Ácido tranexâmico versus ocitocina na profilaxia do sangramento pós-parto
Hemorragia puerperal (HPP) primária é uma perda sanguínea cumulativa de >1.000 mL, independentemente da via de parto, ou perda sanguínea acompanhada de sinais ou sintomas de hipovolemia dentro de 24 horas após o nascimento.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda ocitocina, 10 UI, por via intramuscular (IM) ou endovenosa (EV) para prevenção de HPP. Nos últimos anos, o ácido tranexâmico (TRAN), um medicamento antifibrinolítico, com início de ação em 5 minutos e meia-vida de aproximadamente 2 horas foi adicionado aos protocolos de HPP.
O TRAN tem, no entanto, pelo menos teoricamente, algumas vantagens sobre a ocitocina:
# Persistência nos tecidos até 17 horas após a administração;
# Capacidade de diminuir a mortalidade materna em mulheres com HPP;
# Termoestabilidade
# Vantagem operacional de superar custos logísticos, não tendo efeito no sistema neuro-hormonal materno como OXY.
A exposição intraparto à ocitocina sintética, por outro lado, reduz significativamente a capacidade de sucção do recém-nascido durante o contato pele a pele, na primeira hora após o nascimento, de maneira dose-dependente.
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O estudo
Um recente estudo prospectivo, multicêntrico, randomizado e não cego publicado no The Lancet comparou TRAN (EV) e OXY (IM) na profilaxia da perda sanguínea pós-parto vaginal em pacientes a termo (37–42 semanas) com baixo risco de HPP em dois hospitais italianos de janeiro de 2020 a junho de 2023.
No grupo OXY foi administrado 10 UI IM até 5 minutos após o parto. No grupo TRAN foi infundido 1g EV lento dentro de 5 minutos após o parto.
O mesmo tratamento foi aplicado para garantir a segurança das pacientes em caso de hemorragia pós-parto em ambos os grupos. Uma avaliação foi realizada após 7 dias e um questionário sobre efeitos adversos aplicado após 40 dias do parto.
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Resultados e discussão
Um total de 231 pacientes foram randomizadas, 127 no grupo OXY e 104 no grupo TRAN, respectivamente. A idade mediana foi semelhante nos dois grupos (32 anos), enquanto a idade gestacional mediana foi ligeiramente menor no grupo TRAN (39 versus 40 semanas).
As mulheres no grupo TRAN possuiam um IMC ligeiramente mais elevado (24,6 versus 25,0) e os níveis basais de hemoglobina (11,9 versus 11,7 g/dL).
A perda média de sangue no T0 (momento do parto) foi de 269,12 mL (IC 95%: 219,39–318,84) no grupo OXY e 263,88 mL (IC 95%: 215,25–312,52) no grupo TRAN. Dada uma margem de equivalência de 150 mL (5,01 em unidades logarítmicas), que representa uma diferença clinicamente não relevante na perda de sangue após o parto, revelando que os dois tratamentos eram equivalentes.
A perda sanguínea total média nos grupos OXY e TRAN foi de 397,66 mL (IC 95%: 334,36–460,96) e 405,64 mL (IC 95%: 344,23–467,04), respectivamente.
Nenhum evento adverso foi relatado e não foram registradas complicações trombóticas ou alterações hemodinâmicas significativas nos grupos.
A principal limitação deste estudo se deve ao desenho não cego, que não permite suavizar o viés de seleção. A ausência de duplo-cego foi devido as vias diferentes de administração: IM e EV, não sendo possível esconder o medicamento aleatoriamente. Limitações quanto a ausência de dados sobre amamentação e a falta de avaliação farmacoeconômica também foram levantadas.
Conclusão
Este estudo sugere a equivalência do ácido tranexâmico versus ocitocina sintética na profilaxia da perda sanguínea pós-parto vaginal em pacientes a termo com baixo risco de HPP.
Assim, sugere o seu uso na profilaxia de HPP, na ausência de atonia uterina. Novos estudos duplo-cegos devem ser realizados para confirmar os resultados obtidos.
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