O uso de drenos após a realização de uma cirurgia é algo extremamente frequente e na maioria das vezes utilizado de forma empírica, com os ensinamentos sendo passados de geração a geração. Com a evolução dos métodos diagnósticos e terapêuticos, se tornou possível colocar drenos intra-abdominais, mesmo após o término da cirurgia. Praticamente impensável antes dos anos 2000, o uso da radiologista intervencionista faz parte do arsenal terapêutico presente no dia a dia da medicina.
O uso da radiologia intervencionista está tão imerso no dia a dia, que para uma drenagem de abscesso intra-abdominal é a primeira escolha. Essa resolutividade da radiologista intervencionista é tão eficaz que estamos deixando de colocar drenos de rotinas em alguns tipos de cirurgia, visto que eventuais complicações operatórias podem ser tratadas de forma percutânea.
Baseada nessa conduta de não drenagem e recuperação rápida, foram elaborados protocolos de recuperação rápida em diversas áreas cirúrgicas, e não poderia também ficar de fora a prática de não drenagem após cirurgia gástrica. Essa conduta foi baseada em artigos que agora estão sendo questionados por um ensaio clínico randomizado publicado na Jama Surgery.
Métodos
Ensaio prospectivo, randomizado na proporção de 1:1 entre drenagem e na drenagem a pacientes submetidos à gastrectomia total ou subtotal. O paciente e o cirurgião ficaram “cegos” para a drenagem até o término da cirurgia quando era aberto o envelope com a randomização. Foi definido como desfecho primário as complicações acumuladas até 30 dias de pós-operatório que necessitasse de intervenção. Os desfechos secundários envolviam a gravidade das complicações, tempo de internação e até complicações relacionadas ao dreno.
Resultados
Entre dezembro de 2019 e dezembro de 2022, e apesar da pandemia de covid-19, foram incluídos na análise do trabalho 390 pacientes, sendo 196 no grupo dreno e 194 no grupo não dreno. Do total de pacientes, 25 faleceram antes dos 90 dias de observação do estudo. Em ambos os grupos, houve uma predominância de aproximadamente 60% de gastrectomias subtotais. A anastomose mecânica foi utilizada em todos os casos. Apenas 01 paciente do grupo dreno apresentou saída de azul de metileno no teste oral no 4º dia de pós-operatório 1/194 (0,5%), em outros 17 apresentaram uma drenagem suspeita.
Na análise dos pacientes, com metodologia de intenção de tratar, dos pacientes com dreno, 15 (7,7%) necessitavam de uma intervenção cirúrgica ou drenagem percutânea, enquanto 29 (15%), do grupo sem drenagem tiveram algum tipo de reintervenção.(90% IC, 2.1-12.4; P = .02). Na análise direta e multivariada, se manteve o benefício da drenagem profilática dos pacientes submetidos à gastrectomia. O uso do dreno não antecipou a média dos dias para detectar algumas intercorrências, nem o tempo total de hospitalização.
Discussão
Muito se investigou a respeito do uso de drenos, especialmente após a publicação dos protocolos ERAS, onde se questiona o uso rotineiro de drenos. A base para esses protocolos, se baseia em meta análise as quais não apresentaram benefício do uso de drenos em termos de reoperação e complicações do paciente. No entanto, os dados das metanálise possuíam ensaios que muitas vezes não possuíam um rigor científico ideal.
A ideia inicial deste estudo, era criar um estudo randomizado que ajudasse no subsídio estatístico do uso ou não uso de dreno com questões mais rígidas de controle. Os autores esperam resultados semelhantes entre os dois grupos, porém ao contrário das expectativas, o grupo sem drenagem apresentou uma maior necessidade de reintervenções dentro dos primeiros 30 dias.
Pode-se concluir que apesar do desencorajamento inicial, o uso preemptivo de drenos em gastrectomias pode ser benéfico.
Para levar para casa
Sem dúvida o uso de drenos é muito pessoal sem uma normativa baseada em evidência robusta. Interessante notar que os próprios autores encontraram resultados diferentes daqueles preditos, fazendo desse estudo ainda mais interessante.
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