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Hematologia2 janeiro 2020

Como fazer o manejo da síndrome mielodisplásica?

A síndrome mielodisplásica representa um grupo heterogêneo de desordens hematológicas caracterizadas por hematopoiese ineficaz e displásica.

A síndrome mielodisplásica representa um grupo heterogêneo de desordens hematológicas caracterizadas por hematopoiese ineficaz e displásica, que predomina nos indivíduos idosos. O impacto na hematopoiese normal resulta em citopenia(s), sendo a anemia a mais comum. Os pacientes podem apresentar complicações relacionadas à falência medular (como infecções e sangramentos), bem como há maior risco de evolução para leucemia mieloide aguda.

Síndrome mielodisplásica

O tratamento depende da estratificação de risco de cada paciente, uma vez que os objetivos são variados. Na doença de baixo risco, visa-se o controle da(s) citopenia(s) a fim de melhorar a qualidade de vida, enquanto que, nos casos de alto risco, objetiva-se retardar a progressão da doença e consequentemente prolongar a sobrevida.

A única modalidade terapêutica potencialmente curativa é o transplante alogênico de células-tronco hematopoiéticas. No entanto, devido à alta morbimortalidade associada ao procedimento, o transplante deve ser considerado em casos selecionados.

Leia também: Ferropenia na gestação: qual a melhor abordagem?

Estratificação de risco

O Revised International Prognostic Scoring System (IPSS-R) é um escore prognóstico que leva em consideração cinco critérios: percentual de blastos na medula óssea, cariótipo, hemoglobina, plaquetometria e contagem de neutrófilos:

  • Percentual de blastos na medula óssea: ≤ 2% = 0 ponto; 2-5% = 1 ponto; 5-10% = 2 pontos; > 10% = 3 pontos;
  • Cariótipo: muito bom (ex.: del(11q), -Y) = 0 ponto; bom (ex.: cariótipo normal, del(5q)) = 1 ponto; intermediário (ex.: del(7q)) = 2 pontos; ruim (ex.: del(3q), -7) = 3 pontos; muito ruim (ex.: ≥ 3 anormalidades) = 4 pontos;
  • Hemoglobina: ≥ 10 g/dL = 0 ponto; 8-9,9 g/dL = 1 ponto; < 8 g/dL = 1,5 ponto;
  • Plaquetometria: ≥ 100.000/mm³ = 0 ponto; 50.000-99.000/mm³ = 0,5 ponto; < 50.000/mm³ = 1 ponto;
  • Contagem de neutrófilos: ≥ 800/mm³ = 0 ponto; < 800/mm³ = 0,5 ponto.

Os pacientes são categorizados em cinco grupos de acordo com o risco: muito baixo, baixo, intermediário, alto e muito alto:

  • Muito baixo risco = ≤ 1,5 ponto;
  • Baixo risco = 2-3 pontos;
  • Risco intermediário = 3,5-4,5 pontos;
  • Alto risco = 5-6 pontos;
  • Muito alto risco = > 6 pontos.

Síndrome mielodisplásica de risco mais baixo (IPSS-R < 4)

Conduta expectante pode ser adotada na presença de citopenia(s) leve(s) e assintomática(s). Anemia leve (hemoglobina > 10 g/dL) normalmente é assintomática, mas as manifestações de síndrome anêmica podem estar presentes dependendo da idade, das comorbidades e das atividades diárias do paciente. Infecções e sangramentos são raros, porém não impossíveis, quando a contagem de neutrófilos encontra-se acima de 500/mm³ e de plaquetas acima de 50.000/mm³, respectivamente.

Fator estimulador de eritropoiese, em geral, é o tratamento usado nos casos de anemia moderada ou sintomática. A taxa de resposta é inversamente proporcional aos níveis basais de eritropoetina e costuma ocorrer dentro de três meses após início da terapia, com duração média de 18-24 meses. Idealmente, o fator estimulador de eritropoiese é iniciado antes de instalada dependência transfusional, mesmo com eritropoetina sérica acima de 500 U/L. O alvo de hemoglobina é entre 11 e 12 g/dL. Deve-se considerar transfusão de hemácias se anemia grave e sintomática. Quando o paciente recebe múltiplas transfusões e desenvolve sobrecarga de ferro, indica-se quelação de ferro.

Neutropenia e trombocitopenia graves podem ser manejadas com o uso de fator estimulador de colônia de granulócitos e de agentes androgênicos, respectivamente, apesar de não haver dados na literatura que comprovem benefício em termos de sobrevida.

Quando há refratariedade às medidas “conservadoras”, tratamento especializado (como agentes hipometilantes e lenalidomida) deve ser ponderado. Transplante alogênico pode ser avaliado em indivíduos jovens com IPSS-R intermediário, particularmente na presença de mutações associadas a pior prognóstico (como RUNX1, ASXL1, TP53).

Veja mais: Uma revisão sobre policitemia vera e trombocitemia essencial

Síndrome mielodisplásica de risco mais alto (IPSS-R ≥ 4)

Sempre que possível, deve-se considerar o transplante alogênico de células-tronco hematopoiéticas. No entanto, muitos pacientes não são candidatos ao procedimento devido à idade avançada e/ou às comorbidades associadas; por vezes, os pacientes têm condições clínicas de serem submetido ao transplante, porém não têm um doador compatível.

Esses casos são conduzidos com agentes hipometilantes e medidas de suporte. A resposta tende a ser mais tardia, e, por isso, a doença não deve ser considerada refratária antes de seis meses de tratamento (a menos que haja progressão para leucemia aguda). Alcançada a resposta, o agente hipometilante é mantido até progressão de doença ou intolerabilidade.

Indivíduos que evoluem para leucemia mieloide aguda são manejados de acordo com o protocolo para leucemia, mas costumam apresentar resposta inferior ao tratamento quando comparados aos demais pacientes. Recentemente, o inibidor de BCL2, venetoclax, foi aprovado nesse contexto, em combinação com agente hipometilante, para pacientes inelegíveis à quimioterapia intensiva.

Referências bibliográficas:

  • Fenaux P, Platzbecker U and Ades L. How we manage adults with myelodysplastic syndrome. British Journal of Haematology (2019).
  • Greenberg PL, Tuechler H, Schanz J, et al. Revised international prognostic scoring system for myelodysplastic syndromes. Blood, 2012, 120, 2454-2465.
  • Efficace F, Cottone F, Abel G, et al. Patient-reported outcomes enhance the survival prediction of traditional disease risk classifications: an international study in patients with myelodysplastic syndromes. Cancer, 2018, 124, 1251-1259.
  • Fenaux P, Santini V, Spiriti MAA, et al. A phase 3 randomized, placebo-controlled study assessing the efficacy and safety of epoetin-a in anemic patients with low-risk MDS. Leukemia,
    2018, 32, 2648-2658.
  • Fenaux P, Mufti GJ, Hellstrom-Lindberg E, et al. Efficacy of azacitidine compared with that of conventional care regimens in the treatment of higher-risk myelodysplastic syndromes: a randomised, open-label, phase III study. The Lancet Oncology, 2009, 10, 223-232.
  • DiNardo CD, Pratz KW, Letai A, et al. Safety and preliminary efficacy of venetoclax with decitabine or azacitidine in elderly patients with previously untreated acute myeloid leukaemia: a non-randomised, open-label, phase 1b study. The Lancet Oncology, 2018, 19, 216-228.

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