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Terapia Intensiva24 abril 2025

COMIN 2025 - Alvos de hemoglobina no neurocrítico

A prática clínica tem adotado níveis baixos de hemoglobina para pacientes críticos em geral, incluindo aqueles com lesão cerebral. 
Por Julia Vargas

Desde 1999, a prática clínica tem adotado níveis baixos de hemoglobina (cerca de 7 g/dL) para pacientes críticos em geral, incluindo aqueles com lesão cerebral. 

A questão central, discutida no Congresso Brasileiro de Medicina Intensiva Neurológica (COMIN 2025), pelas Dra. Cassia Righy, do Rio de Janeiro, e Dra Carla Rynkowski, de Porto Alegre, é se esse nível restritivo é seguro para pacientes com lesão cerebral ou se um nível mais alto seria necessário. 

Essa dúvida motivou diversos estudos internacionais, especialmente a partir de 2004, com ensaios clínicos randomizados publicados em revistas de grande impacto. 

Foram destacados três grandes ensaios clínicos que investigaram estratégias liberais (manter hemoglobina em torno de 10 g/dL) versus restritivas (manter em torno de 7 g/dL) em pacientes com lesão cerebral grave. 

Estudo 1: Estudo Hemotion 

  • Incluiu 742 pacientes com TCE grave, predominantemente homens de 48 anos, com colisão automobilística como principal causa. Participaram 34 centros de vários países, incluindo Brasil. 
  • Grupo liberal teve meta de hemoglobina 10 g/dL, grupo restritivo meta de 7 g/dL; na prática, o grupo restritivo ficou próximo de 8 g/dL. 
  • Desfecho primário foi o pior resultado funcional em 6 meses medido pelo escore GOS- estendido (3, 4 e 5). 
  • Não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos, embora numericamente o grupo restritivo tenha mostrado tendência a pior desfecho funcional. 

Estudo 2: Estudo SAHARA 

  • Também incluiu 742 pacientes, maioria mulheres (80%), média de idade 59 anos, com HSA aneurismático tratado em 1 dia em 60% dos casos. Participaram centros do Canadá, Austrália, Estados Unidos e Portugal. 
  • Meta do grupo liberal era hemoglobina 10 g/dL e do restritivo 8 g/dL; na prática, o grupo restritivo ficou próximo de 9 g/dL. 
  • Desfecho principal foi o pior resultado funcional, medido por escala onde menor valor indica pior desfecho. 
  • Não houve diferença estatística significativa entre os grupos, embora o grupo restritivo tenha tido um desfecho levemente pior. 

Estudo 3: Estudo TRAIN 

  • Incluiu 850 pacientes randomizados de 72 centros em 22 países, com participação importante do Brasil. Pacientes tinham média de 50 anos, 55% homens, com lesões como TCE (60%), AVC hemorrágico e hematoma intracerebral. 
  • Alta gravidade dos casos, com Glasgow médio de 4, 70% com pupilas fotoreagentes e 90% em ventilação mecânica. 
  • Meta do grupo liberal era hemoglobina 9 g/dL e do restritivo 7 g/dL; na prática, o grupo restritivo ficou um pouco acima de 7 g/dL. 
  • Desfecho primário foi o pior resultado funcional no escore GOS-estendido. 
  • Não houve diferença significativa entre os grupos em desfecho funcional, tempo de sobrevida, balanço hídrico ou complicações, porém observou-se que o grupo restritivo teve maior proporção de desfechos ruins (72%) comparado ao liberal (62%), com significância estatística. 

Conclusões Gerais 

Os três grandes ensaios não mostraram diferenças claras entre estratégias liberal e restritiva quanto ao desfecho funcional na maioria dos casos. O estudo TRAIN foi o único que mostrou diferença estatisticamente significativa, favorecendo a estratégia liberal com hemoglobina em torno de 9 g/dL para pacientes com TCE, HSA e AVC hemorrágico. 

O estudo TRAIN foi considerado mais representativo da realidade brasileira e de países de baixa renda, pois incluiu maior proporção desses pacientes. A adoção da estratégia liberal pode ser mais adequada para a população local, considerando a gravidade dos pacientes e recursos disponíveis. Desafios futuros incluem replicar esses estudos na prática clínica local para validar os achados e ajustar protocolos de transfusão. 

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