Resolvendo caso clínico com ajuda de IA
A inteligência artificial (IA) tem impactado de forma expressiva a nossa rotina e tem um futuro promissor na área médica. A IA generativa, um tipo de IA que se destaca por sua capacidade de criar conteúdo novo a partir de dados existentes, por exemplo ChatGPT e Gemini, tem potencial para apoiar a atividade médica em várias áreas. Mas será que essas tecnologias já estão prontas para nos apoiar na prática clínica? Neste artigo, vamos analisar o potencial do Gemini (1,5 flash) e do ChatGPT (4.o) para auxiliar na interpretação de um caso clínico, explorando seus pontos fortes e suas limitações.
Avaliação pelo Gemini
Caso clínico: Jovem com tosse, febre e lesão volumosa cerebral.
O Gemini foi orientado para considerar ser um especialista em medicina de emergência e inserimos o Prompt:
MP, 23 anos, sexo masculino, natural do Rio de Janeiro, sem comorbidades, não faz uso de nenhum medicamento regularmente.
Há 3 semanas havia iniciado tosse secretiva. Como evoluiu com cefaleia e piora da tosse, procurou a emergência no décimo quarto dia de evolução, quando foi diagnosticado com sinusite e iniciou Clavulin e Predsin.
Apresentou inicialmente uma melhora, porém no quinto dia de antibiótico, notou retorno da tosse. No sétimo dia, que estava programado para ser o último dia da medicação, pegou um voo partindo do RJ para Araguaína, onde tinha um evento a trabalho. Fez escala em Brasília, quando começou a apresentar febre, cefaleia e piora importante do estado geral.
Ao chegar em Araguaína, mantinha febre alta e relatou algumas alucinações como sensação de estar caindo em um buraco.
Na admissão, queixava-se de cefaleia e tonteira. Apresentava febre de 40 graus, taquicardia (FC 130), PA 120×80.
Que exames me orientaria pedir e quais os diagnósticos diferenciais?
Resposta dada pelo Gemini
Dada a história clínica do paciente, com início de tosse, cefaleia e piora do estado geral, seguido de febre alta, alucinações e taquicardia após viagem, a principal preocupação é a possibilidade de uma infecção grave, especialmente uma meningite bacteriana.
Exames a serem solicitados:
- Hemograma completo: para avaliar a presença de leucocitose, que pode sugerir infecção.
- Exames bioquímicos: para avaliar a função hepática e renal, que podem ser afetadas por infecções graves.
- Cultura de líquor: fundamental para confirmar ou descartar meningite. O líquor deve ser analisado para presença de bactérias, leucócitos e proteína.
- Tomografia computadorizada de crânio: para avaliar a presença de alterações estruturais no sistema nervoso central, como abscessos ou meningite.
- Hemocultura: para identificar o agente causador da infecção, caso este esteja presente na corrente sanguínea.
- Radiografia de tórax: para descartar pneumonia ou outras condições pulmonares.
Diagnóstico diferencial:
- Meningite bacteriana: a principal hipótese, especialmente considerando a febre alta, cefaleia, alucinações e rigidez de nuca (se presente).
- Encefalite: inflamação do cérebro, que pode ser causada por vírus, bactérias ou outros patógenos.
- Meningite viral: embora menos grave que a meningite bacteriana, também pode causar sintomas semelhantes.
- Septicemia: infecção generalizada da corrente sanguínea.
- Pneumonia: infecção pulmonar que pode se disseminar para o sistema nervoso central.
- Malária: possibilidade em regiões endêmicas, especialmente com viagem recente.
- Febre tifóide: febre prolongada, cefaleia, tontura, e problemas gastrointestinais.
- Dengue: febre, cefaleia, dor muscular e erupção cutânea.
Observação:
- A descrição indica que o paciente já estava tomando antibióticos antes da viagem. É importante saber qual o tipo de antibiótico e por quanto tempo foi administrado.
- O voo pode ter agravado os sintomas.
- A presença de alucinações é um sinal grave, sugerindo comprometimento do sistema nervoso central.
- O paciente deve ser transferido para um hospital com unidade de terapia intensiva (UTI) para receber cuidados especializados.
Recomendações:
- Internação imediata em ambiente hospitalar com UTI.
- Coleta de exames laboratoriais e de imagem com urgência.
- Administração de antibióticos de amplo espectro.
- Monitorização rigorosa da condição clínica do paciente.
Ressaltamos a importância do atendimento médico especializado e a necessidade de realizar a investigação diagnóstica completa para garantir o tratamento adequado e evitar complicações.
Continuação da interação com Gemini
O MP acabou ficando internado, exames com marcadores inflamatórios altos. O Gemini ainda não interpreta tomografias, então descrevi o exame e solicitei novos diagnósticos diferenciais:
O paciente respondeu bem a hidratação e antibióticos. Na tomografia de crânio, foi visto que havia sinusite e uma imagem hipodensa grande em região frontal e temporal. Que diagnóstico diferencial você consideraria?
Resposta dada pelo Gemini
A presença de uma imagem hipodensa de grandes dimensões nas regiões frontal e temporal na tomografia de crânio do paciente, após uma história de infecção respiratória, febre alta e alucinações, sugere um diagnóstico diferencial que inclui:
- Abcesso Cerebral:
- É a principal hipótese, considerando o histórico de infecção e a localização da lesão.
- Podem se apresentar como imagens hipodensas na tomografia, com um halo de edema ao redor.
- Sintomas como febre, cefaleia intensa, alterações neurológicas e convulsões são comuns.
- Encefalite:
- A inflamação do cérebro pode causar alterações no tecido cerebral, que podem ser visualizadas como hipodensidades na tomografia.
- Os sintomas podem variar dependendo da localização e da causa da encefalite.
- Infarto Cerebral:
- Embora menos provável devido à história do paciente, um infarto cerebral pode se apresentar como uma área hipodensa na tomografia.
- Cisto Aracnoide:
- Um cisto aracnoide é uma bolsa de líquido cefalorraquidiano (líquor) que se forma no espaço subaracnoide.
- Podem ser assintomáticos ou causar sintomas como cefaleia, convulsões ou déficits neurológicos.
- Tumor Cerebral:
- Embora menos provável, um tumor cerebral pode se apresentar como uma lesão hipodensa na tomografia.
- Os sintomas variam dependendo do tamanho, localização e tipo de tumor.
Ressaltamos a importância do acompanhamento médico especializado e a necessidade de realizar a investigação diagnóstica completa para garantir o tratamento adequado e evitar complicações.
Desfecho para o caso
O Gemini me retornou uma lista de diagnósticos diferenciais, dentre eles, o diagnóstico do MP. O laudo liberado no dia seguinte revelou:
Volumosa formação cística frontotemporal à esquerda, com atenuação semelhante ao líquor, ocupando o polo anterior da fossa craniana média, determinando deslocamento de do parênquima cerebral adjacente. Mede cerca de 7,9×7,0×4,1cm. Imagem inespecífica podendo corresponder a cisto aracnoide.
O paciente foi visto pela equipe de neurocirurgia, que solicitou uma RNM cerebral e confirmou-se a hipótese de cisto aracnoide. Ele também tinha sinusite, fez antibiótico intravenoso e evoluiu bem do quadro infeccioso. Pegou o voo de volta com tranquilidade após alguns dias.
Avaliação pelo ChatGPT 4o
Os mesmos passos usados anteriormente foram repetidos no ChatGPT. Os diagnósticos diferenciais foram parecidos. O grande diferencial é que ele interpreta exames de imagem. Quando a TC foi mostrada, o GPT logo sugeriu que se tratava de uma sinusite complicada, mas não comentou nada a respeito da imagem hipodensa fronto temporal.
Resposta fornecida pelo ChatGPT
A imagem da tomografia dos seios da face mostra sinais que podem ser consistentes com uma sinusite grave. Observa-se opacificação dos seios paranasais, o que pode indicar a presença de uma infecção significativa.
Interpretação da Imagem
- Opacificação dos Seios Maxilares: A opacificação sugere a presença de muco ou pus, indicando uma sinusite.
- Espessamento da Mucosa Sinusal: Pode ser observado espessamento da mucosa, típico de processos inflamatórios.
- Nível Hidroaéreo: Se presente, indica a acumulação de líquido purulento.
Quando questionei sobre a imagem fronto-temporal, ele me trouxe diagnósticos diferenciais, dentre eles: abscesso cerebral, empiema subdural, AVC, edema cerebral, leucoencefalopatia e os cistos congênitos (diagnóstico do paciente). Além disso, sugeriu complementar a investigação com uma Ressonância magnética de crânio.
IAs generativas na prática: pontos fortes e limitações
As IAs orientaram os exames e citaram diagnósticos diferenciais especificando bem a justificativa de cada proposta. Ressaltaram a importância de coletar hemoculturas e iniciar antibiótico de amplo espectro, etapas essenciais neste caso. Porém, precisamos ponderar a limitações desses modelos, citadas pelo próprio Gemini:
Falta de regulamentação médica: A IA não é médica! Ela não possui licença nem passou por residência médica.
Dados limitados e viés: Os modelos foram treinados em dados vastos, mas não especificamente para medicina. Eles podem ter dificuldades com nuances de diagnósticos complexos.
Incapacidade de examinar pacientes: O exame físico é fundamental! As IAs não pode ouvir pulmões, palpar abdome, etc. Faltam dados essenciais para uma avaliação completa.
Interpretação de exames complexa: A IA não substitui radiologistas, patologistas, etc. A interpretação de imagens exige expertise humana. Dados numéricos de exames, sem contexto clínico, são insuficientes para a IA.
Fator humano e ética: A medicina não é só ciência, mas também arte e empatia. A IA não compreende o sofrimento e a ansiedade do paciente. Decisões médicas complexas envolvem ética e valores, algo que a IA ainda não domina.
Desfecho do caso
Após uma semana, o caso foi repetido ao Gemini e ele sugeriu diagnósticos diferenciais diferentes e nem citou a possibilidade de cisto aracnoide, além de ter variado algumas orientações referentes a exames e conduta. Esta variabilidade das informações e a possibilidade de o sistema dar orientações aleatórias não referenciadas também preocupa bastante.
Mensagem prática
As IAs generativas demonstram potencial para auxiliar na interpretação de casos clínicos, fornecendo informações relevantes e orientando exames. No entanto, é preciso ter cautela e consciência de suas limitações.
A IA generativa ainda precisa de aperfeiçoamento para garantir a sua segurança e confiabilidade na prática médica. A busca por um treinamento especializado, validação rigorosa e um sistema de referenciamento robusto são essenciais para que a IA possa, no futuro, ser uma ferramenta de apoio segura e eficiente para consultarmos em uma madrugada solitária de plantão.
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** Texto criado com o auxílio do ChatGPT . A matéria foi validada pelos profissionais médicos.
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