A pandemia de covid-19, declarada em 2020, impactou os sistemas de saúde ao redirecionar recursos e adiar atendimentos não urgentes, incluindo o rastreamento de neoplasias. As restrições sociais e o isolamento reduziram a realização de exames, o que resultou no atraso no diagnóstico de diversas neoplasias, como o melanoma, cujo prognóstico depende do diagnóstico precoce.
O melanoma é mais incomum, em comparação com os outros tipos de câncer de pele não melanoma, mas pode ser letal e mais agressivo. Durante a pandemia, houve redução no número de diagnósticos em vários países, o que resultou em detecção em estágios mais avançados e pior sobrevida. O estudo em questão buscou avaliar e mensurar como a pandemia afetou o diagnóstico da doença, comparando dados pé e pós-covid, incluindo volume de casos, espessura de breslow, estágio clínico e características histopatológicas.
Impacto no diagnóstico de melanoma
Foi realizada uma revisão sistemática e metanálise seguindo as diretrizes PRISMA. PubMed, Scopus, Web of Science e Embase foram pesquisados até 10 de setembro de 2024 para estudos observacionais comparando os resultados do melanoma na era pré- covid-19 (antes de março de 2020) com a era covid-19 (março de 2020 em diante). Dois revisores extraíram dados clínicos e histopatológicos, avaliaram a qualidade dos estudos e realizaram metanálises com modelos de efeitos fixos e aleatórios, incluindo análises de heterogeneidade e sensibilidade.
Sessenta e dois estudos (38.676 melanomas pré-covid e 46.846 melanomas da era covid-19) preencheram os critérios de inclusão e revelaram que houve queda de 19% nos novos diagnósticos de melanoma, com forte heterogeneidade geográfica – quedas acentuadas em países como Bélgica, Chile, Espanha e Itália, enquanto Irlanda, Grécia e Holanda apresentaram aumento. Os melanomas foram diagnosticados em pacientes mais velhos e maior espessura de Breslow (aproximadamente 0,3mm a mais) e maior chance de ulceração, sugerindo doença mais avançada. Entre os subtipos histológicos, apenas o melanoma nodular mostrou aumento significativo.
Desse modo, a pandemia de covid-19 reduziu em 19% os diagnósticos de melanoma e levou a uma maior proporção de tumores mais avançados, mais espessos e ulcerados, com predominância de subtipos agressivos. Esse atraso no diagnóstico esteve relacionado aos bloqueios e suspensão de consultas. Observou-se variações entre os países, dependendo da gravidade da pandemia e da disponibilidade de alternativas como teledermatologia. Com os diagnósticos mais tardios, a sobrevida foi afetada com aumento também dos custos de tratamento.
O estudo em questão permite algumas reflexões e aplicações práticas:
- A relevância de priorizar a detecção precoce do melanoma, mesmo em crises de saúde;
- A necessidade de expandir e validar o uso da teledermatologia: a estratégia que tem limitações no âmbito de identificar lesões sutis, mas permite uma triagem eficaz;
- Reforçar a implementação de estratégias híbridas (teledermatologia associada a consultas presenciais) para pacientes de alto risco;
- Reforçar campanhas de conscientização sobre autoexame da pele;
- Apoiar políticas públicas de saúde que mantenham serviços de dermatologia ativos mesmo em emergências;
- Incentivar pesquisas longitudinais que avaliem o impacto dos atrasos no prognóstico dos pacientes.
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