Abordagem terapêutica na sepse grave: o que você precisa saber
Na sepse grave, o tempo de início do tratamento pode afetar o desfecho do paciente. Para uma tomada de decisão mais rápida, separamos aqui tudo que você precisa saber sobre a abordagem terapêutica.
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1) Abordagem Inicial:
No diagnóstico inicial de sepse grave, deve-se administrar 30 ml/kg de cristaloide. A seguir, reavalie o paciente continuamente quanto à necessidade de novo bolus frente à perfusão hemodinâmica.
Ressuscitação Inicial (primeiras 6 horas): Comece imediatamente a reanimação em pacientes com hipotensão ou elevação do lactato > 4 mmol/L (não aguardar internação no CTI).
Objetivos de reanimação:
• Pressão venosa central (PVC) 8-12 mm Hg (considerar de 12-15 mmHg na presença de ventilação mecânica ou complacência ventricular diminuída);
• Pressão arterial média (PAM) ≥ 65 mmHg;
• Débito urinário ≥ 0,5 mL/kg/hora;
Saturação central de oxigênio venoso (SvO ) ≥ 70%, ou venosa mista ≥ 65%;
Curva de lactato, com alvo de normalização como indicador de boa perfusão tecidual.
Caso o paciente mantenha sinais de má perfusão, considere:
– Considerar mais fluido – utilize respostas dinâmicas para prever resposta à infusão de volume, como variação da PVC, deltaPP e elevação passiva das pernas;
– Dobutamina está indicada no paciente com volemia normal, em uso de vasopressores, cuja perfusão continue inadequada (infusão máxima 20 mcg/kg/min).
2) Antibioticoterapia:
• Iniciar antibioticoterapia intravenosa o mais precoce possível (idealmente na primeira hora a partir da suspeita diagnóstica);
• Escolher antibióticos de amplo espectro com cobertura apropriada e boa penetração no sítio de infecção;
• Reavaliar diariamente o esquema antibiótico, otimizando eficácia, prevenindo resistência, evitando toxicidade e minimizando custo;
• Utilizar-se de marcadores como a procalcitonina (ainda controverso) para a descontinuação da antibioticoterapia empírica em pacientes inicialmente com suspeita de sepse sem evidência de infecção subsequente;
• Considerar terapia combinada em infecções por Pseudomonas ou Acinetobacter, em pacientes neutropênicos e em pacientes com infecções graves, associadas a choque séptico e falência respiratória;
• Não manter terapia empírica combinada por mais do que 3 a 5 dias e trocar por antibiótico mais específico seguindo perfil de sensibilidade do antibiograma;
• Duração do tratamento, em geral, por 7 a 10 dias: prolongar apenas se resposta lenta, foco não drenado, deficiência imunológica ou infecção por determinados fungos e vírus;
• Interromper imediatamente antibioticoterapia se for constatada causa não infecciosa.
3) Identificação e controle do sítio de infecção:
• Estabelecer o quanto antes o sítio de infecção e abordá-lo;
• Avaliar paciente a procura de foco de infecção passível de medidas de controle (por exemplo: drenagem de abscessos, debridamento tecidual, descompressão de via biliar);
• Implementar medidas de controle imediatamente após ressuscitação inicial: com exceção de necrose pancreática infectada, em que se deve aguardar para procedimento cirúrgico;
• Escolher medidas de controle com máxima eficácia e mínimo comprometimento fisiológico;
• Remover acessos vasculares potencialmente infectados (após outros acessos vasculares sejam estabelecidos).
Objetivos da ressuscitação inicial:
Completar em 3 horas:
• Medida do lactato inicial;
• Obter hemoculturas (antes de iniciar ATB, idealmente na 1 hora);
• Iniciar ATB empírico;
• Iniciar ressuscitação volêmica com 30 mL/kg de cristaloide para hipotensão ou lactato > 4 mmol/L.
Completar em 6 horas:
• Se hipotensão persistente, apesar de ressuscitação volêmica, iniciar vasopressores para manter PAM > 65 mmHg;
• Em vigência de hipotensão persistente, apesar de ressuscitação volêmica, medir pressão venosa central (PVC) e saturação venosa central de oxigênio (SvO2);
• Medir novo lactato, se primeira medida elevada.
* Objetivos: Manter PVC 8-12 mmHg / SvO2 > 70% / Lactato normal.
4) Ressuscitação Volêmica:
• Ressuscitação volêmica com cristaloides ou coloides (preferencialmente cristaloides);
• PVC alvo 8-12 mmHg (12-15 mmHg se em ventilação mecânica);
• Utilizar a técnica de “prova de volume” (etapa rápida de infusão de volume com reavaliação de resposta hemodinâmica) enquanto houver nítida melhora hemodinâmica: Etapas de 1000 mL de cristaloide ou 300-500 mL de coloide em 30 minutos. Infusões mais rápidas e volumes maiores podem ser necessários em casos de hipoperfusão tecidual (objetivando no mínimo 30 mL/kg de cristaloide ou equivalente em coloide, lembrando que a albumina é preferível em relação aos coloides sintéticos);
• Taxa de infusão deve ser diminuída caso constatada aumento nas pressões de enchimento cardíaco sem melhora hemodinâmica.
5) Vasopressores:
• Manter PAM ≥ 65 mmHg;
• Vasopressor de primeira escolha: Noradrenalina (infusão em acesso venoso central) (Adrenalina, fenilefrina, dopamina ou vasopressina não devem ser administradas como vasopressor inicial no choque séptico);
• Adrenalina é o vasopressor de escolha quando um agente adicional é necessário para manter PAM adequada (em adição ou como potencial substituto da noradrenalina);
• Vasopressina 0,03 U/min pode ser adicionada subsequentemente a noradrenalina, para potencializar efeito ou diminuir dose de noradrenalina (não é recomendada como vasopressor único e doses > 0,03 são recomendadas apenas em casos extremos, refratários a outros vasopressores);
• Dopamina é considerada alternativa em pacientes com baixo risco de taquiarritmias e com bradicardia absoluta ou relativa;
• Não utilizar baixas doses de dopamina para proteção renal;
• Fenilefrina não é recomendada para o tratamento do choque séptico, exceto quando noradrenalina estiver associada a arritmias graves, pacientes com débito cardíaco alto e pressão arterial persistentemente baixa ou como última alternativa;
• Estabelecer monitorização invasiva da pressão arterial o quanto antes.
6) Inotrópicos:
• Dobutamina é o inotrópico de escolha em pacientes com insuficiência cardíaca, evidenciada por aumento nas pressões de enchimento e baixo débito cardíaco;
• Não aumente índice cardíaco acima dos níveis considerados normais;
• Considerar dobutamina quando houver persistência de sinais de má perfusão a despeito de reposição volêmica adequada e uso de vasopressores.
7) Corticoterapia:
• Não utilizar a hidrocortisona venosa para o tratamento do choque séptico em pacientes em que a adequada ressuscitação volêmica e o uso de vasopressores foram suficientes para restaurar a estabilidade hemodinâmica;
• Caso contrário, administrar doses de hidrocortisona venosa de 200 mg/dia;
• Teste de estímulo com ACTH não é recomendadopara avaliação de resposta a hidrocortisona;
• Corticoterapia deve ser gradualmente retirada quando vasopressores não são mais necessários e não deve ser utilizada em pacientes com sepse sem choque, exceto na necessidade de reposição endócrina.
8) Hemotransfusão:
• Concentrado de hemácias: Indicada quando hemoglobina < 7,0 g/dL, estabelecendo como alvo de 7,0-9,0 g/dL em adultos;
• Alvos mais altos de hemoglobina podem ser necessários em circunstâncias especiais (isquemia miocárdica; hipoxemia severa; hemorragia
aguda; cardiopatia congênita cianótica; acidose láctica);
• Não utilizar eritropoietina para tratamento de anemias induzida por sepse, pode ser usada por outras indicações;
• Não utilizar plasma fresco congelado para correção laboratorial da coagulação, exceto na presença de sangramento ativo ou previsto algum procedimento invasivo;
• Não utilizar terapia antitrombina III;
• Concentrado de plaquetas: Indicações:
– ≤ 10000/mm , independente da presença de sangramento;
– ≤ 20000/mm , com risco significativo de sangramento;
– ≥ 50000/mm , em sangramentos ativos ou antes de procedimentos cirúrgicos ou invasivos.
9) Não recomendados:
• Proteína C ativada recombinante (rhAPC): já retirada do mercado;
• Imunoglobulina intravenosa;
• Selênio intravenoso.
10) Ventilação Mecânica:
• Volume corrente alvo de 6 mL/Kg (considerando-se peso ideal);
• Pressão de platô ≤ 30 cmH O (considerar complacência da parede torácica ao estimar o parâmetro);
• Hipercapnia permissiva, se necessário, para manter pressão de platô e volume corrente dentro do desejado;
• Ajustar PEEP para evitar colapso pulmonar no fim da expiração (considerar estratégia com PEEP mais alta em pacientes com SARA);
• Utilizar manobras de recrutamento alveolar em pacientes com hipoxemia refratária;
• Considerar posição prona em pacientes com(P/F ≤ 100 mmHg), contanto que não haja risco na mudança de decúbito;
• Manter pacientes em ventilação mecânica com elevação da cabeceira em 30-45 para prevenir aspiração e desenvolvimento de pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV);
• Quando possível considerar uso de ventilação não invasiva em quadros mais brandos, desde que apresentem critérios de elegibilidade (hemodinamicamente estáveis, confortáveis, facilmente despertos, capazes de proteger vias aéreas e de rápida recuperação) = Minoria dos casos;
• Utilizar protocolo de desmame e teste de respiração espontânea para avaliar a possibilidade de retirada da ventilação mecânica:
– Opções no desmame: CPAP; tubo T;
– Critérios de elegibilidade: paciente despertável, hemodinamicamente estável sem vasopressor, sem nenhuma nova condição potencialmente séria, requer baixos níveis de pressão de suporte e PEEP, requer FiO que pode ser garantida por máscara facial ou cânula nasal.
• Não utilizar cateter de Swan-Ganz de rotina em pacientes com SARA;
• Adotar estratégia de reposição volêmica conservadora em pacientes com lesão pulmonar aguda estabelecida que não apresentam evidências de hipoperfusão;
• Na ausência de indicações específicas (como broncoespasmo), não utilizar beta2-agonistas para o tratamento da SARA.
11) Analgesia, Sedação e Bloqueio neuromuscular:
• Utilizar protocolos de sedação, seja por sedação em bolus intermitente ou em infusão contínua para objetivos pré-determinados (escala de sedação), com interrupções diárias ou diminuição da dose para produzir o despertar. Retitular doses caso necessário;
• Evitar bloqueadores neuromusculares sempre que possível, e monitorar a profundidade do bloqueio por métodos de avaliação de estímulo neuromuscular;
• Tratamento curto com bloqueadores neuromuscular pode ser utilizados por não mais do que 48 horas em pacientes com SARA e P/F < 150 mmHg.
12) Controle da Glicemia:
• Utilizar insulina IV para controle da hiperglicemia em pacientes que apresentaram pelo menos duas medidas de glicemia acima de 180 mg/dL, objetivando glicemia ≤ 180 mg/dL, utilizando-se de protocolo ajuste de dose da insulina;
• Fornecer aporte de glicose e monitorar glicemia a cada 1-2 horas (4 horas para pacientes estáveis) nos pacientes em insulinoterapia;
• Interpretar com cautela baixos níveis de glicose obtidos por glicemia capilar, esta técnica pode subestimar o real valor da glicemia. Preferir a medida a partir de sangue arterial coletado da PAM.
13) Diálise:
• Hemodiálise intermitente e hemofiltração veno-venosa contínua são consideradas equivalentes;
• Hemofiltração oferece manejo mais fácil em pacientes hemodinamicamente instáveis.
14) Bicarbonato:
• Não utilizar com objetivo de melhora hemodinâmica ou redução das necessidades de vasopressor no tratamento da acidose láctica com pH ≥ 7,15.
15) Profilaxia de Trombose Venosa Profunda:
• Utilizar heparina de baixo peso molecular, preferencialmente, ou heparina não-fracionada, exceto contraindicações;
• Caso clearance de creatinina < 30 mL/min, preferir dalteparina ou heparina não-fracionada (menor metabolismo renal);
• Utilizar profilaxia mecânica por compressão em associação ao anticoagulante profilático sempre que possível;
• Quando anticoagulação profilática estiver contra-indicada (trombocitopenia, coagulopatia grave, sangramento ativo, ou hemorragia intracerebral recente), utilizar-se de métodos de compressão pneumática.
16) Profilaxia de Úlceras por estresse:
• Utilizar bloqueadores H2 ou inibidores de bombas de prótons nos pacientes de risco;
• Deve-se pesar o benefício da prevenção de sangramento digestivo alto contra o potencial aumento de risco de desenvolvimento de pneumonia associada à ventilação mecânica, sendo que pacientes sem fatores de risco para sangramento digestivo não devem receber profilaxia.
17) Nutrição:
• Administrar nutrição oral ou enteral (caso necessária);
• A prioridade é tentar a nutrição enteral, progredindo conforme tolerância do paciente. Não é obrigatório atingir meta calórica plena (VET pleno) nos primeiros dias.
Evitar dieta calórica normal na primeira semana, iniciando dieta com baixa caloria (500 kcal/dia) e aumentando gradativamente conforme tolerado;
• Nos primeiros 7 dias de sepse, evitar nutrição parenteral (NPT) e preferir glicose IV associada à dieta enteral
Utilizar glicose intravenosa em associação com dieta enteral, ao invés de nutrição parenteral total ou nutrição parenteral em associação a enteral;
Não é necessário monitorar o resíduo gástrico em todos os pacientes com dieta enteral, mas apenas naqueles com maior risco de aspiração (ex: diabetes melito) ou com sinais de intolerância à progressão da dieta (ex: distensão abdominal).
Neste grupo de pacientes de alto risco para aspiração e/ou com dificuldades em progredir dieta enteral, considere uso de pró-cinéticos e/ou posicionamento distal do cateter enteral.
18) Considerações quanto a limitação do suporte:
Discutir planos avançados de cuidado com pacientes e familiares. Descrever possíveis desfechos e determinar expectativas reais, de preferência nas primeiras 72 horas após admissão.
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