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Terapia Intensiva5 outubro 2024

O que os especialistas em UTI precisam saber sobre transfusões de plaquetas

A transfusão de plaquetas é uma prática comum para prevenir ou tratar episódios de sangramento em pacientes com trombocitopenia à admissão na UTI.
Por Julia Vargas

Você sabia que a presença de trombocitopenia à admissão na UTI está relacionada ao aumento de mortalidade? A transfusão de plaquetas é uma prática comum para prevenir ou tratar episódios de sangramento nesses pacientes, embora os benefícios dessa abordagem nem sempre sejam claros e possam estar associados a alguns riscos potenciais. 

Veja agora algumas informações que você precisa conhecer: 

transfusão de plaquetas

Fabricação e armazenamento 

Os concentrados de plaquetas são obtidos de duas formas: a partir de doações de sangue total, onde as plaquetas de várias doações são agrupadas, ou por aférese de um único doador. As plaquetas são armazenadas em temperatura ambiente, assim, o tempo de armazenamento é curto, durando entre 5 a 7 dias, o que aumenta o risco de escassez ou desperdício. Assim, formas alternativas de preservação estão sendo desenvolvidas como armazenamento com frio (duração de 14 dias) ou liofilizadas (duração de 3 anos, mas disponível apenas em pesquisas ou zonas de combate).  

A fabricação e o armazenamento induzem o acúmulo de substâncias bioativas e micropartículas que podem provocar reações pró-inflamatórias. O aumento do tempo de armazenamento pode comprometer a eficácia da transfusão, resultando em incrementos menores na contagem de plaquetas pós-transfusão. 

Indicações e dose  

As diretrizes europeias atuais recomendam a realização de transfusões profiláticas de plaquetas (quando não há sangramento ativo) apenas quando sua contagem cai para abaixo de 10.000/µL em pacientes críticos. A transfusão terapêutica está indicada para tratar sangramentos ativos associados à trombocitopenia, especialmente em pacientes com contagem de plaquetas < 50.000/µL. 

Existe uma variação na dose de plaquetas utilizada. Estratégias de baixa dose (1,1×10¹¹/m² de área de superfície corporal) e intermediária (2,2×10¹¹/m²) resultam em menores incrementos pós-transfusão em comparação com altas doses (4,4×10¹¹/m²), mas essa diferença não teve impacto significativo na incidência de sangramentos. Por outro lado, doses mais baixas acabaram aumentando a frequência da realização de  transfusões. 

Resposta e resistência 

O incremento na plaquetometria pós-transfusão é utilizado para avaliar a eficácia da transfusão de plaquetas. Na prática, essa resposta é geralmente medida pelo aumento absoluto da contagem de plaquetas. O incremento alcançado com concentrado/pool de plaquetas (em dose apropriada) ou aférese de plaquetas é semelhante. Consideramos insatisfatório um incremento inferior a 15.000/µL dentro de 24 horas após a transfusão. Essa situação é comum na UTI, especialmente em pacientes com doenças hematológicas malignas e sepse.  

O maior tempo de armazenamento das plaquetas reduz a elevação da plaquetometria após a transfusão. A resistência às transfusões de plaquetas também pode indicar a presença de anticorpos anti-antígenos leucocitários humanos (HLA). Esses anticorpos devem sempre ser pesquisados nessa situação. Se o teste para esses anticorpos for positivo, o uso de concentrados de plaquetas HLA-compatíveis é indicado. Nesses pacientes o uso de transfusões deve ser mais restrito. 

Veja também: Quando fazer transfusão sanguínea em cuidados paliativos?

Profilaxia para procedimentos invasivos 

A presença de plaquetopenia (déficit quantitativo), não necessariamente aumenta o risco de sangramento, se houver um funcionamento adequado das plaquetas (ausência de déficit qualitativo). Assim, mesmo na presença de plaquetopenia, a transfusão profilática pode não ser necessária em todos os procedimentos invasivos.  

Um estudo recente 4, comparou uma estratégia de transfusão profilática de 1 unidade de concentrado de plaquetas versus não realizar transfusão, em pacientes com plaquetas entre 10 a 50 mil /µL, antes de serem submetidos a passagem de cateter venoso central (CVC). Essa faixa de plaquetometria representa um gap nos principais guidelines, onde não há recomendação formal a favor ou contra o uso de transfusões. A estratégia de “não-transfusão” levou a ocorrência de significativamente mais sangramentos. No entanto, ocorreu significativamente mais sangramentos em pacientes hematológicos e naqueles submetidos a colocação de cateter tunelizados. No trabalho, aproximadamente 50% dos pacientes apresentavam leucemia, condição associada a alto índice de sangramentos.  

Assim, no contexto da passagem de CVC, os autores sugeriram uma estratégia de transfusão de plaquetas em pacientes hematológicos, com plaquetas < 30 mil/µL. Por outro lado, em pacientes críticos, foi sugerido uma estratégia de não transfusão (na presença de plaquetas > 10 mil /µL), com vigilância intensiva e administração de plaquetas apenas se ocorrer sangramento clinicamente significativo.     

Análises de subgrupo indicaram que a transfusão de plaquetas não reduz o risco de sangramento em pacientes de UTI ou durante a inserção de cateter venoso central (CVC) em veias compressíveis como jugular e femoral. No entanto, quando o procedimento envolve o uso da veia subclávia, a transfusão de plaquetas antes do procedimento, pois o sítio não é facilmente compressível.  

Transfusão de Plaquetas no Trauma 

No trauma, a administração precoce de plaquetas foi associada a uma melhora na hemostasia e a uma redução na mortalidade. O benefício das transfusões precoces (< 6 h) de plaquetas na mortalidade de pacientes com trauma e sangramento grave também foi encontrado em um grande estudo observacional multicêntrico. 

Complicações 

As transfusões de plaquetas também têm sido associadas a infecções adquiridas na UTI e a outros efeitos colaterais pulmonares como sobrecarga cardíaca associada à transfusão (TACO) e lesão pulmonar aguda associada à transfusão (TRALI). No contexto de microangiopatias trombóticas, a transfusão de plaquetas pode exacerbar o processo trombótico e tem sido associada a trombose arterial, piora clínica e morte súbita. 

A transfusão de plaquetas não deve ser realizada para reversão de agentes antiplaquetários. Trabalhos já demonstraram que essa prática não melhora os desfechos de pacientes com TCE ou pacientes com AVC hemorrágico. 

Conclusão e Aplicação prática 

A indicação de transfusão de plaquetas em pacientes críticos não deve ser realizada apenas baseada na contagem de plaquetas. Conhecer bem as características deste hemocomponente pode ajudar o médico a tomar decisões mais assertivas e individualizadas, levando em consideração o contexto clínico, o risco de sangramento, a causa da trombocitopenia e o tipo de procedimento que será realizado. 

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Referências bibliográficas

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