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Ginecologia e Obstetrícia20 maio 2025

Eficácia do contato pele a pele na redução do risco de hemorragia pós-parto 

Estudo buscou avaliar a eficácia do contato pele a pele na redução do risco de hemorragia pós-parto e perda de sangue após o parto.

O artigo, publicado recentemente na revista BMC Pregnancy and Childbirth, aborda a hemorragia pós-parto (HPP) como uma das principais causas de mortalidade materna no mundo. A principal causa da HPP é a atonia uterina, e sua ocorrência está relacionada tanto ao volume de sangue perdido quanto à condição de saúde materna, especialmente em mulheres com anemia prévia. O manejo ativo do terceiro período do trabalho de parto, com uso de ocitocina, é amplamente recomendado para prevenir HPP, podendo ser complementado com ácido tranexâmico em casos de alto risco. 

O estudo discute o contato pele a pele (do inglês skin-to-skin contact, SSC) imediato entre mãe e recém-nascido como uma estratégia fisiológica promissora, capaz de aumentar os níveis endógenos de ocitocina, favorecer a contração uterina e, possivelmente, reduzir o risco de HPP. Revisões anteriores mostraram que o SSC encurta a duração do terceiro período, melhora a integridade placentária e reduz a necessidade de uterotônicos. No entanto, ainda não havia evidência consolidada sobre o efeito direto do SSC em desfechos como a incidência de HPP, atonia uterina ou volume de perda sanguínea — lacuna que este estudo buscou preencher.  

Metodologia 

Este estudo é uma revisão sistemática com meta-análise, conduzida segundo as diretrizes PRISMA. Foram incluídos ensaios clínicos randomizados, quase-randomizados e estudos quase-experimentais com delineamento prospectivo, que compararam o contato pele a pele (skin-to-skin contact – SSC) com os cuidados de rotina em mulheres submetidas a partos vaginais ou cesarianas. O SSC foi definido como o posicionamento do recém-nascido nu sobre o abdome ou tórax da mãe imediatamente após o parto, antes da expulsão da placenta.  

A busca foi realizada até maio de 2024 nas bases PubMed, Scopus, CENTRAL, CINAHL, Web of Science, Google Scholar e registros de ensaios clínicos, sem restrições de idioma ou país. Foram considerados estudos realizados em países classificados como de alta ou baixa renda, segundo o Banco Mundial. Os principais desfechos avaliados incluíram presença de atonia uterina, ocorrência de hemorragia pós-parto (HPP) moderada ou grave, e volume médio de perda sanguínea após o parto. A análise estatística utilizou modelos de efeitos aleatórios (DerSimonian-Laird) com cálculo de risco relativo (RR) e diferença de médias (MD), com heterogeneidade avaliada pelo teste Q de Cochran e índice I².   

Eficácia do contato pele a pele na redução do risco de hemorragia pós-parto 

Imagem de StockSnap por Pixabay

Principais achados 

Foram avaliados 18 estudos envolvendo um total de 2.749 mulheres, conduzidos em países como Egito, Índia, China, Turquia, Arábia Saudita, Iraque, Israel e Estados Unidos, todos em ambiente hospitalar. As amostras variaram de 40 a 659 participantes por estudo, sendo a maioria parturientes com partos vaginais a termo. Seis estudos foram ensaios clínicos randomizados, dois quase-randomizados e dez quase-experimentais. A intervenção com contato pele a pele (SSC) foi iniciada imediatamente após o nascimento, com o recém-nascido nu colocado sobre o abdome ou tórax da mãe, por períodos que variaram de 20 a 120 minutos. Nos grupos controle, os recém-nascidos foram separados da mãe para cuidados rotineiros, como aquecimento em incubadoras ou entrega a familiares. 

Quanto aos desfechos analisados, seis estudos com 580 mulheres mostraram uma redução significativa no risco de atonia uterina no grupo SSC (RR: 0,11; IC95%: 0,05–0,25), com baixa heterogeneidade (I² = 3,38%). Em relação à perda sanguínea ≥ 500 mL, três estudos com 540 participantes também indicaram benefício do SSC (RR: 0,18; IC95%: 0,04–0,80), principalmente em partos vaginais. Em relação à perda média de sangue, nove estudos (1.396 mulheres) mostraram redução durante o terceiro período do parto (−55,5 mL; IC95%: −79,2 a −31,8), com maior efeito em partos vaginais (−66,9 mL). Duas análises adicionais mostraram reduções na perda média de sangue após 2 horas (−63,96 mL; 362 mulheres) e após 24 horas (−287,45 mL; 727 mulheres), com resultados consistentes tanto em países de baixa como de alta renda. Nos partos cesáreos, embora não tenha havido redução significativa na incidência de hemorragia grave (≥ 1.000 mL), houve diminuição no volume médio de sangue perdido em até 145 mL. A qualidade metodológica dos estudos variou, com menor risco de viés nos ensaios clínicos, embora os estudos não randomizados apresentassem maior risco de viés por fatores de confusão.  

Conclusões 

  • O contato pele a pele (SSC) é uma intervenção eficaz para reduzir atonia uterina, perda sanguínea ≥ 500 mL e o volume médio de sangramento pós-parto em mulheres submetidas a partos vaginais.  
  • O SSC estimula a liberação endógena de ocitocina por meio da ativação de fibras sensoriais cutâneas e da sucção mamilar, o que favorece a contração uterina e o esvaziamento placentário.  
  • Embora não tenha havido redução significativa na hemorragia pós-parto grave (≥ 1.000 mL) após cesarianas, o SSC reduziu a perda de sangue em 24 horas nesse grupo, especialmente quando aplicado por períodos mais longos. 
  • Os efeitos foram consistentes em países de baixa e alta renda, reforçando que se trata de uma prática acessível, segura e de baixo custo, com potencial para ser incorporada às diretrizes clínicas de manejo expectante do terceiro período do parto.  
  • São necessários mais ensaios clínicos randomizados, especialmente em partos cesáreos, além da padronização dos métodos de mensuração de sangramento e definição da duração ideal do SSC para maximizar seus efeitos preventivos.

Autoria

Foto de Ênio Luis Damaso

Ênio Luis Damaso

Doutor em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) ⦁ Professor no Curso de Medicina da Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo (FOB-USP) ⦁ Professor no Curso de Medicina da Universidade Nove de Julho de Bauru (UNINOVE).

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