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Gastroenterologia8 setembro 2023

Reação adversa aos salicilatos alimentares

Salicilatos (C6H4(OH)COO-R) são compostos orgânicos bioativos e ácidos fracos que atravessam as membranas celulares com facilidade.

Reações adversas aos alimentos são definidas como reação anormal após a ingestão alimentar. As reações adversas alimentares incluem alergia imunomediada e intolerância não imunomediada.  Porém, esses dois mecanismos patogenéticos são frequentemente confundidos.

De acordo com o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (NIAID) dos Estados Unidos, alergia alimentar é “um efeito adverso à saúde decorrente de uma resposta imune específica que ocorre de forma reprodutível na exposição a um determinado alimento” e intolerância alimentar como “reações não imunes que incluem mecanismos metabólicos, tóxicos, farmacológicos e indefinidos”. 

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Infelizmente, o termo “intolerância” tem sido frequentemente utilizado de forma abusiva para definir uma ampla gama de distúrbios relacionados com a ingestão de diferentes alimentos. Essa questão é tão preocupante que propuseram um teste de “sensibilidade alimentar” em que haveria a produção de imunoglobulinas  IgGe um teste de pesquisa de  IgGespecífico para vários alimentos que ajudaria no diagnóstico. Entretanto, não há qualquer estudo científico que comprove relação entre os níveis de IgG e as manifestações clínicas, e ainda nenhuma exclusão ou modificação dietética pode ser realizada em um teste positivo.

Dessa maneira, exames como o teste de IgG 221 alimentos devem ser proscritos. As reações adversas não imunológicas aos alimentos podem ser classificadas entre independentes do hospedeiro e dependentes do hospedeiro devido aos seus mecanismos fisiopatológicos. 

 

salicilatos alimentares
Figura 1. Reações adversas não imunológicas aos alimentos

Salicilatos 

Salicilatos (C6H4(OH)COO-R) são compostos orgânicos bioativos e ácidos fracos que atravessam as membranas celulares com facilidade.  O derivado mais popular do ácido salicílico é o ácido acetilsalicílico, frequentemente utilizado como analgésico, antipirético, anti-inflamatório e até como anticoagulante. Os salicilatos também podem ser encontrados em alimentos, porém em menor quantidade. A ingestão alimentar de salicilatos é geralmente de 10–200 mg por dia, por outro lado uma única  dose de aspirina pode conter 325–650 mg de salicilatos. Os salicilatos, incluindo o ácido acetilsalicílico, ocorrem naturalmente nos alimentos. 

A tabela a seguir apresenta uma lista de alimentos ricos desse bioativo:

Frutaspassas, ameixa, damasco, amora, mirtilo, cereja, cranberry, uva, abacaxi, ameixa, laranja, morango e goiaba. 

 

Legumes brócolis, pepino, quiabo, rabanete, abobrinha, agrião, broto de alfafa, berinjela, abóbora, batata doce, espinafre e alcachofra. 

 

Especiarias curry, pimenta caiena, gengibre, canela, cravo, mostarda, cominho, orégano, pimentão, açafrão, páprica, tomilho e alecrim. 

 

Outras fontes chá, rum, vinho, licores, vinagre, amêndoas, mel, goma de mascar, picles, azeitonas, corantes alimentares, aloe vera, alimentos industrializados que utilizam salicilatos como conservantes. 

 

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Intolerância alimentar aos salicilatos 

A intolerância ao salicilato é um problema subestimado em nosso meio, uma vez que pacientes e até profissionais de saúde desconhecem a relação entre a ingestão de alimentos ricos em salicilatos e sintomas clínicos. Diferentemente dos efeitos da exposição ao ácido acetilsalicílico em asmáticos, que são frequentemente aventadas pelos médicos, essa intolerância está relacionada à geração e metabolismo alterados de ácido araquidônico e eicosanoides, e à ingestão de prostaglandinas e leucotrienos, salicilatos ou inibidores de COX. 

Outra questão que deve ser considerada é o metabolismo do ácido acetilsalicílico, que é realizado pela UDP-glucuronosiltransferase 1A6, citocromo P4502C9 e N-acetil transferase 2. Normalmente, os salicilatos são metabolizados no fígado, entretanto se há alteração na função hepática, o risco de intolerância ao salicilato resta aumentado.

Diagnóstico  

O diagnóstico clínico nem sempre é fácil de ser realizado, pois os sintomas podem ocorrer em várias condições patológicas e muitas vezes a anamnese não inclui a pesquisa da ingestão de alimentos ricos em salicilatos. Os sintomas mais comuns envolvem o trato respiratório. No entanto, outros sistemas também podem ser afetados. Os sintomas podem ser do trato respiratório (asma, rinite, sinusite), dermatológicos (urticária), do sistema nervoso (enxaqueca, tonteira, depressão e ansiedade e insônia)  e do trato gastrintestinal (diarreia, flatulência, dor abdominal, colite). 

Diagnóstico laboratorial 

Embora a intolerância ao salicilato em medicamentos como a aspirina esteja bem estabelecida, faltam pesquisas que explorem a intolerância a alimentos ricos em salicilato.  

Atualmente, não existem exames laboratoriais para diagnosticá-la. No entanto, certos testes podem ser usados ​​para descartar alergias e outros tipos de intolerâncias. O teste padrão para intolerância ao salicilato a medicamentos é a exposição ou provocação, que envolve a administração de uma pequena quantidade de ácido salicílico e o monitoramento dos sintomas.

Tratamento 

Como não existe tratamento medicamentoso, a terapêutica baseia-se em uma dieta com baixo teor de salicilatos, o problema é que essa dieta pode ser muito restritiva. Cortar desnecessariamente alimentos ricos nesses compostos pode ser prejudicial à saúde. Não podemos esquecer que os salicilatos são anti-inflamatórios. Foi comprovado que alimentos ricos neles reduzem o risco de doenças inflamatórias, como o câncer colorretal. Como a intolerância geralmente está relacionada à dose, o ideal é restringir apenas os alimentos que contêm maiores quantidades, já citados anteriormente. 

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Considerações finais 

A cada dia aumenta o número de pacientes que procuram assistência médica por queixas relacionadas a reações adversas a alimentos: alergias e intolerâncias alimentares. Infelizmente o diagnóstico diferencial com a intolerância ao salicilato normalmente nem é aventado. É fundamental que pacientes, médicos e nutricionistas conheçam essa entidade patológica para que a intolerância a salicilatos não seja  subestimada.  Após o correto diagnóstico clínico, o tratamento será dieta com restição de alimentos ricos em salicilato e também do ácido acetilsalicílico. 

Também assina o texto: Adelia Carmen Silva de Jesus. Gastroenterologista pela Federação Brasileira de Gastroenterologia. Vice-presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia. Especialista em endoscopia pela Federação Brasileira de endoscopia.

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Referências bibliográficas

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