O artigo publicado no The New England Journal of Medicine (2025), aborda de modo abrangente a doença hepática esteatótica associada à disfunção metabólica (MASLD), uma condição clínica redefinida recentemente e que apresenta evolução do conceito de doença hepática não alcoólica (NAFLD). A mudança dessa nomenclatura reflete crescentes estudos e evidências de que a disfunção metabólica é o determinante na fisiopatologia e progressão da doença, não mais (quando considerada de forma isolada) a presença de gordura no fígado. Desse modo, MASLD deve ser compreendida como uma doença multissêmica, cujas repercussões podem se estender para o sistema cardiovascular, renal e metabólico.
Sob esse viés, o estudo escancara a carga global da MASLD, a doença hepática mais prevalente no mundo, acometendo 38% da população adulta. Em populações específicas, como na diabetes tipo 2, a prevalência chega a 65%, com até 32% evoluindo para MASH (esteato-hepatite associada à disfunção metabólica). Desse modo, os riscos associados à progressão da doença incluem desde cirrose e carcinoma hepatocelular, até eventos cardiovasculares, diabetes, insuficiência cardíaca, fibrilação atrial, doença renal crônica e alguns cânceres extra-hepáticos, especialmente gastrointestinais.
Nessa perspectiva, o risco relativo de novos desfechos clínicos adversos para indivíduos com MASLD mostram aumentos expressivos: 2,2 vezes maior para diabéticos tipo 2, 1,5 vezes para eventos cardiológicos fatais e não fatais, 1,5 vezes para cirrose ou carcinoma hepatocelular. Esses dados representam a urgência na identificação precoce dos indivíduos em grupos de riscos, nos quais são aplicadas ferramentas não invasivas como o escore FIB-4 e exames de elastografia, com estratificações adequadas (risco baixo, intermediário e alto risco).
Outrossim, nos casos de MASLD observa-se o acúmulo de gordura hepática estável na maioria dos pacientes, dentre os quais 30% costumam evoluir para MASH, uma condição caracterizada pela inflamação hepática e fibrose acelerada. Nesses casos, o fator mais determinante de evolução consiste na soma de características da síndrome metabólica – diabetes, obesidade, hipertensão, dislipidemias e resistência à insulina. Outros fatores são condições genéticas (variantes dos genes PNPLA3, TM6SF2 e APOB), dieta rica em frutose e gordura saturada, além de desequilíbrios da microbiota intestinal, o que modulam o risco individual de cada paciente.
Outrossim, o artigo discute acerca das novas terapias farmacológicas. Os guidelines recentes recomendavam a modificação intensa do estilo de vida com perda de peso sustentada visando um bom prognóstico a logo prazo, sendo capaz de reverter a fibrose em alguns casos. Entretanto, as taxas de insucesso abriram espaço para terapias direcionadas que ganharam espaço na sociedade. Resmetirom, Semaglutida, Tizerpatida e Survodutide são exemplos da nova fronteira terapêutica, no qual o tratamento da MASLD vai além do fígado e alcança o manejo integrado de diversas comorbidades metabólicas. Assim, os autores do estudo defendem que os fármacos desenvolvidos devem ser avaliados não simplesmente pela sua capacidade de melhora na histologia hepática de forma isolada, mas também pela sua influência em demais esferas, como a melhora em desfechos clínicos cardiovasculares, renais, oncológicos e metabólicos de forma geral
Portanto, a MASLD representa um desafio contemporâneo para a saúde pública global, exigindo estratégias diagnósticas precoces, acompanhamento integrado e novas abordagens terapêuticas. O artigo em questão sustenta que a luta contra essa condição passa pela união ente mudança dos hábitos de vida, inovação farmacológica e políticas publicas assistenciais de saúde, as quais devem reconhecer a natureza multissêmica da patologia e o expressivo impacto econômico que correlacionado ao seu tratamento nos serviços públicos de saúde.
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