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Saúde25 novembro 2019

Tratamento de câncer em teste utiliza células do próprio paciente

Foi testado pela primeira vez na América Latina um tratamento inovador contra o câncer, produzido com células reprogramadas do próprio paciente.

Por Úrsula Neves

Foi testado pela primeira vez na América Latina um tratamento inovador contra o câncer, produzido com células reprogramadas do próprio paciente. A técnica CAR T-cell (célula T com receptor de antígeno quimérico) foi utilizada para o tratamento de um caso avançado de linfoma difuso de grandes células B. Trata-se de uma terapia recente, aprovada nos Estados Unidos para uso comercial em 2018, e utilizada no Brasil ainda em forma experimental.

O paciente já havia sido submetido a várias sessões de quimioterapia e radioterapia desde 2017. Nada tinha funcionado. A expectativa é que ele teria somente mais um ano de vida. “Para casos como esse, normalmente, temos ao nosso alcance no Brasil apenas os cuidados paliativos. Contudo, menos de um mês após a infusão da CAR T-cell, observamos a melhora clínica evidente e até conseguimos eliminar os remédios para dor”, contou entusiasmado Renato Cunha, pesquisador associado ao Centro de Terapia Celular (CTC) e coordenador do Serviço de Transplante de Medula Óssea e Terapia Celular do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HC-FMRP-USP).

Leia também: Quando encaminhar o paciente com câncer para cuidados paliativos?

Essa nova técnica é oferecida nos Estados Unidos por dois laboratórios farmacêuticos a um custo de US$ 400 mil, sem contabilizar os gastos com a internação. Já a terapia que está sendo desenvolvida aqui no país custa R$ 150 mil, podendo ser mais barateada, caso o tratamento seja oferecido em larga escala.

O grupo vai começar agora um protocolo de pesquisa com um número maior de voluntários. “Já temos outros dois pacientes voluntários com linfomas de alto grau em vias de receber a infusão de células reprogramadas”, disse Renato Cunha.

Novo tratamento de câncer

A partir de amostras de sangue dos pacientes a serem tratados, os pesquisadores isolam o linfócito T. Com auxílio de um vetor viral, um novo gene é introduzido no núcleo do linfócito T, que passa a expressar em sua superfície um receptor capaz de reconhecer o antígeno específico do tumor a ser combatido.

“Ele é chamado de receptor quimérico porque é misto. Parte de um receptor que já existe no linfócito é conectada a um receptor novo, que é parte de um anticorpo capaz de reconhecer o antígeno CD19. Com essa modificação, os linfócitos T são redirecionados para reconhecer e atacar as células tumorais”, explicou Renato Cunha.

Os leucócitos reprogramados são expandidos em laboratório e depois infundidos no paciente. Antes do tratamento, uma leve quimioterapia é administrada para preparar o organismo.

“Cerca de 24 horas após a infusão das células CAR-T tem início uma reação inflamatória, sinal de que os linfócitos modificados estão se reproduzindo e induzindo a liberação de substâncias pró-inflamatórias para eliminar o tumor. Além de febre, pode haver queda acentuada da pressão arterial e a necessidade de internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). O médico deve ter experiência com a técnica e monitorar o paciente continuamente”, ressaltou Renato Cunha.

O primeiro paciente já teve alta, sem necessitar mais de morfina, que antes era usada em dose máxima, e não apresentando mais linfonodos aumentados no pescoço. Os pesquisadores também conseguiram detectar as células CAR-T em seu sangue, sendo essa a maior prova de que a nova técnica funcionou.

O protocolo médico diz a imunoterapia deve ser avaliada após três meses da primeira aplicação. E para ser considerado curado, o paciente tem que estar livre das células cancerosas por cinco anos.

Próximos passos

A metodologia é específica para o tratamento de linfoma, mas também pode ser usada para qualquer tipo de câncer. O grupo de pesquisadores está trabalhando em protocolos para o tratamento de leucemia mieloide aguda e para mieloma múltiplo.

“Também estamos acertando uma parceria com uma universidade japonesa com foco em tumores sólidos, como o de pâncreas”, contou entusiasmado Rodrigo Calado, professor da FMRP-USP e membro do CTC.
O objetivo é desenvolver tratamentos de custo acessível a países de renda média e baixa, sendo possíveis de serem incluídos no rol de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS).

“O custo da terapia de células CAR-T é muito próximo do valor que o SUS repassa para um transplante de medula óssea, que hoje está em torno de R$ 110 mil. Então, o tratamento pode ser considerado acessível”, disse Rodrigo Calado.

*Esse artigo foi revisado pela equipe médica da PEBMED.

Referências bibliográficas:

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