As doenças cardiovasculares (DCV) continuam sendo a principal causa de morte no mundo, representando 31% dos óbitos totais. Apesar de sabermos que medidas de prevenção e mudanças de estilo de vida têm impacto no desenvolvimento e controle dessas doenças, boa parte dos pacientes não realizam o tratamento da forma adequada, deixando de tomar as medicações, ou tomando-as de forma irregular.
Recentemente, foi feita uma revisão sistemática que avaliou o impacto da adesão ao tratamento nos desfechos clínicos. Abaixo, seguem os principais pontos desta revisão.
Métodos do estudo e população envolvida
Foi uma revisão sistemática com objetivo de identificar quais as diferenças nos desfechos clínicos (morte, acidente vascular cerebral (AVC) e infarto do miocárdio) em pacientes adultos que aderem ao tratamento medicamentoso de doenças cardiovasculares de forma adequada comparado aos que não aderem.
Os artigos selecionados eram revisões sistemáticas com metanálises que deveriam relatar estimativas de risco para avaliar o impacto da adesão sobre eventos cardiovasculares importantes e incluir pelo menos um grupo de medicamentos cardiovasculares.
Resultados
Foram incluídas quatro metanálises feitas a partir de estudos observacionais. Uma delas avaliou a adesão a vários tipos de medicamentos e diversos desfechos, sendo considerada a melhor evidência disponível. As outras três avaliaram apenas um grupo de medicamentos: anti-hipertensivos, estatinas e ácido acetilsalicílico. A qualidade geral dos estudos foi considerada satisfatória.
O primeiro estudo avaliou a adesão medicamentosa a hipolipemiantes, anti-hipertensivos, antidiabéticos e antitrombóticos e o risco de eventos cardiovasculares, AVC e mortalidade por todas as causas em pacientes que estavam tanto em prevenção primária quanto secundária. Foram incluídos mais de quatro milhões de pacientes seguidos por um período médio de 4,6 anos e os resultados mostraram que o aumento de 20% na adesão a medicamentos reduziu o risco de AVC e mortalidade por todas as causas. O risco de eventos cardiovasculares teve tendência de redução, porém sem significância estatística.
O segundo estudo mostrou que a não adesão aos anti-hipertensivos aumentou o risco de morte, porém foi baseado na análise de apenas dois estudos e a análise de certeza do corpo de evidências foi baixa para todos os desfechos. Já o terceiro foi uma metanálise com seis estudos que avaliou a relação de estatinas e desfecho de mortalidade por todas as causas. Os resultados mostraram redução de risco de morte com a boa adesão ao tratamento.
Por fim, a última metanálise incluiu seis estudos com pacientes em risco de doença arterial coronariana ou com a doença já estabelecida. Este mostrou que a não adesão ao ácido acetilsalicílico ou sua retirada estava associada a risco três vezes maior de eventos cardíacos adversos graves.
Comentários e conclusão: baixa adesão ao tratamento e risco de eventos cardiovasculares
A adesão ao tratamento é questão de saúde importante atualmente e existem poucos ensaios clínicos sobre o assunto, já que não é possível randomizar pacientes para aderir ou não ao tratamento. Assim, os estudos observacionais podem nos dar informações relevantes.
A avaliação da aderência é bastante heterogênea, já que existem diversos métodos para medi-la, o que gera variabilidade importante entre os estudos. A adesão costuma ser definida a partir da quantidade de doses consumidas em relação as doses prescritas e entende-se que para se alcançar resultados ideais, a adesão deve ser de pelo menos 80%. Um dos estudos mostrou que um aumento de 20% na adesão reduziu desfechos de forma significativa.
É importante entendermos as barreiras para a adesão adequada, desde fatores relacionados ao paciente, como esquecimento, crenças e efeitos colaterais, até questões socioeconômicas e do próprio sistema de saúde. Uma das soluções já existentes são as terapias combinadas em dose fixa, que simplifica o tratamento ao combinar diversas medicações em um comprimido.
Apesar de incluir poucas metanálises, este estudo mostrou que, mesmo com heterogeneidade entre os estudos, houve estimativas de efeito semelhantes, com uma direção consistente ao se analisar os diferentes grupos de medicamentos por desfecho. Assim, temos alguma evidência do impacto significativo da boa adesão ao tratamento com medicamentos cardiovasculares em relação aos desfechos clínicos.
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