A crescente preocupação com as mudanças climáticas e com a degradação ambiental tem motivado diferentes setores da sociedade a adotar práticas sustentáveis como forma de mitigar seu impacto ambiental, e o setor da saúde não pode ser exceção.
O centro cirúrgico é uma das áreas hospitalares com maior consumo de recursos e geração de resíduos, contribuindo significativamente para emissões de gases de efeito estufa (GEE). A anestesiologia, em particular, desempenha um papel central nesse impacto devido ao uso de agentes anestésicos voláteis, com elevado potencial de aquecimento global, e devido também ao consumo intensivo de energia. Felizmente, diversas estratégias vêm sendo adotadas para mitigar esses efeitos e promover uma prática mais sustentável.
Escolha de agentes anestésicos com menor impacto ambiental
Agentes anestésicos como o desflurano e o óxido nitroso possuem alto potencial de aquecimento global (PAG). Estudos indicam que o uso de desflurano por uma hora equivale à emissão de dióxido de carbono (CO₂) de um carro percorrendo 360 km, e pode permanecer por até 14 anos na atmosfera, além de possuir um PAG cerca de 20 vezes maior que o sevoflurano.
Optar por anestésicos com menor PAG, como o sevoflurano, ou utilizar técnicas alternativas como anestesia intravenosa total, bloqueios espinhais e bloqueios locais, pode reduzir significativamente as emissões de GEE.
Implementação de anestesia de baixo fluxo
Os anestésicos voláteis como desflurano, isoflurano e sevoflurano, são gases com um potente efeito estufa (contribuindo com até 5% das emissões de gases desse efeito) e com potenciais de aquecimento global significativamente maiores que o CO2. Quando utilizados em altos fluxos, esses agentes são em grande parte desperdiçados, sendo liberados diretamente para o ambiente, uma vez que os sistemas de anestesia não consomem completamente os gases administrados.
Reduzir o fluxo de gases frescos durante a anestesia (para menos de 1 L/min) diminui o consumo de agentes anestésicos e, consequentemente, das emissões associadas. Essa prática, além de ambientalmente benéfica, também é economicamente vantajosa, por utilizar menos anestésico e consequentemente reduzir os custos hospitalares.
Uso de tecnologias de captura de gases anestésicos
A maioria dos sistemas anestésicos tradicionais expele os gases residuais diretamente para o ambiente, sem nenhuma filtragem, isso ocorre porque somente uma pequena parte dos gases administrados é metabolizada pelo corpo humano, sendo o restante eliminado que forma quase inalterada. O desflurano por exemplo, permanece na atmosfera por cerca de 14 anos.
Dispositivos de captura e estratégias de redução da emissão de gases, como filtros de carvão ativado, recaptura e reciclagem de anestésicos e tecnologia smart anesthesia, que são sistemas inteligentes integrados de anestesia que otimizam o uso dos agentes voláteis, podem reter agentes anestésicos exalados antes que sejam liberados no ambiente, reduzindo a poluição atmosférica, com diminuição expressiva da emissão de GEE em conformidade com as metas de sustentabilidade hospitalar e responsabilidade socioambiental das instituições de saúde.
Alguns desafios ainda fazem parte dessa esfera, como o custo inicial que pode ser elevado, a necessidade de treinamento das equipes e a falta de uma regulamentação específica em alguns países.
Otimização do consumo de energia no centro cirúrgico
O centro cirúrgico é um dos setores hospitalares com o maior consumo de energia dentro das instituições de saúde, principalmente devido a necessidade de manter condições ambientais controladas, equipamentos de alta potência funcionando constantemente e iluminação intensa.
As salas de cirurgia precisam de uma climatização contínua para manutenção de temperatura, umidade e pressão ambiental e uma iluminação intensa para a segurança cirúrgica e conforto das equipes. Além disso, os monitores, bisturis elétricos e sistemas de anestesia consomem muita energia e muitos hospitais possuem uma atividade ininterrupta, com atendimentos cirúrgicos por 24 horas.
Esses locais podem chegar a ser responsáveis por até 90% do consumo energético dos hospitais.
Ajustar esses sistemas de consumo de energia durante períodos de inatividade, utilizar sensores de presença para controle de iluminação, sistemas inteligentes de climatização, substituição de lâmpadas halógenas por LEDS cirúrgicos de alto rendimento, podem, além de melhorar a gestão do uso de equipamentos de alto consumo energético, investir em fontes de energia renovável, que são medidas eficazes para reduzir o consumo energético.
Essas medidas podem resultar em até 30% de redução no consumo da energia elétrica, diminuindo a emissão indireta de CO2 e melhorando a eficiência operacional hospitalar.
Substituição de materiais descartáveis por reutilizáveis
Substituir materiais descartáveis por reutilizáveis, apesar de ser uma estratégia importante para a sustentabilidade ambiental, necessita de um planejamento rigoroso, principalmente por se tratar de riscos biológicos e controle de infecção.
Essa substituição traz alguns benefícios como a redução de resíduos hospitalares que diminuem o volume de lixo infectante e a diminuição do custo com a logística de destinação final do produto, além disso, diminui o impacto ambiental e traz economia a longo prazo.
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Mas para isso é necessário adotar condutas rigorosas para minimizar riscos com a implementação de protocolos de higienização rigorosos, seguindo as normas das ANVISA, capacitação da equipe e do controle de infecção.
A adoção de materiais cirúrgicos reutilizáveis, como capotes, aventais e campos operatórios, reduz a geração de resíduos e o impacto ambiental associado à produção e descarte de materiais descartáveis.
Gestão eficiente de resíduos hospitalares
Resíduos hospitalares são todo o material resultante de atividades médicas, odontológicas, laboratoriais, farmacêuticas e qualquer outra área relacionada a unidades de saúde. São classificados como potencialmente infectantes, químicos, radioativos, sem risco e pérfuro-cortantes. E cada grupo deve ser descartado de forma correta e em lugares específicos, seguindo normativas pré-estabelecidas pelos órgãos regulamentadores.
A gestão correta de resíduos hospitalares além de ser um compromisso ético e ambiental, é uma exigência legal que deve ser rigorosamente seguida.
O descarte inadequado de resíduos hospitalares pode gerar impactos ambientais graves, além de risco à saúde pública e à equipe de saúde e riscos ao meio ambiente.
Implementar programas de segregação correta e reciclagem de resíduos, capacitação contínua da equipe, redução da geração de resíduos com destinação final adequada e doação de equipamentos médicos não utilizados, contribui de forma significativa para a redução do impacto ambiental do centro cirúrgico.
A integração dessas estratégias no cotidiano dos centros cirúrgicos não apenas diminui o impacto ambiental, mas também promove práticas mais eficientes e econômicas. A conscientização e o engajamento de toda a equipe hospitalar são fundamentais para o sucesso dessas iniciativas.
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