A sedação paliativa é uma prática clínica presente nos cuidados de fim de vida, utilizada para aliviar o sofrimento secundário à refratariedade de sintomas em pacientes com doenças avançadas ou em processo ativo de morte. Apesar da sua crescente adoção, a variabilidade nas diretrizes clínicas e na aplicação prática ainda gera incertezas entre profissionais de saúde. A definição de sedação paliativa mais amplamente aceita, segundo a European Association for Palliative Care (EAPC), descreve como: “uso monitorado de medicamentos para induzir um estado de consciência reduzida, com o objetivo de aliviar sofrimento intolerável e refratário”.
Fisiopatologia do sofrimento refratário e da sedação paliativa
Pacientes em cuidados paliativos podem apresentar sintomas refratários que comprometem a qualidade de vida mesmo após medidas convencionais. Esses sintomas — como dispneia, dor intratável, agitação ou delirium — decorrem de mecanismos fisiopatológicos complexos e multifatoriais, incluindo alterações neurológicas, inflamatórias e metabólicas. A sedação atua principalmente no sistema nervoso central, induzindo redução da consciência com objetivo de aliviar o sofrimento, por meio de agonismo GABAérgico (no caso das benzodiazepinas), antagonismo dopaminérgico (neurolépticos) ou depressão cortical (barbitúricos e anestésicos).
Modalidades
– Sedação intermitente vs. contínua – primeira escolha deve ser a intermitente!
– Superficial vs. profunda
– Proporcional vs. terminal
Indicações clínicas e diagnóstico de sintomas refratários
Os sintomas mais frequentemente citados como indicativos de sedação incluem:
– Dispneia refratária
– Dor intratável
– Delirium/agitação
– Náuseas e vômitos
– Crises convulsivas ou mioclonias
– Hemorragias
A dificuldade está em diferenciar sofrimento refratário verdadeiro de sintomas mal manejados ou de causas reversíveis. A avaliação deve ser multiprofissional, e é altamente recomendada a análise conjunta com equipe de cuidados paliativos.
Tratamento e medicamentos utilizados
O midazolam é apontado como droga de primeira linha, porém possuímos outras medicações que podem ser úteis no processo.
Medicamento |
Classe |
Dose |
Observação |
Midazolam |
Benzodiazepínico |
0,5-5mg/h IV ou SC | Titulação rápida, curta ação. Risco: reação paradoxal. |
Levomepromazina | Neuroléptico | 12,5–25 mg SC | Útil para sintomas múltiplos, efeito nos casos de delirium |
Propofol |
Hipnótico | 0,3–2 mg/kg/h IV | Requer monitorização intensiva por maior risco de depressão respiratória |
Fenobarbital | Barbitúrico | 100–200 mg/dia SC | Uso mais raro, útil quando hipertensão intracraniana ou convulsão associada. Mais efeitos adversos de náuseas / vômitos |
Importante: Opioides não devem ser utilizados com objetivo sedativo, devido à imprevisibilidade de resposta!
A dexmedetomidina é mencionada pontualmente em algumas diretrizes como opção alternativa para sedação paliativa, especialmente em ambientes com monitorização intensiva. Seu uso, no entanto, ainda é restrito devido ao risco de bradicardia e hipotensão, e não é considerado de primeira linha.
A partir da sedação, escalas como RASS-PAL podem ser utilizadas como forma de monitorização.
Riscos:
– Depressão respiratória e circulatória
– Perda de comunicação e autonomia
– Efeitos adversos inerentes à medicação
Desafios éticos e legais
A sedação profunda contínua até a morte gera debate ético. A maioria das diretrizes distingue entre intenção de aliviar sofrimento e intenção de abreviar a vida. Deve-se levar em consideração ainda que sintomas como a dispneia podem gerar um cansaço importante no paciente, a partir de uso excessivo de musculatura diafragmática e acessória, gerando um processo que pode piorar a condição atual.
Segundo Klein et al., apenas 5 diretrizes aceitaram sofrimento existencial como indicação isolada para sedação, e a maioria exigia condições excepcionais ou segunda opinião ética. É importante ressaltar que o sofrimento da equipe de saúde ou da família não são indicações de início da sedação paliativa, e sempre deve-se avaliar sobre manejo eficaz dos sintomas e medicações que estão sendo utilizadas para tal.
Mensagens para casa
– Tem como objetivo aliviar o sofrimento gerado por condições clínicas refratárias.
– Midazolam é o fármaco de escolha.
– Monitoramento clínico rigoroso deve ser realizado em todos os casos.
– A indicação deve ser fundamentada em avaliação multiprofissional e com documentação formal.
– Nunca se deve utilizar opioides para sedação paliativa.
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