citocinas ocorreu em 51% dos pacientes, mas todas graus 1 ou 2, e o uso de tocilizumabe só foi necessário em 7 dos 37 pacientes, a maioria após a primeira dose cheia de epcoritamabe. 65% dos paciente tiveram neutropenia graus 3-4, o que já era esperado.
O autor seguiu sua apresentação com explanações biológicas e avaliações feitas com as amostras dos pacientes do estudo. Seus principais achados foram associados ao aumento de uma população linfocitária T CD8 e compartimentos efetores de memória naqueles que receberam epcoritamabe. Ainda a avaliação de doença residual mínima (DRM) por DNA tumoral circulante (ctDNA) mostrou excelentes respostas e DRM negativa alcançada já no segundo ciclo de tratamento.
Hoje sabemos que este é, por si só, um bom marcador prognóstico, e que se mantiveram persistente mesmo muito tempo após o término de tratamento. Dos pacientes que alcançaram resposta completa, 83% também apresentavam DRM negativa por ctDNA.
Com isso, Dr. Kerr encerrou sua apresentação concluindo que a associação Epcoritamabe + Polatuzumabe-vedotina + RCHP parece ser um regime seguro e com potencial de grande eficácia no contexto de primeira linha de tratamento de linfoma difuso de grandes células B.
Como era de se esperar, a plateia perguntou sobre diferença de eficácia em relação à célula de origem, ao que o autor respondeu “Certamente, com uma coorte tão pequena, e com resposta global de 100%, é difícil diferenciar. Ao que parece, o efeito é similar em relação à célula de origem, mas precisaremos de mais dados para dizer com certeza”.
Leia mais: EHA 2025: Dasatinibe em associação à quimioterapia na LMA com mutação CBF
E como isso muda nossa prática clínica?
- Um tratamento que leva 100% dos pacientes à resposta chama a atenção da comunidade médica. No entanto, os dados ainda são prematuros em termos de eficácia, o tempo de seguimento é curto e o número de pacientes envolvidos no estudo também é bem diminuto – afinal, trata-se de um estudo fase 1b/2.
- O R-CHOP, que estamos acostumados a prescrever, tem taxas de resposta completa que variam de 68 a 89% dependendo da coorte, e os dados de resposta completa do estudo POLARIX são de 78% (neste mesmo estudo, o braço controle R-CHOP exibiu 74% de taxa de resposta completa). Evidentemente, a adição de epcoritamabe pode agregar benefício neste parâmetro, mas ainda não se pode dizer que essa resposta será sustentada com os dados que dispomos hoje.
- Há que se fazer, contudo, uma ponderação: no momento atual, nem o Pola-R-CHP é indicado a todos os tipos de paciente com linfoma difuso de grandes células B em primeira linha. Alguns serviços (e a própria apresentação do grupo europeu de linfomas nesta mesma edição do EHA 2025) sugerem este regime para estádios clínicos avançados e principalmente subtipo célula B ativada, por exemplo. No estudo acima, o Pola-R-CHP foi padrão para qualquer estádio e subtipo de célula de origem – e talvez isso não seja aplicável na prática por agregar um custo muito mais alto a populações que eventualmente não se beneficiariam tanto.
- No Brasil, o epcoritamabe já é liberado para prescrição em ambiente de saúde suplementar, com indicação em bula para LDGCB recaído após 2 ou mais linhas de tratamento prévias. Não há aprovação para uso em primeira linha até junho de 2025.
- Se estudos de fase 3 e com maiores coortes confirmarem um benefício de longo prazo com epcoritamabe na primeira linha, as operadoras de saúde devem se preparar, pois até o presente momento, uma ampola de 60mg da droga (ou seja, suficiente para 1 aplicação de 48mg) custa em média R$ 70.000,00.
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