Esforço inspiratório e drive respiratório são conceitos distintos, porém inter-relacionados:
- Drive respiratório = comando neural originado nos centros respiratórios do tronco encefálico, influenciado por quimiorreceptores, mecanorreceptores e fatores voluntários.
- Esforço inspiratório = contração muscular gerada em resposta a esse drive.
Na UTI, o drive pode estar anormalmente alto ou baixo por causas como acidose metabólica, hipoxemia, sedação, colapso alveolar ou inflamação.
O drive elevado pode causar sobredistensão alveolar (pressão transpulmonar excessiva), efeito pendelluft, edema pulmonar induzido por pressão negativa e P-SILI (Patient Self-Inflicted Lung Injury).
Quando o paciente apresenta esforço insuficiente, pode ocorrer disfunção diafragmática e assincronia paciente-ventilador. Ambas as situações estão associadas a desfechos piores (incluindo maior mortalidade em 90 dias).
Em condições normais, a relação entre drive e esforço é proporcional, o que leva ao acoplamento neuromuscular.
Em pacientes críticos, esse acoplamento pode se romper (ex.: fraqueza diafragmática), gerando dispneia (drive alto + esforço baixo) ou hipoventilação (drive baixo + esforço insuficiente). Monitorar ambos separadamente ajuda a ajustar suporte ventilatório de forma personalizada.
Principais métodos de monitoramento
- Pressão esofágica (Pes):
- Balão esofágico mede variações de pressão pleural.
- Gold standard para esforço inspiratório.
- Limites típicos: 3–12 cmH₂O.
- Permite calcular:
- Pmus (pressão muscular)
- PTP (Pressure-Time Product)
- Trabalho respiratório (WOB)
- Limitação: invasivo, pouco usado rotineiramente.
2. Atividade elétrica do diafragma (EAdi):
- Cateter esofágico com eletrodos → sinal EMG processado.
- Parâmetro: EAdi_peak.
- Relaciona-se com intensidade do drive.
- Usado com modo NAVA.
- Limitação: necessidade de ventilador específico.
Ferramentas práticas à beira-leito
1) Occlusion maneuvers
- P0.1 (Airway Occlusion Pressure 100ms):
– Queda de pressão nos 100 ms iniciais após oclusão.
– Reflete drive central (componente automático).
– Disponível na maioria dos ventiladores.
– Valores:
- < 1.0 cmH₂O → drive baixo
- 3.0–4.0 cmH₂O → drive elevado
– Vantagem: fácil, não invasivo.
– Limitações: variação entre ventiladores; não mede esforço com precisão, mas o estima.
- Pocc (Occlusion Pressure):
– Esforço durante oclusão expiratória prolongada (2–3 s).
– Correlaciona bem com Pes e Pmus (com fator de correção).
– Mais sensível que P0.1 para detectar esforço excessivo.
– Limitação: desconfortável para o paciente.
- PMI (Pressure-Muscle Index):
– Diferença entre pressão de platô e pico durante oclusão inspiratória.
– PMI > 2–3 cmH₂O → esforço excessivo.
– PMI ≤ 0 cmH₂O → esforço insuficiente.
– Requer ventilador com oclusão inspiratória estável.
2) Análise de curvas do ventilador:
– ACV: concavidade → esforço aumentado.
– PSV: forma da curva de fluxo → concavidade sugere sobreassistência; convexidade indica subassistência.
– Detecção de assincronias (ex.: double triggering).
3) Ultrassom diafragmático:
– Fração de espessamento (TFdi): objetivo 15–35%.
– Limitações: baixa reprodutibilidade, necessidade de treino, fraca correlação com Pmus em algumas situações.
4) Variação de pressão venosa central (ΔCVP):
– Correlaciona bem com a ΔPes quando nota-se oscilações marcadas da PVC com a respiração.
– Simples se cateter já está inserido.
– Influenciado por complacência venosa, status volêmico.
O monitoramento do esforço respiratório é especialmente indicado em quatro contextos clínicos na UTI:
– Em pacientes com insuficiência respiratória aguda (IRA) em respiração espontânea e sem ventilação mecânica, o risco de lesão pulmonar autoinfligida (P-SILI) devido ao esforço descompensado é elevado. Nesses casos, parâmetros como P0.1, ΔPes ou ultrassonografia do diafragma podem ajudar a identificar a necessidade de iniciar ventilação ou intensificar a oxigenoterapia.
– Em pacientes sob ventilação mecânica assistida, mesmo com níveis de suporte adequados, pode haver esforço inspiratório excessivo. O monitoramento permite ajustar a pressão de suporte, detectar precocemente assincronias ou fadiga muscular, além de orientar decisões sobre o uso de sedativos ou bloqueadores neuromusculares.
– Durante o desmame ventilatório, o acompanhamento da evolução do esforço respiratório ajuda a identificar precocemente falência no processo de retirada da ventilação.
– Já em casos de SDRA, o monitoramento é essencial para verificar se o paciente está rompendo a estratégia protetora com esforço elevado, o que pode demandar ajustes no nível de sedação ou indicar a necessidade de bloqueio neuromuscular. Em todos esses cenários, a monitorização contribui para individualizar a assistência ventilatória e prevenir complicações associadas ao esforço respiratório inadequado.
Conclusão
Reconhecer a importância de ajustar suporte ventilatório para evitar esforço excessivo ou insuficiente é função essencial do intensivista, usando a P0.1 rotineiramente como screening de drive e considerar Pocc e PMI para quantificar esforço, quando disponíveis.
Sempre valorizar a análise das curvas do ventilador para detectar assincronias e, principalmente, individualizar a ventilação, prevenindo a P-SILI, evitando disfunção diafragmática para assim melhorar os desfechos.
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