Logotipo Afya
Anúncio
Terapia Intensiva5 agosto 2025

O uso de bloqueio neuromuscular na UTI

BNMs na UTI: uso criterioso em intubação, SARA e TTM. Monitoramento objetivo é essencial para evitar bloqueio residual e eventos adversos.
Por Julia Vargas

Os bloqueadores neuromusculares (BNMs) têm indicações específicas na unidade de terapia intensiva (UTI), sendo mais frequentemente utilizados para facilitar a intubação orotraqueal, otimizar a ventilação mecânica em situações de grave desconforto respiratório, controlar a assincronia paciente-ventilador e suprimir tremores em pacientes submetidos à terapia de controle de temperatura (TTM) após parada cardíaca. 

Na intubação de pacientes críticos, as diretrizes recomendam fortemente o uso de BNMs em combinação com agentes sedativos para aumentar a taxa de sucesso da primeira tentativa e reduzir complicações. 

A heterogeneidade dos pacientes críticos — com sepse, disfunção orgânica múltipla e uso concomitante de muitos fármacos — altera significativamente a farmacocinética e a farmacodinâmica dos BNM. 

Além disso, há crescente ênfase no monitoramento objetivo do bloqueio neuromuscular, dada a preocupação com bloqueio residual e eventos adversos. 

Entre os riscos associados ao uso de BNMs na UTI estão a fraqueza muscular adquirida, prolongamento do bloqueio neuromuscular, atrofia muscular por desuso e, em casos de TTM, risco aumentado de convulsões não reconhecidas devido à supressão dos sinais motores. 

bloqueio neuromuscular

Farmacologia dos BNM 

  1. Despolarizantes 
  • Succinilcolina: ação rápida e curta. 
  • Usada em intubação de sequência rápida (ISR). 
  • Efeitos adversos: hiperpotassemia, hipertermia maligna, aumento de PIO/PIA/PIC. 
  • Contraindicada em lesões neuromusculares, queimados e pacientes críticos com upregulation de receptores nicotínicos. 

 

  1. Não-despolarizantes 
  • Aminosteroides: rocurônio, vecurônio, pancurônio. 
  • Rocurônio é alternativa à succinilcolina para ISR. 
  • Efeitos vagolíticos mais marcados com pancurônio. 
  • Metabolismo hepático e excreção renal — risco de acumulação em falência orgânica. 
  • Benzoilisoquinolinas: atracúrio, cisatracúrio, mivacúrio. 
  • Atracúrio e cisatracúrio sofrem eliminação por degradação de Hofmann e esterases plasmáticas — menos dependentes de função hepática/renal. 
  • Cisatracúrio associado a menor liberação de histamina e potencial efeito anti-inflamatório em SARA. 

Monitoramento do Bloqueio Neuromuscular 

  • Monitoramento clínico isolado é pouco confiável na UTI. 
  • Métodos qualitativos: TOF (Train-of-Four) por estimulação nervosa periférica. 
  • Métodos quantitativos: 
  • Aceleromiografia (AMG), eletromiografia (EMG), mecanomiografia (MMG). 

A SCCM recomenda usar TOF como parte de uma avaliação multimodal. 

 

Agentes de Reversão 

  • Anticolinesterásicos (neostigmina, edrofônio, piridostigmina): 
  • Aumentam acetilcolina para competir com BNM. 
  • Limitados em bloqueios profundos. 
  • Associados a efeitos muscarínicos — requerem anticolinérgicos (atropina, glicopirrolato). 
  • Sugamadex: 
  • Liga-se especificamente a rocurônio e vecurônio. 
  • Reversão rápida e previsível, até mesmo de bloqueio profundo. 
  • Dose: 2 mg/kg para bloqueio moderado, 4 mg/kg para profundo, até 16 mg/kg para reversão de emergência. 

 

Populações Especiais 

  • Disfunção hepática/renal: 
  • Preferir atracúrio/cisatracúrio (eliminação independente). 
  • Aminosteroides têm meia-vida prolongada. 
  • Obesidade: 
  • Doses calculadas por peso ideal ou peso ajustado. 
  • Pancurônio deve ser evitado em obesos mórbidos. 
  • Sugamadex: possível subdosagem se baseado apenas no peso ideal. 
  • Distúrbios ácido-base e eletrólitos: 
  • Acidose potencia bloqueio de não-despolarizantes. 
  • Alcalose o diminui. 
  • Succinilcolina tem padrão oposto. 

 

Situações Clínicas Específicas 

  1. SARA/ARDS 
  • Dados conflitantes: 
  • Estudo ACURASYS mostrou benefício com cisatracúrio em infusão contínua por 48 h. 
  • PETAL/ROSE não confirmou redução de mortalidade. 
  • Meta-análises apontam melhora na oxigenação e redução de barotrauma, sem impacto consistente em mortalidade em 90 dias. 
  • Sugere-se uso restrito: 
  • Pacientes com SARA moderada a grave (PaO2/FiO2 <150). 
  • Preferencialmente até 48 horas. 
  • Foco em reduzir assincronia paciente-ventilador. 

 

  1. Pressão intracraniana elevada 
  • Evidência limitada e heterogênea. 
  • Atracúrio e cisatracúrio potencialmente seguros; succinilcolina pode aumentar a PIC. 

 

  1. Hipertensão intra-abdominal (HIA) 
  • BNM podem reduzir a pressão abdominal ao relaxar musculatura. 
  • Uso recomendado como medida temporária em HIA refratária. 

 

  1. ISR (Intubação de Sequência Rápida) 
  • Succinilcolina (1–1.2 mg/kg) ou rocurônio (1–1.2 mg/kg). 
  • Rocurônio preferível quando risco de hiperpotassemia ou hipertermia maligna. 
  • Em falha de intubação, sugamadex 16 mg/kg permite reversão imediata de rocurônio. 

Conclusões  

Uso de BNM na UTI deve ser individualizado, considerando comorbidades, farmacocinética e farmacodinâmica. O monitoramento objetivo é fundamental para reduzir bloqueio residual e mais estudos são necessários para definir protocolos padronizados para a UTI. 

Saiba mais: Bloqueio neuromuscular: Qual é seu efeito no índice biespectral em crianças graves?

Como você avalia este conteúdo?

Sua opinião ajudará outros médicos a encontrar conteúdos mais relevantes.

Compartilhar artigo

Referências bibliográficas

Newsletter

Aproveite o benefício de manter-se atualizado sem esforço.

Anúncio

Leia também em Terapia Intensiva