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Carreira8 setembro 2025

Cirurgiões no Brasil: infraestrutura e condições de trabalho

Estudo do CFM e da USP revela contrastes entre SUS e setor privado, alta taxa de cancelamentos e falta de acesso a tecnologias modernas
Por Redação Afya

Quando se fala em cirurgia, imagina-se tecnologia de ponta, equipes integradas e ambientes seguros. Mas a edição mais recente da Demografia Médica, estudo do Conselho Federal de Medicina (CFM) e da USP, mostra que a realidade está distante desse ideal. O levantamento destaca as desigualdades entre setores, a frequência de cancelamentos e a sobrecarga dos profissionais, compondo um quadro que exige mudanças estruturais e valorização da especialidade.

O cirurgião oncológico Dr. Jader Ricco, membro do corpo clínico do Oncoclínicas Cancer Center, comenta os dados e aponta caminhos para enfrentar os desafios.

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Diferenças estruturais entre SUS e setor privado

Um dos pontos centrais do levantamento é a discrepância entre público e privado no acesso a leitos de UTI, apoio diagnóstico e, principalmente, condições do bloco cirúrgico. Para Ricco, a diferença mais marcante está justamente nesse último aspecto.
“Práticas mais modernas, como cirurgias minimamente invasivas, infelizmente, ainda não são rotineiras na maior parte dos hospitais SUS, o que impacta no tratamento dos pacientes”, afirma.

Segurança do paciente em risco

A pesquisa mostra que apenas 66,6% dos cirurgiões confiam na segurança do bloco cirúrgico em hospitais públicos, contra 85% nos privados. Na prática, isso se traduz em falhas de protocolos básicos.

“Percebo que os hospitais públicos são muito falhos em praticar protocolos de cirurgia segura. Raramente vejo o “sign in, time out, sign out” (em português, “entrada, pausa, saída”, três fases da lista de verificação do protocolo de Cirurgia Segura da OMS) ser aplicados no SUS”, relata Ricco.

Cancelamentos frequentes de cirurgias

Outro dado que chama atenção é o elevado índice de cancelamentos: 73% dos cirurgiões tiveram procedimentos suspensos nos últimos seis meses, sendo 21% por problemas relacionados ao centro cirúrgico ou à UTI.

“No hospital do SUS em que trabalho, o principal motivo de cancelamento é falta de anestesista, provavelmente pelo fato de não ser financeiramente atrativa essa função. O déficit de anestesistas limita significativamente o agendamento de cirurgias, além de elevar a taxa de cancelamentos”, explica.

Acesso desigual à tecnologia

Embora a laparoscopia e a videocirurgia já estejam difundidas, tecnologias mais avançadas, como cirurgia robótica, ultrassonografia e exames endoscópicos, ainda são restritas a poucos centros. Isso, segundo Ricco, compromete tanto a assistência quanto a formação de novos profissionais.

“As limitações em cirurgias minimamente invasivas e propedêuticas modernas impossibilitam que o paciente se beneficie de procedimentos menos agressivos, recuperação mais rápida e exames menos invasivos”, alerta.

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Sobrecarga profissional e ambiente de trabalho

A pesquisa também revela que 63% dos cirurgiões realizam plantões, muitos deles ultrapassando 40 horas semanais. Para Ricco, a principal causa da sobrecarga não é apenas a falta de estrutura, mas a baixa valorização do trabalho médico.

Caminhos para a mudança

Diante desse cenário, Ricco defende medidas urgentes para melhorar a prática cirúrgica no Brasil. “É preciso oferecer melhor remuneração e mais valorização ao profissional, ampliar o investimento em tecnologia e colocar pessoas com conhecimento real nos cargos de diretoria”, resume.

O diagnóstico da Demografia Médica reforça a necessidade de repensar políticas de infraestrutura, gestão hospitalar e valorização profissional. Sem avanços nessas frentes, a prática da cirurgia no Brasil seguirá marcada por desigualdade, sobrecarga e insegurança para médicos e pacientes

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