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Cardiologia27 junho 2017

FFR (Fractional Flow Reserve): você sabe usar?

Fractional Flow Reserve (FFR), em português Reserva de Fluxo Fracionada, é um método de avaliação funcional por hemodinâmica cujo interesse na cardiologia cresceu muito nos últimos anos.

Por Ronaldo Gismondi

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Fractional Flow Reserve (FFR), em português Reserva de Fluxo Fracionada, é um método de avaliação funcional por hemodinâmica cujo interesse na Cardiologia cresceu muito nos últimos anos.

Durante muitos anos, o paciente com isquemia miocárdica – seja dor anginosa típica ou um exame funcional positivo – era encaminhado para coronariografia e as estenoses superiores a 50-70%, tratadas com angioplastia e colocação de stent (PCI, percutaneous coronary intervention). Isso levou muitos médicos a supervalorizarem os resultados dos stents.

Médicos que tinham dor precordial muitas vezes iam direto ao seu amigo hemodinamicista e pediam para “abrir todas as lesões” que fossem encontradas (reflexo oculoestenótico). O problema é que as consequências adversas do uso excessivo de stent começaram a aparecer: a reestenose, com stent convencional, e o risco de trombose, com os farmacológicos. O uso de dupla antiagregação plaquetária prolongada também trouxe inconvenientes, pois muitos pacientes apresentavam sangramento e/ou necessidade de cirurgias menos de 1 ano após a colocação do stent.

Desse modo, foram realizadas pesquisas nos últimos 10 anos mostrando que o tratamento clínico otimizado moderno, com AAS e estatinas em dose alta, tem a mesma eficácia em reduzir o risco de morte e IAM quando comparado com a intervenção percutânea. Hoje, no cenário da doença coronariana estável/ambulatorial, a coronariografia (CAT) com PCI está indicada para o paciente com dor refratária ao tratamento clínico e/ou para o paciente com grande isquemia no teste funcional (o chamado “teste de alto risco”).

Mas o que o FFR tem a ver com isso? Quando o CAT é realizado, é comum encontrar diversas lesões obstrutivas. Apesar de haver software específico, a maioria dos médicos estima visualmente o grau de obstrução e considera-se relevante obstruções > 50-70%. No paciente com teste funcional por imagem, é possível correlacionar as áreas isquêmicas do teste com estas lesões encontradas no CAT. Mas e se houver uma lesão de 80% em um território sem isquemia? Ou, por outro lado, se houver isquemia com obstrução <50%? Estudos como DEFER e FAME mostraram que lesões com FFR “normal” não precisam ser angioplastadas, pois isso não muda o prognóstico, mas vale a pena intervir se FFR estiver alterado, mesmo em estenoses pequenas.

Além disso, em pacientes sem imagem funcional, o FFR determina quais lesões são funcionalmente isquêmicas com uma acurácia igual à cintilografia e ao ecocardiograma de estresse. Com isso, em vez de solicitar uma cintilo (radiação + custo) para avaliar quais áreas são isquêmicas, um paciente poderia ir direto ao CAT e decidir pelo FFR (no mesmo procedimento) quais lesões abordar. Outra aplicação é no contexto de SCA: não há dúvida que a lesão culpada pelo quadro agudo deve ser tratada. A dúvida é o que fazer com as demais lesões. Nas diretrizes ganhou força a ideia de “abrir todas”, mas os estudos com FFR mostram que basta colocar stent naquelas com FFR alterado: o prognóstico é o mesmo!

Outra indicação do FFR é para avaliar se o stent de fato desobstruiu a artéria. Classicamente, injeta-se contraste e o fluxo distal é avaliado pelo TIMI. O FFR pode fornecer a mesma informação sem a necessidade de mais contraste. O alvo é um FFR ≥ 0,95, isto é, um gradiente < 5 mmHg após o stent. No quadro 1 colocamos as principais indicações do FFR.

Quadro 1: indicações FFR

  • Indicar quais lesões obstrutivas coronarianas, independente do grau de estenose, devem ser angioplastadas.
  • Avaliar o resultado da colocação do stent.

E o que é o FFR? A microcirculação coronariana é capaz de promover vasodilatação aumentando o fluxo sanguíneo para o miocárdio em situações de maior demanda e o mesmo ocorre quando há isquemia, isto é, o fluxo é insuficiente para a necessidade. Contudo, medir este fluxo é tecnicamente difícil. Em situações “ideais” de máxima dilatação das coronárias epicárdicas, há um paralelo entre o fluxo coronariano e a pressão intracoronariana.

Por isso, podemos medir a pressão (tecnicamente mais fácil) para dela estimar o fluxo. Quando uma estenose é significativa, o fluxo/pressão pós-estenose são menores que na área pré-estenose mesmo com a coronária dilatada ao máximo. No FFR, um cateter (semelhante ao da PAM) é passado distal à lesão (Pd). Outro sensor é deixado proximal/antes (Pa). Injeta-se um vasodilatador (em geral adenosina intracoronariana) e o FFR será a divisão entre Pd/Pa.

Considera-se normal um FFR ≥ 0,75 a 0,80

Como nada é perfeito, o FFR pode apresentar problemas. A técnica em si é simples e de boa reprodutibilidade, mas é preciso ser cuidadoso: um simples dumping do cateter ou uma falta de flush podem atrapalhar a medida igualzinho ao que ocorre nas PAMs do CTI. Outro aspecto é que o ponto de corte não está estabelecido se 0,75 ou 0,80.

Um cuidado especial é que o FFR não deve ser visto como “normal ou alterado”. Como toda variável contínua, quanto maior (mais perto de 1), menos isquemia há, e quanto menor, mais isquemia. Valores em torno 0,75-0,80 precisam ser avaliados no contexto clínico do paciente (e não usados como guilhotina!).

Outra dica: em pacientes com hipertrofia maciça do VE (miocardiopatia hipertrófica e estenose aórtica grave) e em pacientes com grande aumento da pressão venosa central, o FFR pode vir falsamente elevado e deve ser usado com cautela.

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