Como melhorar o atendimento à parada cardiorrespiratória?
O atendimento a uma parada cardiorrespiratória (PCR) é comum nos setores de emergência e terapia intensiva, mas também não é tão incomum nas enfermarias.
O atendimento a uma parada cardiorrespiratória (PCR) é comum nos setores de emergência e terapia intensiva, mas também não é tão incomum nas enfermarias. Por isso, todo profissional deve estar atualizado e preparado para atender essa situação de emergência médica de acordo com as diretrizes para suporte avançado de vida (ACLS).
Precisamos lembrar que a PCR é o evento final da vida de toda pessoa e devemos saber distinguir as pessoas que uma PCR farão simplesmente parte do seu final de vida, daquelas que inesperadamente têm uma PCR e exigirão nossos esforços – apesar dessa tarefa não ser sempre fácil, ela é muito importante. Outra coisa importante é lembrar que os objetivos do atendimento da RCP são o retorno à circulação espontânea (ROSC), a obtenção de bons parâmetros neurológicos após a ROSC e, por fim, a alta hospitalar. Apesar dos nossos esforços, dentre os pacientes com PCR extra-hospitalar a ROSC é obtida em cerca de 25% dos casos (isso sobe para até 50% dos casos intra-hospitalares) e conseguimos dar alta para cerca de 10% dos pacientes.
O Annals of Emergency Medicine publicou um artigo revisando e discutindo as medidas mais importantes para executarmos um bom atendimento e melhorar os resultados obtidos. Os autores revisaram as recomendações mais recentes e discutem os motivos pelos quais os tratamentos foram indicados ou abandonados pela última diretriz da American Heart Association (AHA).
Nos próximos parágrafos você poderá encontrar as principais mensagens para melhorar ainda mais a realização do ACLS por você e sua equipe.
Massagem cardíaca ou compressões torácicas
- É responsável por manter a perfusão tecidual cerebral e dos demais órgãos. Por isso, devemos evitar suas interrupções e outras coisas que a atrapalhem. Há consenso que o início rápido de uma massagem de boa qualidade melhora o ROSC e os desfechos neurológicos.
- Ventilações aumentam a pressão intratorácica, reduzindo o retorno venoso e prejudicando, então, a eficácia da massagem. Por isso, hiperventilar pacientes é um erro.
- A utilização de dispositivos automatizados (como o AutoPulse) não se mostrou superior a uma massagem bem realizada, mas pode ser útil quando dispomos de uma equipe reduzida para realizar as diversas tarefas do atendimento ou quando o tempo de RCP é alto e a equipe já está fadigada.
- Estudos observacionais mostram que a técnica compression-only pode ser benéfica quando executada por até três ciclos de 30 compressões. Como ela não envolve utilizar o famigerado boca-a-boca num completo estranho na rua, ela pode ser uma alternativa útil a se ensinar à população leiga.
Checagem de ritmo
- Com a presença de um médico e do desfibrilador, a cada 2 minutos, interrompemos as compressões torácicas e checamos o ritmo na tela. Apenas se o ritmo for compatível com pulso, checaremos um pulso central – isso evita um tempo desnecessário procurando pulso.
Desfibrilação
- É a intervenção com maior evidência de sucesso para terminar arritmias ventriculares na PCR. Por isso, no contexto hospitalar, assim que o desfibrilador está presente devemos utilizar ele para checar o ritmo da PCR.
- Quando optamos por desfibrilar, antes disso, é necessário carregar o aparelho. Sugere-se que, enquanto o aparelho está sendo carregado, as compressões sejam retomadas (todo segundo de perfusão tecidual importa).
- Aqui vai uma dúvida muito frequente… Depois de uma desfibrilação é muito comum a ocorrência de atividade elétrica que pode ser compatível com pulso e isso nos leva a fazer uma checagem de pulso, mas o problema é que a atividade elétrica sem pulso (AESP) é muito comum nessa situação! Por isso, a recomendação é que depois de uma desfibrilação, você volte imediatamente a fazer compressões torácicas!
Vias aéreas
- Muita dúvida existe nesse ponto. O consenso é que devemos estabelecer algum tipo de via aérea (dispositivo supraglótico, máscara-balão, tubo orotraqueal etc), mas não sabemos se há benefício na intubação orotraqueal, nem sabemos quando seria o melhor momento para intubar o paciente.
Punções venosas e medicações
- Punções venosas podem exigir a interrupção desnecessária da massagem. A utilização de acessos intraósseos permite reduzir isso.
- O papel dos vasopressores é que eles geram vasoconstrição periférica e permitem o direcionamento do fluxo gerado pela compressão torácica para os órgãos nobres, aumentando a pressão de perfusão cerebral e coronariana. Por isso, a adrenalina é sempre a primeira droga a ser administrada no algoritmo do ACLS.
- Amiodarona e lidocaína são os antiarrítmicos estudados para casos de fibrilação ventricular e taquicardia ventricular sem pulso (FV/TVSP). Apesar de não termos evidência de que essas drogas aumentem a taxa de alta hospitalar, eles parecem aumentar o número de ROSC, e a amiodarona é associada com uma tendência a resultados melhores e menos efeitos indesejados (por isso, é a droga de escolha).
- Pessoas que sobrevivem a uma FV/TVSP têm indicação de inserção de cardiodesfibrilador implantável (CDI).
- Pacientes com FV/TVSP devem ser pesquisados para uma etiologia para o evento (isquemia, doenças estruturais cardíacas) e mantidos com um dos antiarrítmicos utilizados até que sua etiologia seja diretamente tratada. Caso contrário, existe pouca evidência para sua manutenção crônica, principalmente, quando os pacientes possuem CDI.
- Adrenalina tem efeitos deletérios pela ação nos receptores miocárdicos beta adrenérgicos, além de ser menos eficaz em pH ácido. Pela ausência dessas características, a vasopressina foi testada e utilizada na diretriz de 2010. Porém, novos trabalhos não mostraram nenhum benefício dela sobre a adrenalina e ela foi abandonada na diretriz de 2015 para simplificar o atendimento.
- Alguns pequenos estudos mostraram benefício na combinação de doses específicas de adrenalina, vasopressina e metilprednisolona. Mesmo assim, ainda há pouco material para que isso seja recomendado rotineiramente no atendimento e devemos dar tempo para o surgimento de evidências mais consistentes.
Mais do autor: ‘Sepse: entenda a importância do balanço hídrico negativo’
Sedação e ventilação após ROSC
- Evite utilizar a sedação logo após o ROSC para que se possa avaliar se o paciente teve algum dano neurológico.
- A ventilação deve ser feita de acordo com as estratégias de proteção pulmonar, ou seja, o volume corrente deve ficar em torno de 6 mL/Kg (utilize o peso ideal do paciente para isso).
- Evite dessaturação e também hiperóxia, ambas são lesivas. Da mesma forma, hiper e hipocapnias também são lesivas e devem ser monitorizadas e evitadas. O ideal é uma saturação em torno de 94% e uma pCO2 entre 40 e 45 mmHg.
Hipotensão e choque
- A resposta inflamatória pode gerar vasodilatação periférica, contribuindo para o processo, podemos ter um coração disfuncional e hipodinâmico.
- A utilização da ultrassonografia à beira do leito, método cada vez mais consagrado nos grandes centros, mostra-se benéfica para guiar os passos abaixo.
- Devemos escolher algum método para guiar a infusão de fluidos necessária à maioria desses pacientes. Quando considerarmos que o paciente está euvolêmico e, ainda assim, hipotenso, a administração imediata de noradrenalina imediatamente é fundamental. O alvo é manter uma pressão arterial média em torno de 90 mmHg (maior que o alvo típico de 65 mmHg).
- Pacientes que mesmo assim mantêm uma má perfusão tecidual (enchimento capilar maior que 4 segundos, hiperlactatemia, oligúria) devem receber inotrópicos (como dobutamina).
Referências:
- Jentzer JC, Clements CM, Wright RS, White RD, Jaffe AS. Improving survival from cardiac arrest: a review of contemporary practice and challenges. Ann Emerg Med. 2016; 68(6): 678-89
- ACLS 2015, disponível em: https://circ.ahajournals.org/content/132/18_suppl_2.toc
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.