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Gastroenterologia12 abril 2022

Qual o papel da elastografia hepática na hepatite B?

Elastografia hepática transitória é um exame não invasivo que estima o grau de fibrose através da rigidez hepática.

A hepatite B crônica ainda é um grande problema de saúde pública, sendo responsável por mais de um milhão de mortes/ano a nível global. Dentre os infectados, 15 a 40% podem evoluir com cirrose hepática e carcinoma hepatocelular. Trata-se de entidade clínica que, muitas vezes, requer avaliação do grau de inflamação e fibrose hepática para definir indicação de terapia antiviral. O padrão ouro para essa avaliação é a biópsia hepática, que é um exame invasivo. A elastografia hepática transitória é um exame não invasivo que estima o grau de fibrose através da medida da rigidez hepática, tendo boa correlação com a biópsia. Dessa forma, permitindo o estadiamento da doença e auxiliando na definição da terapia.

No final de janeiro de 2022, foi publicado um artigo que avaliou a eficácia diagnóstica da elastografia hepática por FibroScan em predizer inflamação hepática, utilizando 1.185 biópsias hepáticas como controle.

Qual o papel da elastografia hepática na hepatite B?

Métodos

O estudo foi realizado na China, sendo submetido ao comitê de ética local. Foram selecionados 1.185 pacientes com hepatite B submetidos a elastografia por FibroScan e após um mês biópsia hepática como controle (padrão-ouro).

Os critérios de exclusão foram: cirrose hepática; CHC; níveis elevados de bilirrubina total; outras causas de hepatopatia crônica (causas metabólicas, doenças autoimunes do fígado, coinfecção com HIV, HCV e HDV, abuso de álcool ou drogas ilícitas); tratamento com análogos de nucleosídeos ou interferon dentro de 24 semanas; uso de drogas hepatotóxicas; transtornos mentais graves ou comorbidades descompensadas; IMC ≥ 28,0 kg/m²; gravidez ou lactação.

O FibroScan foi realizado com jejum adequado (pelo menos 2 horas após a ingestão de alimentos), por operadores treinados, com pelo menos 500 exames realizados. A medida da rigidez hepática utilizou a unidade de kilopascal (Kpa). A biópsia hepática foi guiada por ultrassom, sendo realizada dentro de 1 mês após a conclusão do teste FibroScan. A amostra de tecido hepático apresentava pelo menos  1,5 cm. O estágio da fibrose hepática foi determinado de acordo com o sistema METAVIR. O diagnóstico histopatológico foi concluído por 2 patologistas experientes. Quando os resultados eram inconsistentes, o chefe da patologia fornecia o parecer e o caso era levado à sessão disciplinar.

A análise estatística contou com avaliação de área sob a curva, comparando os resultados do FibroScan com a biópsia hepática.

Leia também: Mais um tratamento para hepatite B é incorporado ao SUS

Resultados

Dentre os 1.185 pacientes incluídos:

  • 75%: sexo masculino
  • 658 casos: HbeAg positivo – mediana de idade:31 anos;
  • 527 casos: HbeAg negativo – mediana de idade: 37 anos;
  • Taxa de sucesso do FibroScan foi maior que 90%, com rigidez hepática média de 11,96 kPa;
  • Biópsia hepática evidenciou esteatose hepática em 23% dos casos,  não havendo diferença significativa do grau de inflamação e fibrose nos subgrupos com ou sem esteatose;
  • Houve diferença significativa na avaliação de inflamação hepática pela biópsia hepática ao comparar os grupo com amostra com 11 ou mais espaços-porta ou até 10 espaços-porta;
  • Para diferentes graus de inflamação hepática, houve diferença significativa nos valores de ponto de corte da rigidez hepática média estimada por FibroScan.

Discussão

A atividade inflamatória é um fator diretamente relacionado ao desenvolvimento de fibrose em pacientes com hepatite B crônica. A biópsia hepática ainda é o padrão ouro no estadiamento de graus de inflamação e fibrose hepática nesses pacientes, contudo é um método invasivo, com maior risco de complicações. Dessa forma, a utilização de testes não invasivos, como a elastografia hepática auxilia no seguimento desses pacientes, permitindo planejamento terapêutico, sendo cada vez mais utilizados nas diretrizes de tratamento da hepatite B.

O valor da rigidez hepática média pelo FibroScan estima o grau de fibrose e, até certo ponto,  o grau de inflamação hepática. Estudos anteriores já demonstraram que inflamação necrosante altera a rigidez hepática, contudo requer validação.  No estudo em questão, houve uma amostra significativa de pacientes, mostrando que apesar de esteatose hepática concomitante, os graus de fibrose e inflamação não sofreram alterações significativamente estatísticas.

Como a biópsia hepática é o padrão ouro de diagnóstico, o desempenho dos demais métodos não invasivos é avaliado pelo cálculo da área sob a curva do gráfico comparando os dois métodos. Dessa maneira, é muito importante estabelecer um padrão de qualidade do exame histológico, sendo recomendado a presença de 11 ou mais espaços- porta, para evitar falsos negativos. Além disso, é importante que o tecido hepático não esteja fragmentado. No estudo citado, havia 82% de amostras histológicas adequadas.

E como estimar a confiabilidade da elastografia transitória?

  • Avaliação com pelo menos 10 medições;
  • Taxa de sucesso de medições ≥ 60%;
  • Razão de intervalo interquartil e mediana(IQR/M)  ≤ 0,30.

O estudo avaliado apresentou uma taxa de sucesso de mais de 90%, com IQR/M da rigidez hepática média adequado nos 1.185 pacientes com HBC: 70% (IQR/M ≤ 0,10), 23% (0,10 < IQR/M ≤ 0,15), 4% ( 0,15 < IQR/M ≤ 0,20) e 3% (0,20 < IQR/M ≤ 0,3), respectivamente.

O grau de inflamação foi diretamente relacionado ao estágio da fibrose. O valor da rigidez hepática média também pode refletir o grau de inflamação hepática.

Através de análise estatística, foram determinados pontos de corte através das medidas da área sob a curva  da rigidez hepática média para os diferentes grupos de inflamação: G2 – 9,6 kPa, G3- 9,7 kPa e G4 – 11,4 kPa.

Em relação à estimativa de inflamação hepática, os pontos de corte de rigidez hepática média para G2-8,6 kPa, G3- 9,8 kPa e G4- 11 kPa.

Um outro estudo relevante evidenciou que a atividade de inflamação do fígado acima de 2 (OR = 3,53) foi um fator de risco independente para diagnóstico incorreto do estágio de fibrose usando o FibroScan, pois esses pacientes apresentaram valores de rigidez hepática mais altos usando o FibroScan, aumentando erro diagnóstico. Por exemplo, um paciente com rigidez hepática média de 11 kPa, tem os valores máximos para inflamação e fibrose. Nesse momento, a biópsia hepática auxilia na diferenciação de ambos.

Saiba mais: Screening universal de anticorpos para hepatite B e vacinação na gravidez

Durante a terapia antiviral, há melhora importante principalmente do estágio de inflamação, que indica que o valor da rigidez hepática média do FibroScan reflete principalmente a recuperação da inflamação hepática em vez da fibrose hepática.

As principais limitações do estudo foram a necessidade de uma avaliação multicêntrica, visto que apesar do N relevante, o estudo incluiu apenas pacientes da China e a ausência de ajuste do impacto da fibrose hepática nas leituras da elastografia.

Mensagens finais

O tratamento da hepatite B requer, em muitos casos, uma avaliação do grau de inflamação e fibrose hepática. Devido a riscos inerentes a um procedimento invasivo, a biópsia hepática vem sendo reservada para casos onde há dúvida diagnóstica e na propedêutica do caso. Esse estudo, apesar de unicêntrico, incluiu um número grande de pacientes com hepatite B crônica, permitindo avaliar a importância da elastografia hepática no seguimento desses pacientes.

É relevante destacar a relação direta entre grau de inflamação e fibrose hepática, necessidade de amostras adequadas da biópsia hepática para avaliação/comparações adequadas e importância de uma avaliação cuidadosa do grau de fibrose em pacientes com inflamação avançada. Logo, a elastografia hepática é uma grande aliada na hepatite B crônica, principalmente naqueles pacientes onde há dúvida de indicação de tratamento com antiviral.

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Referências bibliográficas

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