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Terapia Intensiva3 julho 2025

Fibrinolíticos na emergência: Infarto agudo do miocárdio e embolia pulmonar

Entenda o uso de fibrinolíticos no infarto e na embolia pulmonar: indicações, agentes, evidências e riscos no uso na emergência
Por André Japiassú

Os agentes fibrinolíticos são usados em doenças trombóticas, principalmente na fase mais aguda, como acidente vascular encefálico isquêmico (AVEi), infarto agudo do miocárdio (IAM) e tromboembolismo pulmonar (TEP). Eles são serinas proteases, que convertem plasminogênio em plasmina, que atua quebrando a fibrina que forma os trombos. Quanto mais recente o trombo, maior a eficácia dos agentes fibrinolíticos. São dois tipos de agentes: inespecíficos (estreptoquinase) e específicos (alteplase – tPA, tecneteplase – TNK e reteplase – rPA). A estreptoquinase foi o primeiro a ser usado em casos de IAM, e pode causar mais alergias e produção de anticorpos, sendo evitada em um segundo evento trombótico em até 6 meses; também está associada com maior incidência de eventos hemorrágicos. Atualmente, os agentes fibrino-específicos são preconizados na terapia mais aguda das 3 patologias acima citadas. 

Esta segunda parte abordará o uso de fibrinolíticos em pacientes com IAM e TEP na emergência. 

Veja também: Fibrinolíticos na emergência – AVEi

Objetivos e Metodologia: 

A revisão destes autores foi narrativa, mas eles fizeram uma pesquisa bibliográfica semelhante a uma revisão sistemática, procurando artigos nas bases Pubmed e Google Scholar, com termos “trombólise”, “trombolíticos”, “fibrinólise” e as três patologias acima citadas. Todos os artigos incluídos continham 3 critérios: 

  1. Investigação de uma das três doenças – AVEi, IAM e TEP; 
  2. Tratamento primário com fibrinólise; 
  3. Relevância para avaliação e tratamento na emergência. 

Um total de 153 artigos foram selecionados para esta extensa revisão. 

Infarto agudo do miocárdio 

A terapia fibrinolítica é originária do uso de estreptoquinase para pacientes com IAM, há cerca de 70 anos atrás. Ocorre ruptura de placa aterosclerótica com formação de trombos em grandes vasos coronarianos – o tratamento mais eficaz é dissolver o trombo e restabelecer a circulação daquele leito vascular. Reduzir a área de infarto e a disfunção cardíaca oriunda do atordoamento do miocárdio isquêmico são os objetivos da terapia. O uso preciso de fibrinolíticos pode reduzir a mortalidade de forma relativa de 15% a 30%. Idealmente deve ser administrado em até 4 horas, e também evitado após 12 horas, porque aumenta o risco de sangramento e há menor chance de recanalização do vaso. 

Os critérios para tratamento de reperfusão (seja por angioplastia ou fibrinolítico) são: 

  1. Dor torácica típica por mais de 30 minutos e menos de 12 horas; 
  2. Evidência no eletrocardiograma (ECG) de supradesnível do segmento ST em 2 derivações correspondentes na localização de alguma parede; 
  3. Timing: preferir angioplastia percutânea se disponível em até 2 horas OU administrar tPA ou TNK em até 70 minutos. 

A intervenção coronária percutânea (ICP) é o tratamento de primeira linha para IAM, mas os fibrinolíticos são uma alternativa se a ICP não estiver disponível em tempo hábil. Considerado para pacientes com dor no peito por pelo menos 30 minutos, mas menos de 12 horas, e evidência de IAM com supradesnivelamento do segmento ST (STEMI) se a intervenção coronária percutânea (ICP) não estiver disponível em 120 minutos. A idade avançada aumenta o risco de complicações. 

A terapia concomitante com anticoagulantes (heparina de baixo peso molecular) e antiplaquetários (aspirina e/ou clopidogrel) é necessária. Devem ser iniciadas até o dia seguinte de uso de fibrinolíticos, ou mesmo dia se conseguiu realizar angioplastia percutânea. Outras terapias também são necessárias: estatinas de alta potência, beta-bloqueadores, inibidores da enzima de conversão de angiotensina ou bloqueadores de receptores de angiotensina. 

Algumas dúvidas comuns são: idade elevada (acima de 75 anos) e presença de menstruação em mulheres não são contraindicações formais e pode-se usar fibrinolíticos. Os pacientes com choque cardiogênico têm preferência de tratamento invasivo com angioplastia, embora o tratamento medicamentoso não seja contraindicado (preferir somente se não é possível ida para centro com hemodinâmica). A TNK parece ter mesma eficiência que a tPA, mas com discreta redução de chance de sangramento. E mesmo após uma reperfusão com fibrinolíticos, a realização de coronariografia e possível angioplastia continuam sendo necessárias para assegurar redução de reinfarto e mortalidade.  

O sangramento oriundo da terapia com tPA ou TNK tem maior chance em idosos, mulheres, história prévia de AVE, hipertensão não-controlada, indivíduos magros (mulheres abaixo de 65 kg e homens abaixo de 80 kg) e discrasia sanguínea (INR acima de 4). Os sangramentos mais comuns são gastrointestinais  (~ 2%), e menos comum intracraniano (~ 1%). A chance de sangramento moderado é aproximadamente 11%. 

Tromboembolismo pulmonar 

Os fibrinolíticos são recomendados para EP de alto risco (instabilidade hemodinâmica) e podem ser considerados para EP de risco intermediário-alto. A mortalidade nesta população gira em torno de 22% a 32%. 

Os critérios para TEP maciço incluem instabilidade hemodinâmica definida como pressão sistólica abaixo de 90 mmHg por pelo menos 15 minutos ou com necessidade de início de vasopressor ou inotrópico; também queda de mais de 40 mmHg na pressão sistólica por mais de 15 minutos; falta de pulso periférico. O TEP submaciço, ou de risco intermediário inclui estabilidade hemodinâmica mas com presença de disfunção de ventrículo direito no ecocardiograma ou marcadores de necrose miocárdica (troponina elevada). 

A administração de fibrinolíticos no TEP não tem uma janela de tempo bem estabelecida (quanto antes melhor), mas está indicada de forma absoluta nos pacientes de alto risco. O tPA e o TNK são os agentes utilizados, com vários regimes de administração disponíveis: tPA 50 a 100 mg ou 0,6 mg/kg por 2 horas; TNK 0,5 mg/kg em bolus. A TNK tem o mesmo efeito e sucesso e é de administração mais fácil. Alguns estudos com doses bem menores de tPA (25 mg) por mais tempo também sugerem benefício e menor risco de sangramento, sendo talvez opção para casos de TEP submaciço – mas apenas 1 estudo experimental foi realizado (Aykan et al, 2023). Aliás, nem todos os estudos de fibrinólise em TEP submaciço apresentaram benefício de mortalidade, e seu uso é controverso, a depender de disfunção cardíaca e presença de troponina elevada. 

A terapia anticoagulante deve ser retomada logo após a terapia fibrinolítica, e a incidência de sangramentos mais graves parece ser menor que nos casos de AVEi ou IAM. Talvez seja pela característica de trombofilia destes pacientes. Em casos de contraindicação formal à fibrinólise química (que são basicamente as mesmas apresentadas no comentário anterior e acima neste texto), pode se tentar a trombectomia por via percutânea no setor de hemodinâmica ou mesmo trombectomia cirúrgica. A anticoagulação é geralmente interrompida durante a administração de fibrinolíticos para reduzir o risco de sangramento. 

A eficácia da trombólise no TEP é mais debatida que nos casos de IAM e AVEi. Como os estudos são menores, foram 2 meta-análises (Zuo – Cochrane 2021, com 21 estudos; e Stevens – Chest 2021, com 29 trabalhos) e  que demonstraram redução de mortalidade hospitalar (cerca de redução relativa de 40%), redução de recorrência de embolia (~ 50%) porém maior incidência de sangramento grave (quase dobrando a chance em relação à anticoagulação plena). O aspecto mais surpreendente é que apenas um terço dos casos de TEP com indicação formal de fibrinolíticos recebem a terapia, e vem caindo ao longo dos últimos anos (queda de 1,5% de todos os casos de TEP entre 2018 e 2023 (Gottlieb et al, 2024). 

Mensagens para o dia-a-dia: 

  • O papel dos fibrinolíticos no IAM está bem estabelecido: o melhor é ter a chance de angioplastia percutânea, mas se não houver no centro ou for distante/demorada, usar agentes fibrinolíticos fibrina-específicos preferencialmente em até 70 minutos; 
  • Além de fibrinolíticos, o paciente com IAM deve receber anticoagulantes, antiplaquetários e estatina como adjuvantes, e o paciente ainda deve ser encaminhado para o setor de hemodinâmica para o tratamento definitivo de uma lesão coronariana estenosante; 
  • Na embolia pulmonar, deve ser usada como primeira linha de tratamento em casos de TEP maciço (alto risco) e é duvidosa em casos de disfunção de ventrículo direito sem choque. 

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Referências bibliográficas

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