Seguindo a cobertura do congresso da American Heart Association (AHA 2025), o assunto de agora é fibrilação atrial. O estudo ADAPT-FA foi apresentado no congresso e publicado no New England Journal of Medicine.
Sabemos que pacientes com FA precisam ser anticoagulados para prevenir AVC/embolia sistêmica, enquanto aqueles submetidos a intervenção coronária percutânea (ICP) com stents farmacológicos precisam de terapia antiplaquetária para prevenir trombose de stent e eventos isquêmicos. A combinação anticoagulante + antiplaquetário aumenta o risco de sangramento. Ensaios randomizados recentes definiram estratégias logo após a ICP (suspensão precoce de AAS e manutenção de NOAC + inibidor P2Y12 por 6–12 meses). Para o período >1 ano pós-ICP, diretrizes recomendam monoterapia com anticoagulante, porém faltavam ensaios específicos nessa população de stent farmacológico.
O ADAPT AF-DES foi desenhado, então, para testar a não inferioridade da monoterapia com NOAC versus NOAC + clopidogrel nesse cenário.
Trata-se de um ensaio investigator-initiated, multicêntrico (32 centros na Coreia), aberto, com comitê independente e cego para adjudicação de desfechos. Foram elegíveis pacientes entre 19–85 anos, FA com ICP prévia e stent farmacológico de 2ª/3ª geração implantado ≥1 ano; CHA₂DS₂-VASc ≥2; risco de sangramento avaliado por HAS-BLED. Principais critérios de exclusão: >85 anos, prótese valvar mecânica, estenose mitral moderada-a-severa, TVP, stent de 1ª geração.
Randomização e tratamentos
Os pacientes foram alocados1 para:
- Monoterapia NOAC: apixabana 5 mg 2×/dia ou rivaroxabana 20 mg 1×/dia (com ajustes pré-especificados).
- Terapia combinada: apixabana 5 mg 2×/dia ou rivaroxabana 15 mg 1×/dia + clopidogrel 75 mg 1×/dia (dose de 15 mg de rivaroxabana baseada em ensaio prévio).
Avaliações no basal, 6 e 12 meses.
Desfechos
Primário: composto líquido (morte por todas as causas, IAM, trombose de stent, AVC, embolia sistêmica, ou sangramento maior/CRNM) aos 12 meses. Secundários: componentes individuais, sangramento definido pelos critérios ISTH.
Resultados
De abril/2020 a maio/2024, foram randomizados 960 pacientes. Características basais eram equilibradas: idade média 71,1±8,5 anos; 21,4% mulheres; PCI complexa em 25,7%; tempo mediano entre ICP e randomização 32,8 meses; FA paroxística 38,9% e persistente/permanente 61,1%.
Antes da randomização: 61,1% usavam antitrombótico combinado, 23,1% apenas anticoagulante, 15,7% apenas antiplaquetário.
Desfecho primário
Aos 12 meses, um evento do desfecho primário ocorreu em 46 pacientes (9,6%) no grupo de monoterapia e em 82 pacientes (17,2%) no grupo de terapia combinada, resultando em uma diferença absoluta de –7,6 pontos percentuais e um hazard ratio (HR) de 0,54 (IC 95,2%: 0,37–0,77; P<0,001 para superioridade).
Sangramento maior ou clinicamente relevante não maior ocorreu em 25 pacientes (5,2%) no grupo de monoterapia e em 63 pacientes (13,2%) no grupo de terapia combinada (HR 0,38; IC 95%: 0,24–0,60). Ou seja, a monoterapia com anticoagulante (NOAC) reduziu em 46% o risco relativo de eventos adversos clínicos líquidos e em 62% o risco de sangramento significativo em comparação à combinação NOAC + clopidogrel, com resultados estatisticamente robustos tanto para não inferioridade quanto para superioridade.
Discussão
Em pacientes com FA e doença coronária estável >1 ano após ICP com stent farmacológico de 2ª/3ª geração, monoterapia com apixabana ou rivaroxabana foi não inferior e superior à combinação NOAC + clopidogrel para o desfecho líquido em 12 meses, com redução substancial de sangramento e sem aumento de eventos isquêmicos. O estudo complementa evidências de AFIRE e EPIC-CAD (ambos mostraram menos sangramento com NOAC isolado e risco isquêmico similar), superando limitações prévias (uso de stent metálico, predomínio de AAS, encerramentos precoces) ao focar especificamente em stent farmacológico e no par NOAC + clopidogrel como comparador.
Limitações
O estudo teve desenho aberto (mas com adjudicação cega). Além disso, a taxa de eventos foi mais baixa do que o esperado, o que diminui o poder do estudo. Destaque também que foram utilizados apenas apixabana/rivaroxabana e com dose reduzida de rivaroxabana no grupo combinado. Por fim, a coorte foi exclusivamente leste-asiática, o que limita a extrapolação dos resultados para outras populações. Os resultados foram de seguimento de 12 meses (análises até 24 meses em andamento).
Conclusão
A monoterapia com NOAC em pacientes com FA e stent farmacológico implantado há ≥1 ano reduziu eventos clínicos adversos líquidos e sangramento em relação a NOAC + clopidogrel, sem aumento de eventos isquêmicos. O estudo tem limitações, mas os resultados reforçam as recomendações atuais de se manter anticoagulante em monoterapia após o primeiro ano de ICP, agora com evidência randomizada específica para stents farmacológicos.
Confira a cobertura completa do AHA 2025!
Autoria

Juliana Avelar
Médica formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Cardiologista pelo Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia
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