No último dia do congresso da American Heart Association (AHA 2025) foi apresentado um trabalho bastante interessante sobre a utilização de um inibidor da glicoproteína IIb/IIIa (Gp IIb/IIIa), que atua no passo final da antiagregação plaquetária, em pacientes com infarto agudo do miocárdio (IAM) com supradesnivelamento do segmento ST (supra de ST).
Pacientes com IAM com supra de ST devem ter o fluxo sanguíneo restaurado rapidamente, com objetivo de reduzir mortalidade e reduzir a chance de evolução para insuficiência cardíaca (IC). Atualmente sabemos que a utilização de inibidores de P2Y12 no atendimento pré-hospitalar não tem benefício em melhora da patência do vaso.
Uma opção seriam os inibidores da Gp IIb/IIIa, porém são difíceis de administrar e ainda não sabe se há benefício no tratamento inicial do IAM com supra. O zalunfiban é um novo inibidor de Gp IIb/IIIa, que pode ser administrado por via subcutânea, na casa do paciente, ambulância ou hospital. A inibição plaquetária ocorre em 15 minutos e a meia vida é curta, por volta de 1 hora, o que não atrapalha um procedimento cirúrgico, caso necessário.
Já foi visto em um estudo de fase 2 que quando utilizado na chegada à hemodinâmica, a medicação leva a maior patência do vaso, maior perfusão e menor ocorrência de trombo na angiografia inicial. Assim, esse novo estudo teve como objetivo avaliar a medicação no paciente com IAM com supra de ST assim que diagnosticado.
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Métodos do estudo e população envolvida
O estudo foi multicêntrico, internacional, realizado em 58 centros de 8 países, randomizado e controlado por placebo. Os pacientes com IAM com supra de ST foram randomizados para receber zalunfiban nas doses de 0,11mg/kg ou 0,13mg/kg ou placebo. Os critérios para inclusão eram IAM com supra de ST e menos de 4 horas de sintomas. Pacientes com parada cardiorrespiratória, choque cardiogênico, COVID-19 ou anticoagulação oral foram excluídos.
O desfecho primário de eficácia foi um desfecho hierárquico que compreendeu morte, acidente vascular cerebral (AVC), recorrência de IAM, trombose aguda de stent (em até 24 horas), IC nova ou reinternação por IC, troponina mais que 30 vezes o limite superior ou nenhum dos acima no período de 30 dias. O desfecho de segurança foi sangramento grave ou ameaçador a vida em 30 dias.
Resultados
Dos pacientes randomizados, 1671 receberam zalunfiban, sendo 853 na dose menor e 818 na dose maior, e 796 receberam placebo. Em 87% das vezes a medicação foi feita na ambulância.
Os dois grupos tinham características semelhantes, com idade média próxima de 63 anos, 79% do sexo masculino e 95% brancos. Os tempos para o diagnóstico e para receber a medicação e o tempo entre a medicação e a intervenção coronária percutânea (ICP) foram semelhantes. Quase todos receberam o tratamento habitual para IAM, com aspirina, heparina e inibidor de P2Y12 e mais de 90% foram submetidos a ICP.
Na análise do desfecho primário, os resultados mostraram benefício da medicação, com OR 0,79 (IC95% 0,65-0,98) e p=0,028, o que significa redução de 21% na ocorrência de eventos com o uso da medicação.
Ao se analisar os desfechos de forma individual, a redução foi mais significativa em relação a trombose aguda de stent, IAM com troponina mais que 30 vezes o limite superior e ausência de qualquer evento adverso. Não houve diferença em relação a sangramento grave ou ameaçador a vida, porém houve mais sangramento leve e moderado no grupo intervenção.
Em relação aos desfechos secundários, mais pacientes do grupo intervenção tiveram melhora do eletrocardiograma e a artéria aberta na angiografia, com fluxo TIMI 2 ou 3, o que mostra maior patência do vaso com a medicação.
Comentários e conclusão
O uso do inibidor de Gp IIb/III, zalunfiban, no atendimento inicial do IAM com supra de ST parece ser benéfico, com redução de desfechos e pode se tornar um agregado no atendimento inicial. Uma limitação importante é que este estudo incluiu majoritariamente pacientes homens, brancos e europeus, não sendo possível generalizar os resultados.
Assim, mais estudos são necessários para confirmar esses resultados e também esclarecer a melhor dose a ser utilizada, já que neste estudo foram testadas duas dosagens diferentes e os resultados foram apresentados em conjunto.
Confira a cobertura completa do AHA 2025!
Autoria

Isabela Abud Manta
Editora médica de Cardiologia da Afya ⦁ Residência em Clínica Médica pela UNIFESP ⦁ Residência em Cardiologia pelo Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) ⦁ Graduação em Medicina pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) ⦁ Atua nas áreas de terapia intensiva, cardiologia ambulatorial, enfermaria e em ensino médico.
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