Revisão de Torsade de Pointes
A torsade de pointes (TdP) é uma taquicardia ventricular polimórfica caracterizada pelo achado típico de inversão das pontas do complexo QRS e atrelada à síndrome do intervalo QT longo.
Legenda da imagem: ECG da esquerda demonstra intervalo QT alargado (720 ms) e extrassístole ventricular (ESV) condicionando o fenômeno R sobre T. Na sequência, documentada a degeneração em torsade de pointes (imagens da direita, correspondentes à cardioscopia e eletrocardiograma, respectivamente).
Por que considerar o uso do sulfato de magnésio?
A importância do seu pronto reconhecimento e diferenciação das demais taquicardias ventriculares, reside na ampla responsividade ao magnésio.
Nos demais aspectos, entretanto, é manejada de acordo com o protocolo do suporte avançado de vida (ACLS), devendo-se manter a atenção para os critérios de terapia elétrica, seja a cardioversão ou desfibrilação, na presença de instabilidade hemodinâmica ou parada cardiorrespiratória (PCR).
Os efeitos benéficos do magnésio são independentes do nível sérico do eletrólito e estão previstos mesmo nos casos em que o intervalo QT não normaliza.
Administração correta
A dose inicial habitual é de 1 a 2g de magnésio:
- Sulfato de magnésio 50% (500 mg/mL): 2 a 4 mL diluídos em 50 a 100 mL de soro glicosado a 5% (SGI 5%);
- Sulfato de magnésio 10% (100 mg/mL): 10 a 20 mL diluídos em 50 a 100 mL de SGI 5%.
O tempo de infusão é variável conforme a apresentação clínica:
- Em 1 a 2 minutos na parada cardiorrespiratória (PCR);
- Em 5 a 10 minutos na presença de TdP com pulso palpável: a infusão muito rápida pode deflagrar assistolia e PCR.
A dose pode ser repetida na presença de recorrência, geralmente limitando-se a não mais do que 4 a 6g na primeira hora. Alguns médicos optam por infusões contínuas, mas não podem ser interpretadas como um tratamento padrão.
Pacientes de risco
O limiar para a toxicidade do magnésio é alto, devendo-se ter, contudo, uma atenção especial aos nefropatas e pacientes anúricos, quando a regra é administrar o fármaco nos limites inferiores sugeridos (por exemplo, 1g).
Os casos refratários ao magnésio devem ser conduzidos preferencialmente em conjunto com cardiologistas ou arritmologistas, podendo-se empregar os seguintes recursos, que fogem do esboço dessa breve revisão:
- Overdrive por meio da implantação de marcapasso transvenoso com ajuste de frequência para 100 batimentos por minuto;
- Antiarrítmicos da classe IB: lidocaína ou fenitoína;
- Administração de potássio;
- Alcalinização plasmática.
Veja também: Caso Clínico: Torsades de pointes [vídeo]
Evidências relevantes que embasaram seu uso
O histórico que embasa a utilização do magnésio na TdP foi relembrado por Dan Tzivoni, um cardiologista israelense, em uma publicação de 2024.
Nas décadas de 1970 e 1980 a TdP era comum devido ao uso de antiarrítmicos prolongadores do QT, e a terapia mais utilizada era a estimulação cardíaca com isoproterenol intravenoso.
Alguns relatos que apontavam para a capacidade do magnésio de reduzir a frequência de arritmias ventriculares malignas na sequência de infarto agudo do miocárdio (IAM) serviram de substrato para a sua utilização, de forma empírica, em casos individuais:
- O primeiro caso foi descrito em 1984: um homem de 60 anos que havia desenvolvido TdP na vigência do uso de quinidina e amiodarona para fibrilação atrial paroxística, suprimida pelo isoproterenol, mas que foi suspenso por palpitações frequentes.
- O segundo caso: paciente hospitalizado por IAM e que desenvolveu TdP após a utilização de procainamida para extrassistolia ventricular frequente;
- O terceiro caso: indivíduo que após tentativa de autoextermínio com a ingestão de tricíclicos desenvolveu TdP refratária ao isoproterenol e marcapasso transvenoso.
O sucesso absoluto do magnésio nos três casos acima motivou, mais tarde, a publicação de uma série de 12 casos no periódico Circulation em 1988.
Desde então, apesar da ausência de estudos controlados randomizados, a eficácia foi corroborada por experiência extensa da comunidade internacional, motivo pelo qual a conduta ganhou a recomendação IC da AHA/2017 e ESC/2022.
Conclusão e Mensagens práticas
- A torsade de pointes (TdP) é um tipo particular de taquicardia ventricular polimórfica, especialmente no que toca à responsividade ao magnésio. Em se tratando de uma emergência médica, é importante que o profissional de saúde esteja atento à posologia e às formas de administração
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