A pneumonia associada à ventilação (PAV) é uma complicação comum em unidades de terapia intensiva (UTI). Contribui para maior morbidade, tempo de permanência e custos. É possível que a PAV eleve a mortalidade em cerca de 10% acima da mortalidade pela doença de base (que define como mortalidade atribuída). Desafios para a prevenção de PAV se mantêm, como a microaspiração, formação de biofilme no tubo e penetração limitada de antibióticos sistêmicos nas vias aéreas. Portanto, antibióticos inalados surgiram como uma estratégia profilática potencial, atingindo níveis mais altos nas secreções traqueais. No entanto, sua eficácia tem sido considerada incerta para a prevenção desta infecção. Além disso, a administração inalatória ou nebulizada de antibióticos não é trivial, carece de dispositivos específicos e sincronização com o ventilador mecânico, de modo que sua indicação precisa estar bem clara para ser custo-efetiva.
Objetivos e Metodologia
Os autores realizaram uma revisão sistemática através de pesquisa em múltiplas bases de dados, procurando estudos publicados até novembro de 2024, usando termos específicos como antibióticos inalados ou nebulizador, prevenção e pneumonia associada à ventilação mecânica. Foram incluídos apenas textos completos que avaliaram a inalação de antibióticos na prevenção da PAV (ou seja, administração antes do início dos sinais clínicos de PAV); então os estudos que administraram antibióticos inalados para tratamento precoce ou presuntivo de PAV foram excluídos. De mais de 4 mil referências encontradas, 10 foram incluídos e analisados. Dados de incidência e mortalidade, além de estatísticas descritivas, classe de antibiótico, método de administração e tipo de população da UTI, foram selecionados.
Resultados
Um primeiro problema para a meta-análise foi a definição heterogênea de PAV entre os estudos, que geralmente se baseia em critérios clínicos. É reconhecido que existe variabilidade entre médicos para o diagnóstico de PAV, com discordância de 33%. Outra limitação é a variação de tratamentos, que foram desde aminoglicosídeos, passando por cefalosporinas até polimixinas. De modo geral, o tratamento foi orientado contra bactérias Gram-negativas. Polimixinas foram usadas em UTIs com alta prevalência de MDR, aminoglicosídeos foram os mais frequentes e cefalosporinas em UTIs focadas em trauma.
- Dez estudos, totalizando 2876 pacientes, foram incluídos na meta-análise. O uso de antibióticos inalados reduziu significativamente a incidência de PAV: redução de risco relativo (RR) de 33%, com intervalo de confiança entre 23% e 42%; p<0,001. No entanto, não houve efeito significativo na mortalidade (RR=0,92; IC 95%: 0,79-1,06; p=0,25).
- Dois estudos tiveram maior peso na análise: Rouby 1994 com 36% e Ehrmann 2023 com 22%. O estudo de Rouby teve o maior peso na redução da PAV, enquanto o de Ehrmann teve o maior peso na análise de mortalidade. Observou-se heterogeneidade moderada para a incidência de PAV (I²=46,8% – lembrando que o ideal é abaixo de 10%). Já para a mortalidade, a heterogeneidade foi de 0%, indicando homogeneidade. A análise de “Leave-One-Out” – retirada de um único estudo e nova análise para checar a influência nos resultados – mostrou que a omissão de qualquer estudo individual não alterou significativamente as razões de risco combinadas para incidência de PAV ou mortalidade, confirmando as conclusões. Mas o gráfico de funil para incidência de PAV se apresentou assimétrico, sugerindo algum viés de publicação, embora quase todos os estudos tenham permanecido dentro de intervalos de significância estatística.
Mensagens para o dia-a-dia:
- Antibióticos inalados ou nebulizados podem ser uma ferramenta de prevenção de PAV no doente crítico na UTI – os esquemas antibióticos são variados e seus efeitos podem diferir entre subpopulações específicas;
- A redução de PAV é de cerca de 33% de forma relativa, quando comparada ao controle (salina ou água estéril);
- No entanto, a mortalidade na UTI não é alterada, o que também ocorre com outras estratégias de prevenção, como cabeceira elevada e higiene oral;
- A conclusão é que o grau de certeza dos resultados da meta-análise é moderada, sendo maior para a ausência de efeito na mortalidade e talvez menor para a prevenção da infecção.
Veja também: Tratamento de pneumonia: terapias adjuvantes
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