Covid-19: Planos de saúde são obrigados a cobrir testes… mas em qual situação?
Hospitais do país relataram um pico de demanda de pacientes desejando realizar tal teste para a Covid-19 pois “agora está coberto pelo plano”.
Durante a última semana de junho foi divulgado por diversos veículos de informação (televisão, jornais, revistas, sites e redes sociais), incluindo aqui no Portal, a notícia com a temática do título dessa matéria. Hospitais e prontos-socorros do país relataram um pico de demanda de pacientes oligossintomáticos e assintomáticos desejando realizar tal teste para a Covid-19 pois “agora está coberto pelo plano”. A nova Resolução Normativa cobre sim tal exame, mas sob determinadas apresentações clínicas que discutiremos a seguir.
Testes para Covid-19
Foi publicado no Diário Oficial da União (DOU), do dia 29 de junho de 2020, a Resolução Normativa Nº 458, de 26 de junho de 2020, alterando a Resolução Normativa – RN nº 428, de 07 de novembro de 2017, que dispõe sobre o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde no âmbito da Saúde Suplementar, para regulamentar a cobertura obrigatória e a utilização de testes sorológicos para a infecção pelo Coronavírus (Covid-19), em cumprimento a determinação judicial proferida nos autos da Ação Civil Pública nº 0810140-15.2020.4.05.8300.
Para compreender a abrangência da Saúde Suplementar (planos de saúde), é necessário rever alguns conceitos gerais sobre o sistema de saúde no Brasil e os números da Saúde Suplementar.
Estudamos durante a graduação e nos cursos pré-residência como o sistema de saúde no Brasil se desenvolveu ao longo do tempo, passando por:
- 1923: Caixa de Aposentadorias e Pensões (CAPs), pelo Decreto n° 4.682 de 24/01/1923 (Lei Eloy Chaves);
- Década de 30: Institutos de Aposentados e Pensionistas (IAPS);
- Década de 60 (1966): Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) por meio da Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS);
- 1977: Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social (INAMPS), contido no Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (SINPAS);
- 1986: Sistema Único e Descentralizado de Saúde (SUDS);
- Constituição de 1988: instaurou o Sistema Único de Saúde (SUS), de acesso irrestrito (universal), com seus princípios éticos/doutrinários e organizacionais/operativos.
Setor de Saúde Suplementar
O setor de Saúde Suplementar é regulamentado através da Lei n° 9.656 de 03 de junho 1998, dispondo sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde, criando regras e também punições para as operadoras em caso de divergência contratual.
A Saúde Suplementar é regulada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), criada pela Lei n° 9.961 de 2000, visando a conformidade das relações entre as operadoras, os prestadores e os beneficiários dos planos.
Composto por cooperativas médicas, seguradoras, administradora, medicina de grupo, filantropia, autogestão, cooperativa odontológica e odontologia de grupo, a Lei dispõe em seu Artigo 1:
“Prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a preço pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor”
A Saúde Suplementar possui hoje (01/07/2020) 46.996.546 beneficiários, com uma taxa de cobertura de 24,23% (um quarto) da população brasileira, movimentando uma receita de contraprestações no valor de 209 bilhões de reais no quarto trimestre de 2019, com uma taxa de sinistralidade de 83,2% , que equivale à relação entre as despesas com a utilização dos serviços médicos e a receita que a operadora recebe pelo contrato (prêmio).
Temos no Brasil 739 operadoras em atividade, com 17.378 planos ativos. Tais beneficiários são divididos por tipo de contratações:
- Individual ou familiar (8.974.878);
- Coletivo (37.933.575) dividido em coletivo empresarial, por adesão e não identificado;
- Não identificado (88.093).
Mas afinal, quais são os procedimentos obrigatoriamente cobertos pelo plano de saúde?
São aqueles que constam no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde no âmbito da Saúde Suplementar (Resolução Normativa 428 de 2017, alterado pela Resolução Normativa – RN Nº 458, dessa semana).
Nela consta os anexos:
- Anexo I– Lista dos procedimentos;
- Anexo II – Diretrizes de utilização para cobertura de procedimentos na Saúde Suplementar;
- Anexo III- Diretrizes clínicas;
- Anexo IV – Protocolo de utilização.
O Anexo II (link no final da matéria), consta que todo exame complementar apenas poderá ser solicitado (interpreta-se como: pago pelo convênio) caso preencha critérios clínicos descritos no corpo do texto. Pressupõe-se que o médico assistente realizou toda a anamnese, formulou uma hipótese diagnóstica e tal exame seria recomendado por diversas literaturas para tal quadro e imprescindível para o diagnóstico médico.
Apesar de pouco usual o léxico do direito para o médico, é muito importante conhecer tais disposições pois elas afetam e muito nosso cotidiano. Muitos profissionais trabalham em hospitais particulares e atendem em seus consultórios tais convênios, e caso a solicitação não preencher todos os critérios citados acima, a auditoria irá glossar as condutas, não pagando por procedimentos e exames não contidos na Normativa.
Após o exposto, os exames sorológicos – pesquisa de anticorpos IgA, IgG ou IgM- deverão ser solicitados nos casos em que o paciente apresente ou tenha apresentado um dos quadros clínicos descritos a seguir a partir de oito dias de sintomas:
- Síndrome gripal: quadro respiratório agudo, caracterizado por sensação febril ou febre, acompanhada de tosse ou dor de garganta ou coriza ou dificuldade respiratória;
- Síndrome respiratória aguda grave (SRAG): desconforto respiratório/dificuldade para respirar ou pressão persistente no tórax ou saturação de oxigênio menor do que 95% em ar ambiente ou coloração azulada dos lábios ou rosto.
O teste será coberto para os beneficiários de planos de saúde com segmentação ambulatorial, hospitalar ou referência e será feito nos casos em que houver a indicação médica supracitada.
Referências bibliográficas:
- Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde 2018. Anexo II Diretrizes de Utilização para Cobertura de Procedimentos na Saúde Suplementar. http://www.ans.gov.br/images/ANEXO/RN/Anexo_II_DUT_Rol_2018_alterado.pdf
- http://www.ans.gov.br./aans/noticias-ans/coronavirus-covid-19/coronavirus-todas-as-noticias/5648-ans-inclui-teste-sorologico-para-covid-19-no-rol-de-coberturas-obrigatorias
- http://www.in.gov.br/web/dou/-/resolucao-normativa-rn-n-458-de-26-de-junho-de-2020-263971789
- http://www.ans.gov.br/perfil-do-setor/dados-e-indicadores-do-setor/sala-de-situacao
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