Os níveis maternos de componentes lipídicos são essenciais para a saúde materna e para o desenvolvimento fetal. No entanto, valores de referência da população geral podem ser inadequados para o diagnóstico de dislipidemia e avaliação dos riscos associados nas gestantes.
Baseado na relevância do tema, recentemente foi publicado um artigo que visou avaliar os valores de referência do perfil lipídico em gestantes por trimestre gestacional. Vamos ver o que ele nos trouxe de informações relevantes.
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Panorama prévio
Mudanças fisiológicas ocorrem durante a gestação, incluindo o metabolismo lipídico, que pode cursar com valores superiores ao da normalidade a depender do trimestre gestacional.
No início da gestação, ocorre elevação dos triglicerídeos devido a lipogênese e hiperfagia materna. Mudanças similares são observadas nos níveis de colesterol total (CT), lipoproteína de alta densidade (HDL) e lipoproteína de baixa densidade (LDL). Já no terceiro trimestre da gestação, os depósitos de gordura vão se deteriorando com a lipólise o que faz com que os níveis de colesterol atinjam seu pico e logo em seguida, caem após o parto.
É conhecido que níveis muito elevados de colesterol durante a gestação estão associados a piores desfechos materno-fetais tais como: hipertensão e diabetes gestacionais, pré-eclâmpsia, prematuridade, macrossomia e nascimentos de bebês pequenos para idade gestacional (PIG).
Sendo assim, é interessante saber quais são os valores de referências adequados para cada trimestre da gestação, com intuito de melhor acurácia diagnóstica e consequente terapêutica.
Foi com esse objetivo que o presente estudo se desenvolveu.
Metodologia
Em base de dados eletrônicas, foram coletados estudos até o período de junho de 2025. A presente revisão sistemática contou com estudos observacionais que avaliaram em, pelo menos, dois trimestres gestacionais os valores de colesterol total, HDL, LDL e triglicerídeos e análise de possíveis valores de referência.
Apenas estudos com nascimentos de feto único e com pré-natal adequado foram selecionados. Foram excluídos estudos com gestações gemelares, com complicações obstétricas (exemplo: aborto, crescimento intrauterino restrito, parto prematuro, pré-eclâmpsia e diabetes gestacional) e desfechos gestacionais adversos tais como: hidropsia fetal, mal formações congênitas ou doenças prévias à gestação tais como: hipertensão, diabetes e transtornos da tireoide.
Resultados
Um total de 13 estudos derivados de 12 artigos, envolvendo 54.517 participantes, foi incluído na presente revisão.
De acordo com a análise deles, a média dos níveis dos componentes lipídicos ao longo dos 3 trimestres gestacionais foi: 4,41, 5,83 e 6,69 mmol/L para colesterol total, 1,15;2,14 e 2,91 mmol/L para triglicerídeos; 1,60, 1,74 e 1,70 mmol/L para HDL e 2,36, 3,27 e 3,82 para LDL.
Níveis de triglicerídeos e colesterol total maiores ao longo do segundo e terceiro trimestre foram observados em diferentes regiões geográficas, mas não no primeiro trimestre. Devido à diferença dos métodos utilizados, só houve diferença significativa entre os níveis de Triglicerídeos e CT no primeiro e terceiro trimestre, mas não nos níveis de CT e HDL ao longo de toda a gestação.
Tanto gestantes da América do Sul quanto da Europa tiveram níveis de CT maiores no primeiro trimestre gestacional quando comparadas às asiáticas. No entanto, os níveis de Tg no segundo trimestre e LDL e Tg no terceiro trimestre foram menores quando comparados com os das asiáticas também.
Mulheres com idade superior a 25 anos apresentaram menores níveis de CT e HDL no segundo trimestre e LDL no terceiro trimestre quando comparadas à gestantes com idade < 25 anos.
Discussão
A presente revisão visou mostrar a variação do perfil lipídico em mulheres com gestações únicas e como tal condição pode estar associada a desfechos materno-fetais adversos.
No entanto, como qualquer estudo esse também contou com algumas limitações. A primeira delas foi a heterogeneidade da amostra populacional, o que pôde comprometer a veracidade dos achados. Além disso, apenas 5 fatores que podem interferir no perfil lipídico foram avaliados tais como: idade, área geográfica, instrumento de detecção do estudo, imuno ensaios diferentes e o tempo de duração de cada estudo.
Outro ponto importante foi a análise de apenas gestações de fetos únicos e, por fim, as principais áreas estudadas foram na Ásia, Europa e América do Sul, limitando os achados a essas regiões.
Conclusão e mensagem prática
A presente revisão conseguiu definir valores de referência para perfil lipídico em mulheres com gestações únicas, o que pode auxiliar no diagnóstico mais preciso de dislipidemia materna e redução dos riscos associados à tal condição.
Tal revisão também indicou que tais níveis variam em relação à região geográfica estudada e os métodos de dosagem utilizados.
De um modo geral, mais estudos com maior amostragem populacional são necessários para avaliar os possíveis valores de corte para perfil lipídico em cada trimestre gestacional, a fim de que o diagnóstico e a abordagem terapêutica sejam mais precisos.
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