Logotipo Afya
Anúncio
Cardiologia30 maio 2025

Troponina para estimativa de risco cardiovascular 

Estudo quantificou a vantagem potencial de adicionar informações sobre troponina cardíaca aos fatores de risco convencionais na DCV.
Por Juliana Avelar

As diretrizes recomendam a dosagem de troponina para a avaliação de pacientes com suspeita de síndrome coronariana aguda. Atualmente, devido à alta sensibilidade e especificidade dos ensaios atuais para troponinas cardíacas, é possível quantificar até mesmo concentrações circulantes muito baixas em indivíduos aparentemente saudáveis. 

Uma estratégia-chave na prevenção de doenças cardiovasculares (DCV) é o uso de algoritmos de predição de risco que integram fatores de risco convencionais para identificar indivíduos que mais poderiam se beneficiar de intervenções preventivas, como a terapia com estatinas. As diretrizes clínicas atuais também recomendam a incorporação de biomarcadores adicionais quando o nível de risco de um indivíduo não atinge um limiar claro de decisão, oferecendo oportunidades para uma estratificação de risco aprimorada. 

No entanto, a utilidade em saúde populacional dos biomarcadores de lesão cardíaca, como as troponinas, na melhoria da predição de risco cardiovascular permanece incerta.  

Para abordar essa lacuna, foi publicado recentemente no JACC um estudo que teve como objetivo responder a duas perguntas-chave:
Qual é a melhoria na predição de risco cardiovascular ao adicionar troponinas cardíacas aos fatores de risco utilizados em algoritmos de risco convencionais e qual é o impacto estimado em saúde populacional da incorporação das troponinas cardíacas na avaliação do risco de DCV?  

Métodos 

Os estudos eram elegíveis se: 

  1. Realizada a dosagem de cTnT ou cTnI usando um ensaio de alta sensibilidade; 
  2. Registradas as informações basais sobre idade, sexo, tabagismo, diabetes, pressão arterial sistólica, concentrações de colesterol total e de lipoproteína de alta densidade (HDL) ( “fatores de risco convencionais”); 
  3. Incluídos os participantes sem histórico conhecido de DCV; 
  4. Registrados os óbitos com causa específica e morbidade cardiovascular maior (infarto do miocárdio não fatal ou AVC) por pelo menos um ano de seguimento. 

Resultados 

Foram obtidos dados individuais de 62.150 participantes sem histórico prévio de DCV, provenientes de 15 estudos prospectivos. Do total, 30.144 (48,5%) eram mulheres e a média de idade foi de 61 ± 12 anos. A maioria dos participantes foi recrutada na Europa (65%) ou América do Norte (33%). 

As concentrações de troponina T cardíaca (cTnT) foram medidas em 50.523 participantes de 11 estudos e as de troponina I cardíaca (cTnI) em 28.090 participantes de seis estudos; dois estudos avaliaram ambas.  

As concentrações medianas foram de: 

  • 5,0 ng/L para cTnT. 
  • 3,3 ng/L para cTnI. 

As concentrações de troponina aumentaram com a idade, foram mais baixas em mulheres, e tiveram associação fraca com outras variáveis como história de diabetes, pressão arterial sistólica e diastólica, IMC, concentrações de colesterol total e HDL-C e creatinina. 

O tempo mediano de seguimento foi de 11,8 anos para cTnT e 9,8 anos para cTnI. Ocorreram 8.133 e 3.749 eventos incidentes de DCV, respectivamente. 

As concentrações de cTnT e cTnI mostraram associação aproximadamente linear com risco de DCV. Em relação a medidas de NT-proBNP, taxa de filtração glomerular e PCR, a troponina aumentada significava risco maior de eventos em 1,37x, 1,12x e 11,6x, respectivamente.  

As associações foram discretamente mais fortes em mulheres, mas não variaram significativamente com outros fatores de risco convencionais ou subgrupos clínicos relevantes. 

A adição de troponinas à PCR melhorou a discriminação de risco, mas a adição a NT-proBNP ou eGFR não trouxe benefício adicional substancial (intervalos de confiança sobrepostos). 

Usando um modelo baseado apenas em fatores de risco convencionais, 35.675 (36%) de 100.000 indivíduos sem histórico de DCV ou diabetes (portanto não elegíveis inicialmente para estatinas) seriam classificados como risco intermediário em 10 anos, segundo as Diretrizes de Prevenção da ESC 2021. 

A avaliação de cTnT nesses indivíduos permitiria: 

  • Reclassificar 2.754 indivíduos como alto risco. 
  • Destes, ~437 (16%) teriam um evento cardiovascular em 10 anos. 
  • Isso representa um acréscimo de 4,6% (437 de 9.487) nos eventos identificados como alto risco usando apenas preditores convencionais. 

Assumindo prescrição de estatinas conforme as diretrizes da ESC, a eficácia de redução relativa de risco seria de 20%. Ou seja, seria possível prevenir 87 eventos em 10 anos
com um NNT de 408 indivíduos para prevenir 1 evento. 

Discussão 

Em uma análise composta por dados de participantes individuais de mais de 60.000 pessoas provenientes de 15 estudos de coorte prospectivos, foi avaliado o valor potencial da adição de informações sobre troponinas cardíacas aos fatores de risco cardiovascular convencionais utilizados para prever o risco de um primeiro evento de doença cardiovascular (DCV).  

De forma geral, os resultados sugerem que a adição de troponinas cardíacas aos fatores de risco convencionais pode proporcionar uma melhora modesta na predição de eventos cardiovasculares iniciais, o que, se aplicado em larga escala, poderia ajudar a detectar até 5% mais eventos de DCV do que o uso exclusivo dos fatores convencionais.  

Em um cenário no qual as troponinas cardíacas fossem dosadas em contexto de atenção primária entre indivíduos considerados de risco intermediário após triagem inicial, os dados sugerem que um evento adicional de DCV poderia ser prevenido ao longo de 10 anos para aproximadamente cada 400 pessoas avaliadas com troponina, desde que esta avaliação seja acompanhada da iniciação de estatinas conforme diretrizes. 

Foram comparados os ganhos preditivos incrementais proporcionados pelas troponinas cardíacas com os proporcionados por outros biomarcadores, como PCR, eTFG e NT-proBNP. Os resultados demonstraram que as troponinas cardíacas ofereceram um ganho maior na acurácia preditiva em comparação com a PCR e o eTFG, enquanto o NT-proBNP apresentou resultados semelhantes. Embora as troponinas tenham oferecido melhorias adicionais na discriminação de risco além daquelas proporcionadas pela PCR — sugerindo que esses biomarcadores capturam aspectos distintos do risco cardiovascular — as melhorias proporcionadas por troponinas cardíacas e NT-proBNP não foram aditivas. Isso sugere que troponinas e NT-proBNP fornecem informações sobrepostas sobre lesão miocárdica, no contexto da prevenção primária. 

Forças e limitações do estudo 

Uso de uma amostra de conveniência de coortes compostas principalmente por pessoas de meia-idade a idosos e de ascendência europeia, o que pode limitar a aplicabilidade a outras populações. Além disso, apenas duas coortes mediram simultaneamente cTnT e cTnI, o que impossibilitou uma comparação direta confiável entre os biomarcadores.  Devemos levar em conta também que os modelos podem ter superestimado os benefícios, já que nem todas as pessoas elegíveis para estatinas receberão ou aderirão ao tratamento. 

Conclusão  

A dosagem de troponinas cardíacas, em adição aos fatores de risco convencionais, resulta em uma melhora modesta na predição de um primeiro evento de doença cardiovascular, a qual pode se traduzir em benefícios populacionais à saúde quando aplicada em larga escala.

Como você avalia este conteúdo?

Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.

Compartilhar artigo

Referências bibliográficas

Newsletter

Aproveite o benefício de manter-se atualizado sem esforço.

Anúncio

Leia também em Cardiologia