A obesidade é definida pela OMS como um acúmulo anormal ou excessivo de adipócitos que colocam sua saúde em risco. O método mais comum de cálculo da obesidade é através do IMC. A obesidade é uma doença crônica, progressiva, redicivante e tratável, além de ser multifatorial e consequência de uma doença neurocomportamental.
A prevalência da obesidade vem aumentando nos centros urbanos enquanto que os quadros de desnutrição persistem nas áreas rurais.
Análise recente
Em um trabalho do International Journal of Gynaecology & Obstetrics em janeiro de 2023 uma grande revisão sobre o manejo da obesidade em diferentes fases da vida da mulher trouxe sugestões para o manejo dessas situações.
O período relacionado à gravidez (pré-concepção, pré-natal e puerpério) é uma grande oportunidade para o trabalho de conscientização e tratamento da obesidade na vida das mulheres. A FIGO tem sugerido utilizar esse período onde a mulher frequenta regularmente os serviços de saúde como uma das melhores oportunidades de orientações e tratamento da obesidade feminina. Além do impacto na saúde orgânica existe um impacto social que pode ser dirimido.
- Ambiente intrauterino e seu impacto na saúde infantil: pais obesos impactam negativamente nas gerações futuras por modificações epigenéticas tanto maternas quanto paternas em seus respectivos gametas, assim como nos embriões e fetos.
- Otimização da saúde: IMC pode ser usado na gestação a partir de 18 semanas, apesar de não ser muito confiável pelas mudanças corporais maternas. Fora da gravidez a medida da circunferência da cintura é melhor parâmetro em pacientes de IMC 25-35. Recomenda-se o screening para obesidade como rotina usando o IMC. Para o tratamento e seguimento a Escala de obesidade de Edmonton pode ser melhor, já que considera parâmetros metabólicos, físicos e aspectos psicológicos na avaliação.
- O tratamento deve incluir: mudança de comportamento, terapia nutricional, exercício físico, seguimento psicológico e comportamental, farmacoterapia e até eventuais procedimentos cirúrgicos.
- Cuidados centrados na família: muitas causas da obesidade estão relacionadas a costumes familiares. Ainda não existem evidencias suficientes que sugiram que mudanças centradas na família possam otimizar resultados perinatais.
- Educação e treinamento dos prestadores de cuidados à saúde: muitos profissionais não estão preparados para uma abordagem adequada à mulher obesa. Programas de treinamento tanto técnicos como de apoio psicológico que incluam obesidade podem otimizar o cuidado à saúde feminina.
- Tecnologia: o uso de programas web, aplicativos para celulares e aparelhos weareble são bem vindos como facilitadores do tratamento,
- Abordagem das causas principais da obesidade: gravidez é uma janela de oportunidades para inserção do diagnóstico, tratamento e orientações sobre obesidade. Programas de saúde pública em países de baixa renda ou em desenvolvimento tem focado na desnutrição, mas a abordagem da obesidade precisa ser lembrada também. As relações entre obesidade e desnutrição devem ser priorizadas.
- Implicações na saúde da mulher obesa:
- Doenças gastrointestinais e hepáticas: alta prevalência de doença hepática gordurosa não alcoólica, sendo a segunda causa mais comum de transplante hepático e carcinoma hepatocelular. Obesidade, sexo feminino e multiparidade tem associação com colelitíase e suas complicações como colicistite. Todas as mulheres com obesidade grau 3 ou mais devem ser avaliadas para colelitíase. Obesas tem maiores chances de deficiências de folato, vitaminas B1, B12 e vitamina C. A gravidez pode exacerbar essas deficiências.
- Neoplasias relacionadas a obesidade: a obesidade aumenta o risco de neoplasia endometrial, renal, esofagiana, ovariana e mamária nas mulheres na pós menopausa. A ação da obesidade se dá diretamente no eixo insulina-IGF-1, hormônios sexuais (aumentando a aromatização periférica com produção estrogênica) e mecanismos no tecido adiposo. A cirurgia bariátrica pode diminuir a incidência de cânceres de mama e endometrial. Mulheres com sangramento uterino anormal e obesas devem ser prontamente referenciadas para investigação endometrial (principalmente com antecedente de ovários policísticos).
- Doenças renais: a adiposidade com sua compressão visceral renal ou por mudanças metabólicas e inflamatórias parecem ser os mecanismos de disfunção renal. Nas gestantes obesas associa-se a síndrome metabólica com fator de risco para pré-eclâmpsia, glomerulonefrite persistente puerperal, nefropatia diabética e doenças renais terminais todas com fator de risco a obesidade. Ainda com mecanismo obscuro obesos podem apresentar carcinoma renal, elevação de triglicerídeos e glicemia de jejum.
- Sistema respiratório: a dispneia causada pela obesidade diminui a PaO2 e eleva a PaCO Além dessas, a apneia obstrutiva do sono é evento comum entre obesas.
- Sistema vascular: mulheres com IMC ≥ 30 tem risco 4x maior de eventos tromboembólicos, principalmente após cesáreas. A profilaxia para TVP deve ser iniciada no 1º dia pós-parto e mantida por e semanas após partos normais e por 6 semanas nas puérperas de cesárea.
- Saúde ginecológica e reprodutiva:
- Preventiva: adequação de mobiliário para atendimento de pacientes obesas, além de vestuário apropriado. Medidas que facilitem o acesso dessas mulheres e não as afastem dos serviços de saúde.
- Uso de especulo vaginal apropriado e manobras para acesso ao colo uterino de modo a obter amostra significativa para preventivo colo uterino.
- Considerar consulta prévia para avaliar possíveis traumas relacionados ao atendimento com dificuldade de exames pélvicos passados por adiposidade vaginal. Agendamento com pessoal habilitado nessas situações.
- Endométrio: pela associação com displasias todo sangramento uterino anormal deve ser investigado cuidadosamente.
- Mama: a mama contem adipócitos predominantemente. Seu excesso é fator de risco para câncer de mama pelo aumento de fatores de crescimento, mediadores inflamatórios como citocinas e aumento da atividade de aromatases fazendo conversão em estrogênio.
- Ovário: mulheres obesas na pós-menopausa têm mais risco de câncer de ovário. Uma história familiar cuidadosa e a vigilância em exames de rotina pode ajudar.
- Contracepção: o risco de TVP em obesas usando contraceptivos combinados é 2x maior quando comparadas com mulheres de peso normal. a abordagem individualizada é importante, mas de um modo geral o uso de contracepção com progestágenos é a melhor escolha (injetável, implante, DIU) ou o uso de DIU não hormonal.
- Contracepção emergência: não há dados suficientes para escolha em mulheres obesas em idade reprodutiva. A FIGO sugere uma dose dobrada de levonorgestrel pode ser efetivo.
- Menopausa: obesidade e tabagismo pioram em muito os sintomas vasomotores. A terapia de reposição hormonal é controversa pelos riscos de câncer de mama, TVP e doenças cardiovasculares nessa população. Opções como gabapentina, clonidina, paroxetina, venlafaxina e cimicífuga podem ser usados para alívio dos sintomas vasomotores.
- Osteoporose: não há consenso no risco maior de desenvolvimento de osteoporose. Descontinuação de uso de álcool e tabaco devem ser estimulados, atividade física deve ser sugerida como medida para evitar risco de quedas.
- Depressão: depressão está associada com obesidade e transição menopausa. Mudança de imagem corporal, estigmas discriminatórios pela obesidade, abuso de substancias e condições psiquiátricas pré existentes são fatores de risco para piora na menopausa.
Mensagem final
Pesquisas futuras devem ser focadas no treinamento pessoal dos prestadores de cuidados a saúde e pesquisa das causas da obesidade e suas interpelações. Intervenções efetivas em otimização de ações de saúde para entender e evitar as morbidades relacionadas a obesidade nas mulheres podem ser chaves para auxílio a essas pessoas. O tratamento não pode ser generalizado.
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