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Reumatologia25 abril 2024

Doença de Sjögren: Guidelines britânicos orientam o tratamento 

A doença de Sjögren (DS) é uma doença difusa do tecido conjuntivo cuja característica mais marcante é a presença de xerostomia e xeroftalmia.
Por Gustavo Balbi

As manifestações da Doença de Sjögren (DS) não estão restritas às glândulas exócrinas (manifestações sistêmicas ou extraglandulares) e podem acometer até 70% dos pacientes, o que inclui artralgias/artrite, alterações pulmonares, neurológicas, cutâneas e hematológicas. A DS pode ainda complicar com linfoma de células B em até 5-10% dos casos. Desse modo, ela pode impactar sobremaneira a qualidade de vida dos pacientes acometidos pela doença. 

Recentemente, foi publicada uma atualização das recomendações da British Society of Rheumatology (BSR) para o diagnóstico e tratamento da Doença de Sjögren (DS) nos pacientes adultos e pediátricos. 

Doença de Sjögren Guidelines britânicos

Metodologia 

As recomendações foram desenvolvidas de acordo com o documento BSR Creating Guidelines com base no AGREE II. O SIGN e o GRADE foram utilizados para resumir a qualidade do corpo de evidência. Foram realizadas perguntas clínicas sobre o diagnóstico e tratamento da Doença de Sjögren (DS) para serem respondidas pelo grupo de pesquisadores após revisão da literatura. Caso não houvesse evidência científica disponível sobre um tema, foi utilizado o consenso entre os especialistas envolvidos. 

Leia também: Modalidades de exames de imagem para o diagnóstico da arterite de células gigantes

Recomendações para Doença de Sjögren

  1. Não se deve solicitar o FAN para pacientes sem sintomas clínicos compatíveis com DS ou outras doenças difusas do tecido conjuntivo (SoA [força de concordância] 96,4%). O FAN deve ser utilizado como exame de triagem nos pacientes com suspeita clínica de DS ou doenças difusas do tecido conjuntivo (SoA 93,9%); caso ele venha negativo em um paciente com alta probabilidade pré-teste de DS, os autores recomendam a dosagem do ENA (SoA 96,7%). 
  2. A ultrassonografia de glândulas salivares fornece importantes informações adicionais para reforçar ou refutar a presença de DS (SoA 95,3%, GRADE 1, A). No entanto, a ultrassonografia não substitui a testagem para anticorpos nem a análise histopatológica nos critérios de classificação da DS no adulto (SoA 96,4%, GRADE 1, A). 
  3. Os autores não recomendam a realização de exames de imagem adicionais à ultrassonografia de glândulas salivares na avaliação rotineira dos pacientes com DS. 
  4. A biópsia de glândulas salivares menores deve ser considerada nos casos no qual o diagnóstico da DS não pode ser feito com bases clínicas e sorológicas (SoA 98,2%, GRADE 1, A). 
  5. Não existem evidências conclusivas sobre o papel da biópsia das glândulas lacrimais no diagnóstico de rotina da DS (SoA 98,2%, GRADE 1, C). 
  6. Nos pacientes com DS e novo aumento de glândulas salivares ou sintomas sugestivos de linfoma, deve ser oferecida investigação adicional (SoA 98,75%, GRADE 1, A). Dentre os principais preditores clínicos de linfoma, temos: consumo de C3/C4 (o melhor preditor é o consumo de C4), aumento das glândulas salivares e linfonodomegalia clinicamente detectáveis, crioglobulinemia (incluindo positivação do fator reumatoide), gamopatia monoclonal e focus score > 4. 
  7. Devemos considerar nova biópsia de glândulas salivares menores nos pacientes com suspeita de linfoma (SoA 92,7%, GRADE 2, C). 
  8. A avaliação inicial dos pacientes com DS deve conter avaliação de biomarcadores capazes de predizer a chance de evolução com doença extraglandular (SoA 97,6%, GRADE 1, B). Os seguintes preditores se relacionam com o maior risco de doença extragladular: positividade para anti-Ro e para fator reumatoide, início em idade mais jovem e afroamericanos. 
  9. Os autores recomendam considerar a triagem para condições frequentemente associadas à DS (SoA 94,7%). Dentre os exames, sugerem: níveis de vitamina D (SoA 95,6%, GRADE 1, B), função tireoidiana, provas hepáticas (com solicitação de anticorpo antimtocôndria se pertinente após avaliação inicial), transglutaminas tecidual IgA e dosagem de IgA total, eletroforese de proteínas séricas e imunoglobulinas, bicarbonato sérico e CK. 
  10. O uso de lubrificantes oculares sem conservantes a cada 2-3 horas é o tratamento de escolha para xeroftalmia (SoA 94,4%, GRADE 1, A). O uso de ‘lágrimas artificiais’ pode ser oferecido para os casos que não melhoram com os colírios convencionais sem conservantes (SoA 91,9%, GRADE 1, A). 
  11. No caso de inflamação ocular persistente (ceratoconjuntivie seca), o uso de corticoides tópicos sob a forma de colírio pode ser oferecido por um curto período e sob supervisão oftalmológica (SoA 94,9%, GRADE 1, A). Caso a inflamação persista de maneira significativa apesar do tratamento otimizado, pode ser inciado o colírio de ciclosporina (alternativa: tacrolimus) (SoA 94,9%, GRADE 1, A). 
  12. No casos de deficiência de glândula de Meibômio, o uso de compressas mornas sobre as pálpebras por pelo menos 10 minutos pode auxiliar na melhora dos sintomas (SoA 94,9%). A evidências para uso de Lipiflow, terapia com luz pulsada intensa e sondagem de glândula de Meibômio são limitadas e, portanto, não são recomendadas de rotina. Em caso de processos infecções superpostos, o uso de antibióticos tópicos ou sistêmicos é recomendado (SoA 92,3%, GRADE 2, B). Além disso, colírios com veículo lipídico pode ser recomendado como terapia adjuvante (SoA 90,2%, GRADE 2, C). 
  13. Os pacientes elegíveis para oclusão do ducto nasolacrimal precisam ser cautelosamente selecionados, visto que o procedimento por levar à piora do processo inflamatório (SoA 96,3%, GRADE 1, C). 
  14. Em termos de nutracêuticos para sintomas oculares, géis contendo vitamina A podem ser considerados (SoA 89,9%, GRADE 2, C). Suplementação de ômega-3 também pode ser considerada (SoA 89,9%, GRADE 2, C). 
  15. Não há evidência de benefício do tratamento com androgênios nos pacientes com xeroftalmia (SoA 96,3%, GRADE 2, C). 
  16. Os substitutos de saliva são indicados para melhora dos sintomas de xerostomia (SoA 93,3%, GRADE 2, C). Nos casos refratários e sem função glandular residual, considerar curso de pilocarpina para alívio da xerostomia — iniciar 5 mg por dia, aumentando até 5 mg de 6/6 horas (SoA 98,4%, GRADE 1, A). 
  17. Para cuidado odontológico, recomenda-a se a escovação com pasta de dente fluorada, acompanhamento odontológico proativo e uso de produtos contendo xilitol para evitar uso de açucar (SoA 95,6%, GRADE 2, C). 
  18. Para sintomas relacionados ao ressecamento vaginal, considerar lubrificantes tópicos com ou sem estrogênio tópico (nos casos relacionados à menopausa e perimenopausa) (SoA 97,5%, GRADE 2, C). 
  19. Nos pacientes com fadiga e sintomas sistêmicos, considerar um curso de tratamento com hidroxicloroquina por 6 a 12 meses (SoA 95,6%, GRADE 2, C). Se boa resposta, considerar manutenção. Os autores também sugerem um curso de 6 a 12 meses com hidroxicloroquina nos pacientes com hipergamaglobulinemia significativa (SoA 94,2%, GRADE 2, C). 
  20. O uso de corticoide sistêmico não deve ser feito de rotina, mas pode ser oferecido para manifestações sistêmicas específicas (SoA 97,7%, GRADE 2, C). 
  21. O uso de imunossupressores convencionais não é recomendado de rotina, a menos que haja indicação por manifestações sistêmicas específicas (SoA 94,7%, GRADE 2, C). O mesmo é válido para biológicos (SoA 93,5%, GRADE 2, C) e imunoglobulina intravenosa humana (SoA 96,9%, GRADE 2, C). 
  22. Para pacientes grávidas com positividade para o anti-Ro, considerar hidroxicloroquina para prevenção de bloqueio cardíaco fetal (SoA 91,5%, GRADE 2, C). Caso tenha apresentado bloqueio cardíaco fetal em gestação prévia, oferecer hidroxicloroquina (SoA 96,7%, GRADE 1, B). Caso seja detectado novo bloqueio cardíaco fetal, encaminhar para centro de referência para avaliação do uso de dexametasona (SoA 98,9%, GRADE 2, C). 

Comentários

Essas recomendações trazem muitas informações relevantes para o tratamento da Doença de Sjögren, que devem ser conhecidas pelos reumatologistas e médicos que acompanham pacientes com esse diagnóstico. 

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Referências bibliográficas

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