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Saúde23 dezembro 2022

Anvisa autoriza, pela primeira vez, plantio de cannabis para pesquisa científica

O Instituto do Cérebro será responsável pelo plantio de cannabis e projetos de pesquisa para avaliação de eficácia e segurança.

Por Úrsula Neves

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concedeu uma autorização inédita para a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) cultivar a planta cannabis visando projetos de pesquisa sobre a atuação de derivados da erva em casos de distúrbios neurológicos e psiquiátricos.

O Instituto do Cérebro (ICe-UFRN) conduzirá os projetos de pesquisa para avaliação da eficácia e da segurança de combinações da substância. O objetivo é avaliar a eficácia e a segurança de combinações de fitocanabinóides (moléculas presentes na planta) no tratamento de sinais e sintomas associados a distúrbios neurológicos e psiquiátricos.

plantio de cannabis para pesquisa

Plantio de cannabis para pesquisa

Do ponto de vista prático, a Anvisa autorizou que a UFRN possa importar, armazenar e germinar sementes da planta cannabis, assim como cultivá-la, por meio de sistema controlado, em ambiente fechado.

A deliberação da Agência levou em consideração o estabelecimento de requisitos de segurança e controle adequados para a realização das atividades que envolvam o cultivo controlado pela UFRN. Para tanto, além de realizar a comprovação documental, a universidade recebeu visita às instalações do Instituto do Cérebro (ICe-UFRN) para verificar as condições de infraestrutura e a capacidade técnico-científica.

Antes, apenas a Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), em Minas Gerais, tinha a autorização para cultivo in vitro, ou seja, liberada apenas para cultivar células e tecidos da cannabis.

Veja mais: O uso de cannabis por mulheres no menacme pode reduzir a fertilidade?

Recurso administrativo

A autorização para o plantio e pesquisa foi concedida após a UFRN entrar com um recurso administrativo depois de ter um pedido negado em 2021. Na análise do recurso, o diretor da Anvisa e relator do processo, Alex Machado Campos, destacou que as Convenções de Drogas da ONU de 1961, 1971 e 1988 colocaram restrições ao comércio internacional e à circulação interna de substâncias psicotrópicas e entorpecentes.

“É útil clarificar que o controle imposto pelas Convenções nunca visou a coibição do uso científico e medicinal. O mesmo texto que desenha as limitações também explicita que o uso medicinal e científico de todas as substâncias deve ser assegurado”, afirmou o diretor da Anvisa.

Para justificar a importância das pesquisas sobre a planta, Alex Campos lembrou que a pesquisa da mineira UFSJ com cultivo in vitro já resultou em duas patentes e que uma terceira encontra- se em tramitação.

O relator, que foi favorável à autorização e teve o voto acompanhado pelos demais diretores, apontou que a UFRN deve cumprir condições já previstas no projeto de pesquisa para garantir que a cannabis seja usada apenas no desenvolvimento de fármacos.

Projeto de pesquisa

O plantio vai ocorrer em salas especiais, em sistema fechado. O espaço tem 100 m², com alvenaria resistente e portas maciças. O acesso ao espaço será realizado mediante controle biométrico de pessoas previamente registradas.

O edifício e entorno têm moderno sistema de videomonitoramento (24h/7 dias), assim como vigilância armada todos os dias do ano. O sistema de vídeo deve ser capaz de gravar em qualquer condição de iluminação e gerar imagens de qualidade que precisam estar disponíveis para vistorias.

O ICE-UFRN teve entre seus fundadores o neurocientista Sidarta Ribeiro, que é uma das maiores autoridades do país na pesquisa sobre a cannabis.

Recentemente, em entrevista ao portal g1, ele criticou o veto ao cultivo da planta. “É como importar mandioca”, disse Sidarta Ribeiro, que afirmou ainda que o país tem uso elitista da erva medicinal.

Leia também: Cannabis medicinal para transtornos psiquiátricos: o que temos de evidências?

Estudos clínicos

O professor do ICe-UFRN, Claudio Queiroz, explicou em entrevista ao portal da universidade que os estudos clínicos já demonstraram segurança e eficácia de um desses fitocanabinoides, o canabidiol (CBD), no controle de crises refratárias. Entretanto, os mecanismos neurofisiológicos responsáveis pelos efeitos terapêuticos do CBD são ainda desconhecidos.

“Além disso, pouco se sabe sobre o efeito dos fitocanabinoides sobre outros tipos de epilepsias, assim como o potencial de outros fitocanabinoides, como o CBN e o CBG, que não possuem propriedades psicoativas, sobre a excitabilidade neuronal e a frequência de crises”, explicou Claudio Queiroz.

Diante desse cenário, o docente considera que para responder a essas perguntas é necessário o cultivo da planta, para ter acesso aos compostos nas concentrações e proporções controladas para as investigações.

Ainda de acordo com Queiroz, a autorização da Anvisa vai trazer grandes contribuições por possibilitar a ampliação de conhecimento sobre a produção, pela planta, de fitocanabinoides, assim como por permitir a realização de pesquisa básica e testes sobre os efeitos desses fitocanabinoides, quando administrados isoladamente ou combinados, em modelos animais de epilepsia, autismo, zumbido, estados afetivos e funções cognitivas, avaliando sua segurança e eficácia.

Este artigo foi revisado pela equipe médica do Portal PEBMED. 

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Referências bibliográficas

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