Aproximadamente 10 a 15% dos pacientes com diabetes mellitus tipo 2 (DM2) têm disfunção tireoidiana associada, sendo o mais comum a ocorrência de alteração tireoidiana subclínica, quando há alteração do TSH e não há alteração dos hormônios livres da tireoide.
O hipertireoidismo subclínico é associado a aumento do risco de fibrilação atrial (FA), insuficiência cardíaca (IC), mortalidade cardiovascular (CV) e mortalidade geral. Já no caso de hipotireoidismo subclínico, os resultados dos estudos são conflitantes, com alguns mostrando associação com síndrome coronariana aguda (SCA), IC e mortalidade CV e outros sem confirmar essa associação.
Baseado nisso, foi feita uma análise com pacientes do estudo ORIGIN, com objetivo de avaliar se a presença de disfunção tireoidiana ou reposição de hormônio da tireoide foi capaz de predizer ocorrência de eventos cardiovasculares.
Saiba mais: Pesquisadores desenvolvem algoritmo que prevê IAM
Métodos do estudo e população envolvida
Foi uma análise de 8.401 pacientes que participaram do estudo ORIGIN, um grande estudo controlado e randomizado que avaliou a ocorrência de desfechos cardiovasculares em pacientes com alteração glicêmica e outros fatores de risco e que fizeram uso de insulina glargina ou ômega 3.
Para inclusão era necessário: idade maior ou igual a 50 anos, presença de diabetes em uso de no máximo um hipoglicemiante oral, intolerância à glicose ou glicemia de jejum alterada associado a um fator de risco cardiovascular adicional.
A função tireoidiana foi avaliada pela dosagem do TSH e categorizada como hipertireoidismo (TSH < 0,5 mIU/L), eutireoidismo (TSH 0,5 – 5,0 mIU/L), hipotireoidismo subclínico (TSH 5,0 – 10,0 mIU/L) e hipotireoidismo clínico (TSH > 10 mIU/L). Além do TSH, o uso ou não de levotiroxina também foi avaliado.
Os desfechos analisados foram os desfechos co-primários: morte CV, infarto agudo do miocárdio (IAM) não fatal ou acidente vascular cerebral (AVC) não fatal; os componentes do desfecho anterior mais revascularização ou internação por IC; mortalidade por todas as causas.
Resultados
A idade média dos pacientes era 63,7 anos, 34% eram do sexo feminino, 88% tinham diagnóstico de diabetes e 59% tinham evento cardiovascular prévio. O nível de TSH era normal em 91,5%, 0,9% tinham hipertireoidismo, 5,5% hipotireoidismo subclínico e 2,2% hipotireoidismo clínico.
Entre as variáveis analisadas, idade, sexo feminino, hemoglobina glicada, creatinina e prolactina foram positivamente associados aos níveis de TSH. Já globulina ligadora de hormônios, uso de beta-bloqueador, uso de IECA ou BRA, uso de diuréticos e de levotiroxina foram negativamente associados ao TSH.
O primeiro desfecho co-primário ocorreu em 1.405 pacientes, o segundo desfecho co-primário em 2.435 e morte em 1.340 pacientes no seguimento de 6,2 anos. Esses pacientes foram distribuídos ao longo dos níveis de TSH e não houve relação do primeiro desfecho com TSH, porém comparado aos com função tireoidiana normal os com hipotireoidismo tiveram risco 24% maior do segundo desfecho co-primário (p = 0,009) e risco de morte 37% maior (p = 0,002). Houve aumento não linear de eventos cardiovasculares e mortalidade com o aumento do TSH e não houve diferença no subgrupo que usava levotiroxina.
Na análise do modelo minimamente ajustado, o uso de levotiroxina teve relação inversa com mortalidade e essa relação se manteve após ajustes por todas as variáveis. Uso de levotiroxina também foi inversamente associada ao primeiro desfecho co-primário quando totalmente ajustado.
Veja também: Os DOAC podem ser usados para pacientes com câncer e TVP recorrente?
Comentários e conclusão
Nesse estudo, que avaliou pacientes com alteração glicêmica, hipotireoidismo subclínico teve relação com ocorrência de eventos cardiovasculares e mortalidade. O tratamento com levotiroxina pode reduzir mortalidade e não levou a aumento de eventos.
Atualmente, o tratamento de pacientes com TSH < 10 mIU/L não é recomendado, porém, baseado nos resultados desse estudo, talvez valha a pena na população de pacientes com hipotireoidismo subclínico, alteração glicêmica e alto risco cardiovascular.
Para confirmar o benefício do tratamento nesses pacientes são necessários estudos prospectivos e randomizados que avaliem se o uso da levotiroxina realmente leva a redução do risco cardiovascular.
Este artigo foi produzido em parceria com a Elsevier, utilizando os conteúdos baseados em evidências disponíveis na plataforma Clinical Key. Clique aqui para saber mais.
Como você avalia este conteúdo?
Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.