Em janeiro de 2022 o The New England Journal of Medicine trouxe uma revisão de uma condição nosológica comum na endocrinologia ginecológica, a Insuficiência Ovariana Primária, que no Brasil conhecemos mais pela sinonímia Insuficiência Ovariana Prematura (IOP).
Insuficiência ovariana prematura (IOP) é uma síndrome decorrente da perda da atividade ovariana antes dos 40 anos de idade. Os sintomas clínicos refletem o estado de hipoestrogenismo, caracterizado por distúrbio do ciclo menstrual, com intervalos longos e irregulares até amenorreia secundária, ou mesmo como amenorreia primária, quando a redução/perda da função ovariana ocorre antes do processo puberal. Laboratorialmente é caracterizada como um estado de hipogonadismo hipergonadotrófico.
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A privação prematura de estrogênio endógeno está associada a riscos aumentados de osteoporose, doenças cardiovasculares e disfunção cognitiva.
Apresentação clínica
A IOP manifesta-se como amenorreia primária ou secundária. Amenorreia por mais de 3 meses em uma mulher com menos de 45 anos de idade com histórico de ciclos regulares ou por mais de 6 meses em uma mulher com histórico de ciclos menstruais irregulares sempre merece avaliação.
Os sintomas climatéricos (ondas de calor, distúrbios do humor, distúrbios do sono, sintomas de secura vaginal e função sexual prejudicada), se presentes, geralmente não são reconhecidos, levando ao atraso no diagnóstico e tratamento.
Diagnóstico
A avaliação diagnóstica inicial inclui uma história cuidadosa e exame físico. Uma história familiar completa deve ser obtida, incluindo idades da menopausa, bem como quaisquer casos conhecidos de insuficiência ovariana primária e amenorreia entre os membros da família.
A avaliação laboratorial inclui um teste sérico de gravidez e dosagem de prolactina, TSH e FSH. Níveis elevados de FSH apontam para uma causa ovariana de amenorreia e devem ser reavaliados simultaneamente com estradiol sérico 1 mês após a primeira medição. Se o nível de FSH permanecer alto e o nível de estradiol estiver baixo, o diagnóstico de insuficiência ovariana primária é confirmado, e avaliação adicional é indicada para identificar a causa.
No Brasil, a FEBRASGO, traz que o principal exame para sua caracterização é a dosagem do FSH. Considera-se o diagnóstico de IOP quando FSH é maior que 25 mUI/mL, em dois momentos distintos, medidos com intervalo de ao menos quatro semanas.
Após a avaliação inicial, prossegue-se a investigação etiológica, lembrando que cerca de 70% dos casos são idiopáticos:
- Causas genéticas: recomenda-se obtenção de cariótipo em todos os casos;
- Causas autoimunes: recomenda-se dosagem de anti-TPO, TSH, anticorpos da 21-hidroxilase adrenal e níveis de glicemia de jejum ou hemoglobina glicosilada;
- Causas iatrogênicas: a história clínica fornecerá dados para esta etiologia quanto à cirurgia, à rádio ou à quimioterapia.
Tratamento
O tratamento eficaz da insuficiência ovariana primária inclui aconselhamento psicológico, manejo dos sintomas, terapia de reposição hormonal (TH), fornecimento de contracepção, assistência à fertilidade e, dependendo da causa específica, aconselhamento genético familiar e manejo das condições associadas.
Na ausência de contraindicações, a TH é recomendada para alívio dos sintomas, bem como para a saúde óssea e possivelmente para benefícios cardiovasculares. Recomenda-se iniciar a TH imediatamente após o diagnóstico, prescrever doses mais altas de estrogênio (para mimetizar os níveis de estrogênio endógeno em mulheres mais jovens) do que as recomendadas em mulheres com menopausa natural, e continuar a TH até a idade da menopausa natural, momento em que a conveniência de estender a TH deve ser reavaliada.
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Principais pontos-chave:
- IOP deve ser considerada em mulheres com menos de 40 anos que apresentam menstruação irregular de início recente ou amenorreia e possivelmente sintomas vasomotores, depressivos ou ansiosos; avaliação imediata é indicada para evitar tempo prolongado para diagnóstico e tratamento.
- FSH elevado e níveis séricos baixos de estradiol medidos em duas ocasiões com intervalo de 1 mês são diagnósticos.
- A causa deve ser investigada; na maioria dos pacientes, a causa permanece não identificada.
- O manejo inclui aconselhar a paciente sobre o diagnóstico; outras preocupações a serem abordadas incluem fertilidade, necessidade de contracepção, recomendações para terapia de reposição hormonal (TH) e, dependendo da causa do distúrbio, vigilância de condições médicas associadas.
- O início imediato da TH é recomendado em doses mais altas do que as usadas em mulheres pós-menopáusicas, e deve ser continuado pelo menos até a idade média da menopausa natural.
- Pesquisas são necessárias para avaliar os efeitos da TH em doenças cardiovasculares, osteoporose e distúrbios neurodegenerativos em mulheres com insuficiência ovariana primária.
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