Neste episódio, a pediatra Dra. Lygia Lauand recebe a Dra. Roberta Castro, especialista e pesquisadora em dor pediátrica, para uma conversa esclarecedora sobre como a dor vivenciada na infância pode afetar o corpo e a mente ao longo de toda a vida.
A dor infantil é uma experiência complexa, com implicações que ultrapassam o desconforto imediato e influenciam o desenvolvimento neurológico e psicológico ao longo da vida. As vias neurais para a nocicepção estão presentes por volta da 24ª semana de gestação, enquanto os mecanismos inibitórios da dor ainda são imaturos ao nascimento, tornando o recém-nascido mais suscetível a respostas dolorosas intensas e prolongadas.¹ A subvalorização da dor nessa fase pode ocasionar alterações no desenvolvimento cerebral e na resposta futura ao estresse e à dor, destacando a importância do reconhecimento e tratamento precoces.²,¹⁰
A avaliação da dor na infância deve ser individualizada e baseada em instrumentos validados, de acordo com a idade e a capacidade comunicativa da criança. Em lactentes e pacientes não verbais, recomenda-se o uso de escalas observacionais como a Neonatal Infant Pain Scale (NIPS), a FLACC e a COMFORT-B¹,³⁻⁵. Já em crianças maiores, o autorrelato é o padrão-ouro, utilizando-se escalas como a Wong-Baker Faces, a Oucher e a escala de faces revisada da IASP¹-³,⁶,⁷. O manejo deve seguir uma abordagem multimodal, que combine estratégias não farmacológicas — acolhimento, presença parental, ambiente humanizado, distração e técnicas de relaxamento — com o uso racional de analgésicos¹,²,⁹⁻¹¹. Entre os fármacos disponíveis, a dipirona apresenta eficácia analgésica comprovada e perfil de segurança favorável em pediatria, com incidência de eventos adversos graves inferior a 0,3% e risco de agranulocitose estimado em aproximadamente 1 caso por milhão de usuários¹⁶⁻²¹.
Experiências dolorosas mal manejadas na infância podem gerar consequências psicossociais duradouras, como medo de procedimentos médicos, ansiedade e até evitação de cuidados de saúde na vida adulta⁹,²². O cuidado empático e baseado em evidências é, portanto, essencial não apenas para o alívio imediato do sofrimento, mas também para a promoção de um desenvolvimento saudável e de uma relação positiva com o sistema de saúde. O manejo adequado da dor infantil é uma ferramenta de prevenção em saúde pública, que contribui para reduzir impactos emocionais e melhorar a qualidade de vida futura das crianças²,¹⁰⁻¹².
Assista ao videocast Impacto do manejo adequado da dor em desenvolvimento e saúde psicológica.
Autoria

Roberta Esteves Vieira de Castro
Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina de Valença ⦁ Residência médica em Pediatria pelo Hospital Federal Cardoso Fontes ⦁ Residência médica em Medicina Intensiva Pediátrica pelo Hospital dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro. Mestra em Saúde Materno-Infantil (UFF) ⦁ Doutora em Medicina (UERJ) ⦁ Aperfeiçoamento em neurointensivismo (IDOR) ⦁ Médica da Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (HUPE) da UERJ ⦁ Professora adjunta de pediatria do curso de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques ⦁ Membro da Rede Brasileira de Pesquisa em Pediatria do IDOR no Rio de Janeiro ⦁ Acompanhou as UTI Pediátrica e Cardíaca do Hospital for Sick Children (Sick Kids) em Toronto, Canadá, supervisionada pelo Dr. Peter Cox ⦁ Membro da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) ⦁ Membro do comitê de sedação, analgesia e delirium da AMIB e da Sociedade Latino-Americana de Cuidados Intensivos Pediátricos (SLACIP) ⦁ Membro da diretoria da American Delirium Society (ADS) ⦁ Coordenadora e cofundadora do Latin American Delirium Special Interest Group (LADIG) ⦁ Membro de apoio da Society for Pediatric Sedation (SPS) ⦁ Consultora de sono infantil e de amamentação ⦁ Instagram: @draroberta_pediatra
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