O ano era de 1846 quando o médico dentista Thomas Green Morton revolucionou a medicina, mais precisamente a anestesia, quando realizou a primeira anestesia geral com o uso de éter sulfúrico, possibilitando que os procedimentos cirúrgicos fossem realizados sob profunda sedação findando a era de “anestesia por contenção” e “anestesia por álcool”, onde os pacientes mais fortes e os pacientes que mais suportavam a dor, sobreviviam.
Após esse evento, a anestesia passou a ser uma especialidade muito estudada e diversas drogas, técnicas e aparelhos foram gradativamente desenvolvidos e aprimorados.
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Drogas
O desenvolvimento de drogas modernas, que apresentam menos efeitos adversos e colaterais, com meia vida mais curtas e com a existência de reversores, possibilitou que pacientes com doenças cardiovasculares e pulmonares, que antes corriam grande risco de morte, pudessem ser anestesiados em segurança e até estabilizados em relação a seu estado clínico. Muitos pacientes hoje, dependendo da sua condição clínica, são estabilizados na mesa de operação.
Antigamente, as primeiras drogas anestésicas apresentavam uma meia vida muito longa, deixando os pacientes anestesiados por longos períodos, até dias, além de comprometerem intensamente a parte hemodinâmica e neurológica do paciente.
Além disso, muitas drogas eram grandes liberadoras de histamina, levando ao aumento de casos de anafilaxia durante o ato anestésico como, por exemplo, a galamina (Flaxedil), potente relaxante muscular.
Atualmente, essas drogas foram sendo substituídas e os riscos amenizados e vários procedimentos começaram a ser realizados de forma ambulatorial, sem necessidade de permanência em unidade hospitalar e com alta domiciliar precoce.
As drogas modernas apresentam menos toxicidade e muitas delas ainda possuem características cardioprotetores e com pouco efeito sobre o sistema respiratório.
Hoje o profissional anestesista tem condições de escolher o tipo de droga dentro de um extenso arsenal, utilizando a que mais se encaixa em cada paciente e de acordo com cada procedimento, além de poder contar com o avanço da inteligência artificial que permitiu o desenvolvimento de calculadoras de precisão e algoritmos, que individualizam e determinam com exata precisão as doses de cada droga, levando em consideração o biotipo de cada paciente.
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Técnicas
No início da introdução da anestesia na prática clínica, apenas a anestesia geral era realizada, e os grandes desafios eram principalmente o acordar do paciente e o controle das vias aéreas, uma vez que não havia instrumentos que mantivessem a via aérea pérvia. Muitos pacientes complicavam e vinham a óbito em decorrência de broncoaspiração e parada respiratória.
No decorrer do tempo e com o avanço de pesquisas e experimentos, foi criada as anestesias espinhais e locais que possibilitaram uma maior segurança ao ato, uma vez que as vias aéreas não precisavam ser comprometidas e o procedimento podia agora ser realizado com o paciente acordado e sem dor.
A diversidade atual de técnicas anestésicas, facilita o trabalho do profissional e possibilita que pacientes que antes não apresentavam condições clínicas para se submeterem a procedimentos complexos, hoje podem ser tratados cirurgicamente com grande segurança.
Aparelhos
Os primeiros aparelhos de anestesia eram demasiadamente simples, onde havia apenas uma máscara com uma gaze, embebida com éter e colocado no nariz do paciente.
Com o decorrer do tempo e implemento de anestésicos voláteis mais modernos, as unidades de anestesia foram se desenvolvendo e passando para frascos universais com borbulhamento de anestésico e controle visual da concentração, até vaporizadores calibrados com um rigoroso controle automatizado do total de concentração de anestésico inalatório a ser utilizado. Além da implementação de circuitos de respiração modernos, que impedem a recirculação de ar e reinalação de gás carbônico, potencialmente fatal.
Junto a isso, os monitores de sinais vitais também se juntaram ao desenvolvimento da aparelhagem anestésica, iniciando com a ausculta das bulhas cardíacas com estetoscópio, a fim de determinar a profundidade anestésica e culminando com índices bispectrais de ondas cerebrais que calculam a atividade cerebral durante todo o procedimento cirúrgico.
Com o avanço da inteligência artificial, os carrinhos de anestesia mais modernos possuem acoplados monitores multiparâmetros com algoritmos sofisticados que possuem a capacidade de fornecer todos os dados vitais e hemodinâmicos do paciente, assim como dados relacionados aos gases anestésicos utilizados, fazendo com que o profissional tenha acesso em tempo real a qualquer alteração cardiovascular, motora e neurológica e possa agir de forma rápida para que não haja intercorrências que prejudiquem o bom andamento do procedimento e a boa recuperação do paciente.
Dentro dos aparelhos também podemos citar os facilitadores da anestesia, como os estimuladores de nervo periférico e ultrassom que permitem uma anestesia local mais direcionada e com menores chances de erro e uso de menores doses de anestésicos locais, além de vários dispositivos que facilitam a intubação traqueal, desde tubos guias tipo bougie até videolaringoscópios e broncofibroscópios permitindo o profissional ter visualização direta das estruturas aéreas.
Medo por parte dos pacientes
Apesar de toda a tecnologia e avanços nos dispositivos de segurança, a anestesia ainda hoje continua sendo um dos maiores medos relacionados a procedimentos cirúrgicos segundo dados da Sociedade Americana de Anestesia.
Cerca de 75 % dos pacientes relatam temer mais a anestesia do que a própria cirurgia em si. Medos principalmente relacionados a não acordar, ou acordar durante o procedimento, ou desenvolver alguma lesão medular. Porém, atualmente, a anestesia é considerada um procedimento extremamente seguro, com o uso de alta tecnologia que promove toda a segurança adequada para que praticamente todos os pacientes, independente da sua condição clínica e gravidade, possam ser submetidos a cirurgias.
A anestesia evoluiu tanto que hoje não é apenas uma especialidade cirúrgica, mas sim uma especialidade distinta na clínica da terapia da dor, onde os profissionais anestesistas também atuam, isoladamente, a nível ambulatorial, tratando casos de doenças que evoluem com dores crônicas e agudas, fazendo da especialidade uma grande fonte de alívio para a população.
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