Vitamina K2 reduz frequência e intensidade de câimbras noturnas em idosos
Praticamente todos os médicos que atuam no atendimento de pacientes idosos já se depararam com uma queixa frequente: cãibras noturnas. E pior, também se depararam com a dificuldade em controlar tais sintomas, visto que não temos opções seguras ou com perfil risco x benefício adequado (a cloroquina já foi utilizada no passado com esse intuito e, apesar de alguma eficácia, os riscos claramente superam os benefícios).
Antes de se estabelecer o diagnóstico de cãibras benignas, é fundamental descartar diferenciais como sintomas de neuropatias e suas respectivas causas, além de distúrbios hidroeletrolíticos que possam eventualmente estar associados à causa do problema. Contudo, é comum que os sintomas persistam mesmo após a exclusão de tais diagnósticos.
Um grupo de pesquisa na China havia avaliado previamente o impacto do uso da vitamina K2 nas cãibras em indivíduos com doença renal crônica (DRC) dialítica, com um impacto positivo em número de eventos e intensidade. O mesmo grupo resolveu, portanto, estudar os efeitos da vitamina na população idosa geral para entender se os benefícios se estenderiam também a eles. O estudo foi publicado no JAMA, recentemente.
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O estudo
O estudo foi um ensaio clínico randomizado, duplo-cego, placebo controlado, multicêntrico (mas apenas em centros chineses) realizado entre setembro de 2022 e dezembro de 2023.
Foram incluídos pacientes idosos (> 65 anos) com 2 ou mais episódios de cãibras noturnas (CNs) durante 2 semanas de screening. Os pacientes foram randomizados 1:1 entre placebo ou vitamina K2 (melaquinona 7) 180 mcg/dia, por 8 semanas. Foram excluídos participantes que tivessem causas metabólicas específicas para as cãibras e neuropatias específicas, como por exemplo, por hipotireoidismo, hemodiálise, etilismo, esclerose lateral amiotrófica (ELA), poliomielite, estenose espinal, parkinson e doenças do neurônio motor, além de uso de diuréticos; também foram excluídos participantes que tivessem feito uso de vitamina K ou antagonistas de vitamina K nos últimos 2 meses.
O desfecho primário analisado foi o número médio de episódios de CNs apresentados por semana. Dentre os desfechos secundários, foram incluídos a duração das cãibras (em minutos) e gravidade, analisada por escala analógica entre 1 e 10 (10 sendo mais intensa).
Ao final, foram randomizados 199 participantes. A população analisada apresentou uma média de idade de 72 anos, sendo 54% mulheres. Cerca de 50% dos indivíduos tinham diabetes e 68% eram hipertensos. A frequência basal de cãibras por semana, analisada nas duas primeiras semanas de screening, era semelhante entre os grupos (média de 2,6 episódios/semana no grupo vitamina K e 2,71 no grupo placebo).
A vitamina K2 parece reduzir a frequência e intensidade das cãibras noturnas
Após as 8 semanas de intervenção, o grupo vitamina K2 teve uma redução na frequência de cãibras noturnas por semana (desfecho primário):
- Grupo vitamina K: 0,96 (-1,64 eventos/semana)
- Grupo placebo: 3,63 (+0,92 eventos/semana); diferença média -2,67; IC 95%; -2,86 a -2,49; p < 0,001.
Além disso, houve também uma redução na duração e na intensidade das cãibras:
Duração
- Grupo vitamina K: – 0,9 minutos
- Grupo placebo: -0,32 minutos (diferença entre grupos: -0,73 min)
Intensidade:
- Grupo vitamina K: -2,55
- Grupo placebo: -1,24 (diferença entre grupos: -0,97)
Os desfechos secundários foram analisados apenas de forma exploratória.
Não houve efeitos adversos significativos no uso da vitamina K2
Um dado positivo, além da eficácia, é de que não foram observados eventos adversos significativos. No entanto, os autores destacaram a importância de se lembrar de não utilizar a vitamina K em pacientes que estejam em uso de warfarina.
Perspectivas
O estudo é interessante por trazer dados sobre um tema pouco tratado na literatura mas que é razoavelmente frequente na população idosa, sobretudo ao avaliar uma substância segura, barata e de fácil acesso. É preciso considerar que apesar de multicêntrico, é um estudo realizado apenas com a população chinesa e, com um N pequeno e, portanto, deve-se ter cuidado ao se generalizar as informações. Além disso, o efeito foi pequeno em um sintoma que já era leve/moderado em intensidade desde o início e não foram avaliadas variáveis como qualidade do sono ou qualidade de vida, colocando-se em dúvida também o valor clínico dessa redução. Contudo, definitivamente há motivos para se replicar o estudo para tentar avaliar os achados em populações diferentes, pois pode ser que finalmente tenhamos algo a oferecer aos nossos pacientes além da boa e velha hidratação, alongamento e “atentar ao potássio”.
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