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Clínica Médica16 dezembro 2024

Vitamina E: Qual o impacto na MASLD?

Por Leandro Lima

A doença hepática esteatótica associada à disfunção metabólica (MASLD) tornou-se a principal causa de hepatopatia crônica no mundo, acometendo 3 a cada 10 indivíduos.  

A elevada prevalência da MASLD deve ser entendida sob o âmbito de suas consequências, sejam elas diretamente relacionadas ao fígado ou sistêmicas: 

  • Hepáticas: risco de evolução para doença hepática crônica avançada (DHCA) e carcinoma hepatocelular (CHC); 
  • Extra-hepáticas: incremento do risco de eventos cardiovasculares maiores no cenário da síndrome metabólica.  

A abordagem preconizada é pautada nas mudanças do estilo de vida, com adoção de dieta hipocalórica e prática de atividade física, objetivando emagrecimento de pelo menos 5 a 10% do peso corporal basal.  

A farmacoterapia, ainda distante do ideal, encontra-se em evolução, sendo reservada para os cenários de falha no tratamento não farmacológico em combinação com fibrose hepática avançada (escore de Metavir ≥2). 

Saiba mais: ACP 2024: Dicas sobre MASLD para o clínico

De uma forma prática, a presença de diabetes mellitus funciona como um divisor de águas no algoritmo da terapia medicamentosa, conforme expresso na tabela que se segue: 

Farmacoterapia na MASLD 

Diabéticos 

Resmetirom: 

  • 80 mg/dia (< 100 kg); 
  • 100 mg/dia (≥ 100 kg). 

Pioglitazona: 30 a 45 mg/dia; 

Liraglutida: 0,6 a 3 mg/dia; 

Semaglutida: 0,1 a 0,4 mg/dia.  

Não diabéticos 

Vitamina E: 800 UI/dia. 

 Hoje o nosso foco será sobre o uso da vitamina E na MASLD. 

O racional do emprego da vitamina E na MASLD reside em seu potencial efeito citoprotetor, que poderia atenuar o estresse oxidativo sobre o hepatócito.  

Na evolução fisiopatológica da MASLD, é reconhecido o papel dos radicais livres, resultantes do processo de peroxidação lipídica, que desencadeiam a ativação de citocinas inflamatórias.  

A despeito da plausibilidade biológica, o emprego de drogas antioxidantes, como a vitamina E, silimarina, betaína e N-acetilcisteína, ainda é conflitante.  

O maior estudo sobre o tema, conduzido por Sanyal, avaliou cerca de 250 pacientes divididos entre os grupos: pioglitazona, vitamina E e placebo. Demonstrou-se melhora histológica da esteato-hepatite (MASH) exclusivamente com o emprego da vitamina E entre os pacientes não diabéticos, mas sem modificar o grau de fibrose hepática.  

Dessa forma, os principais pontos de dúvidas sobre o emprego da vitamina E na MASLD incluem a sua eficácia e segurança.  

vitamina e

A vitamina E é eficaz? 

Os estudos sobre o emprego de vitamina E na MASLD convergem para uma potencial melhora bioquímica hepática, expressa por queda modesta de AST e ALT, mas sem a comprovação de impacto sobre desfechos clinicamente relevantes, como mortalidade geral e mortalidade e morbidade especificamente atreladas ao fígado.  

A implicação prática é a de que a melhora bioquímica não necessariamente se associa à proteção contra desfechos relevantes, que tendem a ocorrer somente após transcorridos entre 10 a 30 anos.  

A vitamina E é segura? 

O estudo SELECT avaliou o impacto da combinação de selênio e vitamina E na profilaxia do câncer de próstata.  

Ao contrário do esperado, foi demonstrado um aumento significativo da incidência do câncer de próstata no grupo de suplementação da vitamina E.  

Além disso, estudos observacionais apontam para um possível incremento da mortalidade geral e do risco de sangramento com doses diárias acima de 400 UI. 

O que nos diz uma revisão sistemática e meta-análise da Cochrane de 2024? 

Tendo-se essas considerações pautadas, Wen e colaboradores publicaram uma meta-análise e revisão sistemática sobre o tema na Cochrane Library em outubro de 2024.  

Os principais objetivos do estudo foram a avaliação dos benefícios e riscos da suplementação de vitamina E, combinada ou não a suplementos vitamínicos ou minerais, em comparação ao placebo, entre os indivíduos com MASLD.  

Os critérios de inclusão foram MASLD documentada por técnicas radiológicas ou histológicas, sem limitação de faixas etárias.  

Foram excluídas as causas secundárias de esteatose, como doença de Wilson, hemocromatose, hepatite autoimune, infecções crônicas por HBV e HCV, esteatose fármaco-induzida ou tóxica, entre as quais o uso de etanol >20 e 30g/dia para mulheres e homens, respectivamente.  

A pesquisa da literatura foi realizada até fevereiro de 2024, tendo sido incluídos 16 estudos controlados randomizados (RCTs), perfazendo pouco mais de 1.000 pacientes provenientes da Suíça, EUA, Itália, Índia, Malásia, Irã e Paquistão.  

Os grupos de comparação foram o placebo em 13 estudos e nenhuma intervenção em 3 estudos.  

A dose de vitamina E variou entre 300 e 1.000 UI/dia, com tempo de seguimento entre 2 e 24 meses. As intervenções não farmacológicas concomitantes foram autorizadas na maioria dos estudos. 

Os desfechos críticos foram a mortalidade por todas as causas, mortalidade relacionada ao fígado e eventos adversos graves, como morte, internação, incapacidade ou teratogenicidade.  

Os desfechos importantes foram morbidade relacionada ao fígado, como sangramento, ascite, encefalopatia hepática, síndrome hepatorrenal e icterícia, além da resposta bioquímica e avaliação do grau de esteatose ao método de imagem, entre outros.  

O impacto da vitamina E sobre a mortalidade geral e eventos adversos graves foi considerado muito incerto, com risco relativo de 3,45 (IC 95%: 0,57 a 20,86) e 1,91 (IC 95%: 0,3 a 12,01), respectivamente, sendo esses desfechos críticos avaliados na minoria dos estudos.  

É provável que a vitamina E promova pequenas reduções dos valores da ALT e AST, com diferença mediana de -9,29 (IC 95%: -13,69 a -4,89) e -4,9 (IC 95%: -7,24 a -2,57), respectivamente.  

Já em relação à mortalidade e morbidade especificamente atreladas à doença hepática, não foram apresentados quaisquer dados.  

Os eventos adversos não graves relacionados à vitamina E, em relação ao placebo, apresentaram risco relativo de 0,86 (IC 95%: 0,64 a 1,17), com dados provenientes de apenas 2 estudos.  

Conclusão e Mensagens práticas 

  • A eficácia e da vitamina E para o tratamento da MASLD, no que se trata de desfechos brutos, como mortalidade geral e eventos adversos graves, é considerada incerta.  
  • A relevância clínica da resposta bioquímica é questionável e esteve atrelada a potencial de viés e significativa heterogeneidade.  
  • As principais limitações da meta-análise foram a evidência limitada, o tempo de seguimento curto em vários estudos e a dificuldade inerente à ausência de eventos substitutos validados para uma condição que evoluiu com perda de função hepática após décadas. Dessa forma, são recomendados estudos com tempo de seguimento mais prolongado sobre o tema.  
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