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Hematologia16 junho 2025

EHA 2025: Dasatinibe em associação à quimioterapia na LMA com mutação CBF

Para iniciar a sessão de alterações genéticas e estratificação de risco em leucemia mielóide aguda do 30º Congresso da Sociedade Europeia de Hematologia, as Dras. Pryinaka Mehta e Laura Cicconi convidaram Prof Hartmut Döhner (também conhecido como primeiro autor das diretrizes de tratamento de leucemia mielóide aguda do European Leukemia Net) a apresentar um estudo fase 3 que há algum tempo já conhecemos.  

AMLSG 21‑13

Trata-se do estudo AMLSG 21‑13, fase 3 que comparou desfechos clínicos em pacientes com leucemia mielóide aguda core binding factor (LMA-CBF) que receberam quimioterapia intensiva com ou sem dasatinibe. A apresentação que se deu no dia 14 de junho de 2025 e trouxe os resultados finais do estudo. 

As mutações de ativação do kit podem ocorrer em 30-37% dos casos de LMA-CBF, e possuem pior prognóstico comparadas ao kit selvagem. Baseados em modelos animais que mostraram efeito sinérgico do dasatinibe com a citarabina em LMA t(8;21) e a atividade do dasatinibe em contexto de kit mutado, criou-se o racional da adição deste inibidor de tirosina quinase à estratégia frontline das LMA-CBF.

O estudo de fase 1b/2 (AMLSG 11-08) havia mostrado que a adição do dasatinibe à quimioterapia intensiva tinha perfil de toxicidade seguro e manejável, e ao comparar os desfechos clínico com coortes históricas, os pacientes tratados com dasatinibe pareciam ter uma tendência de melhor sobrevida livre de progressão e incidência cumulativa de recaída comparados aos que não recebiam. 

Leia também: EHA 2025: POLARGO trial – novo standard of care

Desenho do estudo: 

Pacientes com 18 anos ou mais, LMA-CBF, eram randomizados 1:1 para receber regime intensivo à base de dauno ou idarrubicina + citarabina com ou sem dasatinibe. O dasatinibe seria mantido na dose 100mg/d do D1-D28 da indução, D6-D26 da consolidação e de forma contínua na manutenção por 1 ano. 

Desfecho primário: sobrevida livre de eventos 

De agosto de 2014 a fevereiro de 2021, 202 pacientes foram randomizados.  

A maioria dos pacientes apresentava LMA de novo e uma mediana de idade ao diagnóstico em torno de 49 anos, semelhante entre os grupos. A mutação do kit estava presente em 31.4% dos pacientes do braço controle e 26% do braço com dasatinibe. Mutações do FLT3, tanto ITD quanto TKD, foram incomuns, mas mais frequentes naqueles com LMA inv(16).

Resultados

Os principais resultados foram: 

 

Braço QT convencional (n = 102) 

QT convencional + dasatinibe (n = 100) 

Taxa de resposta completa 

98% 

91% 

Mortalidade em 30 dias 

2% 

3% 

Transplante alogênico de medula óssea na primeira resposta completa 

2.9% 

3.0% 

Mediana de follow up 63.4 meses 

HR / CI /p value 

Sobrevida livre de eventos em 4 anos 41% 44% 

0.92 / 0.63 – 1.33 / p = 0.66 

Sobrevida global em 4 anos 76% 78% 

0.93 / 0.53 – 1.63/ p = 0.79 

Na análise multivariada, ter recebido ou não o dasatinibe na primeira linha não impactou na sobrevida livre de eventos. O que impactou tanto sobrevida livre de eventos quanto sobrevida global foi a presença da mutação do kit (HR 1.94 CI 1.28-1.95, p 0.002 para sobrevida livre de eventos).

Nesse momento, você pode pensar “Ora… mas talvez o dasatinibe só tenha verdadeiro impacto clínico no grupo que de fato tem a mutação do kit, que correspondia a algo como 30% da população do estudo, certo?”. Sim e não. 

O racional faz sentido, mas ao expor justamente essa análise, o Dr Döhner mostrou que o status mutacional do kit não impacta em diferenças clínicas entre os braços. Ou seja, o dasatinibe é democrático: não faz diferença nem para o kit mutado nem para o selvagem.

Quanto aos eventos adversos, o grupo que recebeu dasatinibe junto à quimioterapia convencional apresentou maior taxa de colite, fibrilação atrial e lesão renal aguda. A proporção de pacientes com eventos adversos sérios foi maior no grupo que recebeu dasatinibe (64% comparado a 36% no grupo que não recebeu), e os eventos adversos mais comuns foram pneumonia, sepse e neutropenia febril.  

Nas perguntas finais, a Dra Mehta ainda questionou se por acaso as toxicidades encontradas poderiam ter limitado doses mais altas de dasatinibe que eventualmente levariam ao desfecho que o estudo acreditou que encontraria. Nisso, dr Döhner foi categórico, e basicamente disse que a dose aplicada já foi considerada elevada, e que seguiu o protocolo como idealizado.  

Ou seja: não foi um bom dia para o dasatinibe (e talvez para outros ITK, como a própria midostaurina, que também já foi testada para LMA-CBF, sem demonstrar benefício).4 

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Como isso impacta na nossa prática clínica? 

 

  • O dasatinibe, que já não era prescrito na prática  para os pacientes LMA-CBF, parece ter sido permanentemente descartado nas suas indicações mais clássicas em leucemia mielóide crônica e linfóide aguda com PH+. 
  • O gentuzumabe-ozogamicina segue soberano como a principal droga acompanhando a quimioterapia intensiva para estes pacientes, e até mesmo para demais LMA de baixo risco, segundo algumas referências. 

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Referências bibliográficas

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