O ano de 2024 na dermatologia foi marcado, principalmente, por atualizações em algumas dermatoses, com novidades no manejo de doenças que cursam com grande impacto na qualidade de vida dos pacientes, como dermatite atópica e alopecia areata. Além disso, a edição de 2024 do congresso da European Academy of Dermatology & Venereology (EADV 2024), que aconteceu entre os dias 25 a 28 de setembro, abordou temas relevantes do dia a dia do dermatologista, como a nova classificação da rosácea e comorbidades associadas à hidradenite supurativa. Outro assunto em destaque nos congressos de dermatologia e na mídia foi o uso da inteligência artificial e seus impactos dentro da especialidade.
Dermatite atópica
A fisiopatologia da dermatite atópica (DA) e sua desregulação imune são temas relevantes que têm sido abordados na literatura médica recente. Atualmente, a citocina sugerida como mais envolvida é a IL-13.
O lebriquizumabe, anticorpo monoclonal IgG4 terapêutico com ligação seletiva a receptores de IL-13, mostrou-se seguro e eficaz. Estudos recentes evidenciaram boa resposta terapêutica além de redução do prurido.
Outra novidade nesse ano, foi inclusão do Dupilumabe no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), com a ampliação do uso para tratamento de DA grave em crianças a partir dos 6 meses de vida. O dupilumabe é um anticorpo monoclonal totalmente humanizado capaz de bloquear o receptor de interleucina (IL) 4 e, com isso, bloquear a ação de duas interleucinas IL-4 e IL-13. Ele promove a regulação da barreira cutânea na DA, melhorando o microbioma e reduzindo a colonização por Staphylococcus aureus.
O avanço do entendimento dessa dinâmica fisiopatologia da dermatite atópica tem proporcionado o surgimento de novos tratamentos direcionados para a modulação de respostas imunes. Tais tratamentos são fundamentais para o melhor controle da dermatite atópica que não responde a tratamentos tópicos, com consequente melhora da qualidade de vida dos pacientes e seus impactos físicos, sociais, financeiros e econômicos.
Alopecia areata
A alopecia areata é uma doença autoimune com grande impacto na qualidade de vida e autoestima dos pacientes afetados. Sua gravidade é avaliada pelo score SALT, que considera o percentual de perda de cabelo, por exemplo, SALT 100 se houver perda total do cabelo e SALT 0 se não houver perda nenhuma.
O tratamento é guiado pela gravidade da doença, sendo indicada terapia sistêmica quando SALT ≥ 50, embora muitos especialistas considerem o tratamento sistêmico com SALT ≥ 20, devido ao prognóstico da doença.
As atualizações nesse âmbito se devem à aprovação pelo FDA de dois inibidores da JAK: Ritlecitinibe (50 mg/dia para adultos e ≥ 12 anos) e Baricitinibe (4 mg/dia para adultos e 2 mg/dia se > 65 anos ou com risco cardiovascular). Eles mostraram 50-64% de resposta significativa na alopecia areata, sendo mais eficazes na doença mais recente. Os estudos abordados no EADV demonstraram que, dentre os pacientes que respondem ao tratamento, 90-93% não recaem se o tratamento for continuado, o que mostra a importância de manter a terapia.
Essas atualizações demonstram um cenário promissor no tratamento da doença, entretanto, no Brasil, ainda precisamos considerar a disponibilidade e custo do tratamento e aguardar as atualizações do consenso brasileiro de alopecia areata para melhor adequação ao nosso contexto.
Nova classificação de rosácea
Outro assunto em destaque nesse ano na dermatologia foi a nova classificação da rosácea, discutida no EADV 2024. A nova classificação foi desenvolvida devido à deficiência de sistemas prévios com o intuito de aprimorar o manejo da doença. Os autores recomendam critérios diagnósticos e a classificação em fenótipos para definir a abordagem terapêutica, otimizar o tratamento e acompanhar a evolução.
O diagnóstico é feito a partir de pelo menos um critério diagnóstico (eritema centro-facial persistente ou fima) ou dois critérios maiores (eritema facial transitório, pápulas e pústulas inflamatórias, telangiectasias e alterações oculares). Os critérios menores (sensação de queimação, sensação de pinicação, edema, ressecamento) também podem estar presentes, mas não são critérios diagnósticos.
Além disso, a abordagem da doença em pacientes de fototipo mais alto também é extremamente relevante, pois neles o diagnóstico pode ficar comprometido pela dificuldade na visualização do eritema. Os autores recomendam priorizar a história de flushing, sensação de queimação ou pinicação e a presença de fatores desencadeantes típicos. E ainda, no exame, focar nas características clínicas centro-faciais e na dermatoscopia, onde podemos ver as telangiectasias.
Comorbidades associadas à hidradenite supurativa
A abordagem do paciente de forma integral também deve estar presente na dermatologia, como demonstram os ecos do EADV 2024, que sugerem quatro comorbidades que devem ser consideradas no contexto da hidradenite supurativa.
Na síndrome metabólica, o screenning deve englobar: tabagismo, atividade física, dieta, índice de massa corporal (IMC), pressão, lipidograma, glicemia, circunferência abdominal e história médica.
Em relação à saúde mental, a depressão é comorbidade frequentemente observada. Sugere-se investigar na primeira consulta e anualmente, através de questionários como o PHQ-2, que avalia o interesse ou prazer em fazer as atividades e humor deprimido. Se identificado risco para depressão, deve-se encaminhar para acompanhamento apropriado com psiquiatra e psicólogo.
Outra comorbidade que pode estar relacionada é a doença inflamatória intestinal. Recomenda-se investigar sintomas como dor abdominal, diarreia, sangramento nas fezes e história familiar dos pacientes. Se presentes, encaminhar para o gastroenterologista.
A espondiloartrite também é relatada como fator a ser investigado. Deve-se avaliar a presença de artrite, dactilite ou entesite periférica ou se há critério para dorsalgia inflamatória. Caso positivo, deve-se considerar avaliação com reumatologista.
Em suma, não há estudo demonstrando o benefício dessa investigação, mas é sugerido realizar já que há associações epidemiológicas bem descritas com comorbidades importantes, além de guiar o tratamento de acordo com os fatores de risco de cada paciente.
Uso da inteligência artificial na dermatologia
Outro assunto com destaque recente nos congressos e na mídia é a crescente aplicação da inteligência artificial (IA) na dermatologia. Seus benefícios podem melhorar a precisão diagnóstica, a eficiência do atendimento e a satisfação dos pacientes.
Modelos de IA têm sido treinados para identificar e classificar condições dermatológicas, principalmente no que se refere ao câncer de pele, a partir de imagens clínicas e dermatoscópicas, melhorando a acurácia no diagnóstico e auxiliando as decisões clínicas.
Para os pacientes, aplicativos móveis têm sido desenvolvidos com a finalidade de monitorizar lesões cutâneas e direcionar ao atendimento médico.
Outras aplicabilidades são o uso da IA na teledermatologia, seleção de participantes em estudos científicos e uso na formação médica com treinamento de residentes.
Espera-se que nos próximos anos essa ferramenta seja integrada de forma mais ampla na saúde, tanto como uma ferramenta para os pacientes, quanto como um auxílio à decisão clínica, melhorando a tomada de decisões dos dermatologistas.
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